28/04/2023 - 9:30
Diferenciada na multidão. Era assim que Holly Golightly, vivida por Audrey Hepburn no filme Bonequinha de Luxo, de 1961, aparecia nas ruas de Nova York e em sua parada favorita: a Tiffany. Criada em 1837 por Charles Lewis Tiffany e John B. Young, a marca de joias ganharia o famoso empreendimento da Quinta Avenida nos anos 1940. Considerada uma das cinco maiores atrações turísticas de Manhattan, a loja esteve fechada para reforma desdes 2019 e acaba de reabrir para o público ansioso por explorar os 10 mil m2 de novidades. Uma delas é que os três últimos dos dez andares do prédio, que fica na esquina da Broadway, foram revitalizados e trazem um mirante com vista privilegiada da cidade. “É como uma represa que se rompe. Eu mesmo, quando for a Nova York, quero visitá-la”, diz Julio Moreira, professor do Hub de Moda e Luxo da ESPM. As expectativas, quando o assunto é ostentação, se multiplicam. Os consumidores do mercado esperam exclusividade, qualidade e excelência, mas também uma experiência de consumo: “Você tem joias maravilhosas no mundo todo. Tem que se diferenciar gerando experiências e reforçando esses ativos. O storytelling é um dos artigos de luxo.” Outras atrações aguardadas são o Blue Box Café, sob a liderança do famoso chef de cozinha Daniel Boulud, e a “sala de experiência Audrey Hepburn”. “Quem não gostaria de estar na pele dela?”, brinca o professor da ESPM.

Observada pela protagonista na primeira cena do filme da década de 1960, a estátua de Atlas segue intacta sobre a porta de entrada, assim como toda a fachada. Condenado por Zeus a sustentar os céus pela eternidade, ali o deus grego tem a função de segurar o objeto que informa o tempo. A verdade é que 83 anos de idade, quatro de reforma, algumas publicidades polêmicas e uma pandemia não deixaram nenhum brilho retroceder. Em 2021, a joalheria que começou com US$ 1.000 foi adquirida pelo maior grupo deste universo, a LVMH Moët Hennessy Louis Vuitton, por US$ 16,2 bilhões. À frente do império que reúne mais de 70 marcas, Bernard Arnault é a pessoa mais rica do mundo, superando Elon Musk na última lista da Forbes. Seu filho Alexandre Arnault é o atual presidente-executivo da TIffany & Co e figura na linha de sucessão do magnata francês. Hoje a Tiffany tem mais de 300 lojas no mundo, seis delas no Brasil.

Legado nobre
Da mesma forma que Louboutin se valeu do vermelho, e o preto ficou marcado em visuais da Chanel, a escolha da cor hoje informalmente intitulada “azul Tiffany” foi fundamental na perpetuação do conceito. A professora de História da Moda da Faculdade Santa Marcelina, Miti Shitara, lembra que cores como púrpura e azul eram de obtenção difícil e dispendiosa, e por isso cabiam aos membros da nobreza. “O púrpura, por exemplo, era proveniente do suco de uma concha processada e vendida por cretenses na Antiguidade. Já o azul royal, acrescido de flor de lis, inconfundivelmente remete à realeza francesa.” Ao trazer as primeiras peças europeias para o centro comercial e turístico da cidade mais populosa dos Estados Unidos, os fundadores ofereciam um aperitivo da nobreza. “O mundo do luxo vende um grande sonho e esse mercado sempre vai existir. Quando as pessoas buscam o luxo, querem criar a própria identidade”, confirma Julio Moreira. Sua renovação, contudo, é primordial em uma época de exibicionismo e excessos.
O uso do diamante amarelo por Lady Gaga, no Oscar 2019, e campanhas como “Not Your Mother’s Tiffany” e “About Love”, estrelada por Beyoncé e Jay-Z, estão entre as investidas recentes para se aproximar das novas gerações. O quadro de Jean-Michel Basquiat que aparece nas fotos do casal de músicos, inclusive, estampa uma das paredes do local. Obras de artistas renomados, como Damien Hirst, também decoram o interior do projeto assinado pelo atual e excêntrico Peter Marino, arquiteto responsável por condomínios luxuosos e outras lojas da Louis Vuitton. “Luxo e tradição não podem cheirar a naftalina”, alerta o professor da ESPM, que vê esperança na nova fase: “O segredo é atrair pessoas. Se não for para comprar joias de milhões, que seja para tomar um café com croissant”. É como diz a a personagem de Audrey Hepburn: “Nada de ruim acontece na Tiffany’s”.
