29/04/2022 - 9:30
Por mais que as emissoras se esforcem, a sociedade brasileira é bem diferente do que mostram os “reality shows”, formatos que viraram tendência na última década e que buscam simular a vida real diante das câmeras. Uma iniciativa pioneira na periferia de São Paulo, no entanto, promete levar esse conceito a sério: a +FavelaTV, inaugurada em Paraisópolis, zona sul da capital, oferece uma programação ambientada na comunidade, com atrações diversificadas. Todas protagonizadas por moradores locais e focadas nos interesses desse público. O novo canal de TV pela internet pretende levar o modo de vida da favela paulistana para todo o País – e atrair outras experiências semelhantes espalhadas pelo País.
150 mil pessoas é a população estimada de Paraisópolis

A construção de um sofisticado estúdio de vidro com vista para o bairro e a contratação de uma equipe de mais de trinta profissionais mostram que a qualidade é um item primordial do projeto. Ao vivo e sob demanda, a grade alterna assuntos gerais e temas de interesse da comunidade, com abordagens bastante criativas. Gilson Rodrigues, da ONG G10 Favelas, uma das parceiras do canal, apresenta o Gilson Entrevista; Daniel Cristovão exibe o Favela Music, com atrações musicais ao vivo e videoclipes; Bem-Estar dará aulas de Yoga e dicas de beleza. O que torna tudo mais interessante, no entanto, são os shows com conteúdo voltado para o modo de vida desse público. Sonhos são Reais, por exemplo, mostra mini-documentários com histórias de moradores que atingiram seus objetivos na vida. Comida da Favela não traz apenas receitas culinárias, mas ensina como evitar o desperdício, cultivar alimentos e aprimorar técnicas de reciclagem. Reformas Rápidas, por sua vez, dá dicas específicas de decoração, com ideias para aproveitar melhor o espaço e reutilizar objetos.
14 milhões de brasileiros vivem em favelas: são 8% da população
Por despertar a curiosidade de audiência no exterior, essa linguagem original está atraindo a atenção de emissoras fora do Brasil: um canal japonês e outro norte-americano já negociam acordos para licenciamento do conteúdo visando produtoras internacionais.
R$ 150 bilhões é o tamanho desse mercado para as agências publicitárias
O projeto +FavelaTV (maisfavelatv.com) nasceu de uma parceria entre a ONG G10 Favelas e a Sou+Favela, empresa de mídia fundada para conectar a periferia às marcas interessadas nesse público. Apesar de ter sido pensada para a internet, há uma negociação em andamento com TVs por assinatura. A razão é simples: o potencial do mercado formado não apenas pelos 150 mil moradores de Paraisópolis, mas por 14 milhões de brasileiros que vivem em situação semelhante. “Para quem quer fugir dos estereótipos, as possibilidades são gigantescas”, afirma o diretor geral Maurício Alvarenga. O executivo, que já passou pela Turner International e ViacomCBS, destaca ações locais complementares, como a instalação de Wi-Fi gratuito e a distribuição dos “outdoor de favelas”, espaços publicitários com remuneração voltada para os moradores. Para Gilson Rodrigues, a iniciativa gera o desenvolvimento de um ecossistema com forte apelo comercial. Ele cita o exemplo do Favela Brasil Xpress, empresa de logística criada para entregar produtos do comércio eletrônico em residências sem CEP. “Conhecemos esse público e sabemos que ele não quer sair daqui. Pelo contrário: os moradores têm muito orgulho do local onde estão. Eles desejam prosperar aqui na favela”, diz Alvarenga. Pela primeira vez no País, um reality show vai mostrar a realidade brasileira.