Ao ser premiado pela Academia em 2016, Damien Chazelle entrou para a história: desbancou Norman Taurog, que vencera 85 anos antes, em 1931, e se tornou o diretor mais jovem a ganhar um Oscar. Tinha 32 anos. La La Land, sua produção premiada, teve como inspiração os dois musicais que o francês Jacques Demy dirigiu nos anos 1960, Os Guarda-Chuvas do Amor e Duas Garotas Românticas. Hoje, aos 38 anos, Chazelle parece manter uma estranha relação com o tempo. Uma rápida olhada em sua filmografia leva a crer que ele nasceu na época errada – ou, pelo menos, é assim que se sente. Seus filmes não tratam de temas atuais nem discutem problemas que afligem os nossos tempos. Chazelle age como um veterano mais interessado no passado ou em personagens atemporais, como músicos de jazz (Whiplash) e astronautas (O Primeiro Homem).

Nesse sentido, Babilônia, seu novo filme, não é muito diferente. O diretor visita os loucos anos 1920, quando Hollywood, ainda dominada pelo cinema mudo, era uma fábrica de sonhos e de pesadelos – tudo ao mesmo tempo. O filme conta a ascensão e queda dos personagens Jack Conrad (Brad Pitt), Nellie LaRoy (Margot Robbie) e Manny Torres (Diego Calva). A relação entre eles revela que a tal Babilônia, na verdade, está mais para Sodoma e Gomorra: narcisistas e hedonistas, são estrelas movidas a sexo, drogas e jazz, combinação que nos faz compreender por que esses artistas que se achavam imortais morriam tão jovens. A louca Hollywood dos “bons tempos” era povoada por uma multidão de pequenos Calígulas, obcecados com a própria fama e com o poder que emanava daquela irreal realidade.

SENSACIONALISMO Conrad (Pitt) e Torres (Calva): casos inspirados em histórias reais (Crédito:Scott Garfield)

O enredo narra os encontros e desencontros do trio de protagonistas: Conrad é o ator famoso e medíocre, cujo prestígio começa a se esvair após sucessivos fracassos; Nellie é a aspirante à estrela que realiza seu sonho, mas a personalidade autodestrutiva não consegue mantê-lo; Torres é o imigrante latino que consegue virar produtor de um grande estúdio, mas tem vida curta. Em comum, compartilham a decadência que a indústria do cinema mudo sofre quando entra em cena um elemento disruptivo: o som. Muitos dos casos absurdos narrados no roteiro aconteceram de verdade e foram baseados em A Babilônia de Hollywood, livro de Kenneth Anger que reunia as fofocas das celebridades da época.

Babilônia é uma sucessão de metáforas: o poder da tecnologia, que torna as gerações anteriores obsoletas; a sobrevivência dos que conseguem se adaptar aos novos tempos; o fascínio do cinema, que se reinventa para manter a mágica. Apesar dos altos e baixos, Babilônia é um grande filme e uma ambiciosa declaração de amor ao cinema. Assim como o recém-lançado Os Fabelmans, de Steven Spielberg, Chazelle quer homenagear o mundo do qual faz parte. Mas enquanto o veterano Spielberg prima pela doce nostalgia, o jovem Chazelle é amargo como um Dry Martini. Em seu filme, a felicidade espalhada por Los Angeles era falsa, o talento era fabricado e as pessoas atrás e na frente das câmeras não mereciam toda aquela atenção. Mas é aí que seu tributo parece um pouco confuso: há uma banalização do trabalho cinematográfico, como se todos ali fossem um bando de incompetentes que dependem apenas da sorte. Talvez o problema seja o excesso de excessos: se fosse menos caricato, o filme certamente seria melhor.

A única certeza sobre Babilônia, porém, é que ele não será unanimidade. O público, certamente, sairá dividido da sala de cinema. Em entrevista à imprensa norte-americana, Damien Chazelle tentou minimizar as críticas. “É bom ter algo que estimule debates, com opiniões divergentes de ambos os lados. Sabíamos que o enredo iria irritar algumas pessoas e cativar outras, mas acho que é um bom sinal. Mais filmes deveriam fazer isso”, afirmou o diretor. Nesse ponto, Chazelle tem toda a razão.

As influências declaradas de Damien Chazelle

Cantando na Chuva

No clássico de 1952, atores do cinema mudo sofrem para se adaptar aos diálogos do cinema falado. A história da ascensão e queda dos personagens inspirou o roteiro de Babilônia

O Crepúsculo dos Deuses

“Estou pronta para o meu close-up, senhor DeMille.” O drama de Norma Desmond, a estrela que não se adapta aos novos tempos, representa a morte da Hollywood clássica e o surgimento do cinema moderno