27/10/2022 - 17:30
Apesar do fim da corrida presidencial neste domingo, o jogo pelo poder no Congresso em Brasília está apenas começando. Com a definição do novo inquilino do Planalto, ganha fôlego a eleição pelo comando da Câmara e do Senado, prevista para fevereiro de 2023. A disputa pelo Salão Verde, aliás, pode acabar em uma queda de braço de pesos-pesados do Centrão: o deputado Arthur Lira, ladeado por Ciro Nogueira (PP), contra Valdemar Costa Neto, o chefão do PL.
É que o deputado marchou ao lado de Bolsonaro certo de que, quando chegasse a hora, teria como retribuição o endosso dos liberais à sua recondução à Presidência da Câmara. Logo após o partido de Valdemar emplacar a maior bancada da Casa, no entanto, ouviu de emissários dele que a aliança ainda não está fechada. O tempo fechou na capital.
A ambição de Valdemar guia-se por cálculos políticos. Formalmente, a justificativa é a de que, com 99 dos 513 deputados, o PL teria a prerrogativa de indicar o presidente da Câmara. A tese não se sustenta. Nos bastidores, diz-se que, experiente, o cacique antevê que a ala pragmática do partido pulará no barco de Lula, caso o ex-presidente vença as eleições.

E sabe que a base petista pode escolher um nome para concorrer com Lira — afinal, o PT lembra bem dos estragos feitos por Eduardo Cunha, oponente de Dilma Rousseff, com as “pautas-bomba” na Câmara. Aliados de Valdemar dizem, portanto, que não há razões para “açodamento” e que, em nome das negociações, neste momento, ele precisa manter uma “equidistância”.
A retórica, por óbvio, não encontra guarida no lado bolsonarista do Partido Liberal. Na semana passada, deputados da sigla aproveitaram uma reunião com Lira, na Câmara, para sinalizar apoio a ele, independentemente da orientação de Valdemar. “Eles garantiram que não existe, no PL, um movimento uníssono no sentido de rifá-lo”, pontua um parlamentar, que presenciou o encontro, sob reserva. “Lira fez um grande trabalho de cumprimento de acordos com o governo, o que é valorizado na política, e ajudou a ampliar o papel da Câmara no Orçamento. Na corrida, sai à frente de qualquer outro candidato. Mas, como costumamos falar na política, eleição e mineração, só depois da apuração”, completa.
Camaleão
Aliados de Bolsonaro, apontam que, se o atual presidente bater Lula, Valdemar, acostumado à dinastia, pode perder poder dentro do PL. “Apesar de os veteranos serem maioria, uma boa parte do PL na Câmara e no Senado é ligada ao bolsonarismo. Valdemar teria dificuldade na manutenção de sua hegemonia. O PL funcionaria com ‘dois comandos’, com o capitão tendo a vantagem de ter as chaves do cofre do governo e, portanto, a chance de ampliação de sua ascendência”, analisa um liberal.
Há mais na história. Liberais crêem que o suspense pode forçar uma barganha entre PL e PP: o partido de Valdemar se disporia a apoiar Lira, desde que a sigla recebesse o endosso da legenda comandada por Ciro Nogueira para bater Rodrigo Pacheco na corrida pela Presidência do Senado. Nesse caso, a conta política vale para um cenário com Lula ou Bolsonaro no Planalto. O que mudaria seria apenas o perfil do candidato escolhido por Valdemar para o Salão Azul.
Caso o petista se consagre vencedor, a ideia é que Valdemar opte por um nome mais comedido para enfrentar Pacheco — são cotados, por exemplo, Wellington Fagundes, um aliado de longa data; Eduardo Gomes, um parlamentar habilidoso com bom trânsito, inclusive entre partidos de esquerda; e Tereza Cristina, desde que a ex-ministra migre do Progressistas para o PL.
Se for Bolsonaro o presidente eleito, torna-se prioridade a escolha de um senador que tope dar início ao processo de impeachment de Alexandre de Moraes, segundo admitem, sob reserva, congressistas. “O perfil buscado seria o de alguém com habilidade para desviar das ondas e não virar o barco de cabeça para baixo, mas com firmeza para enfrentar a tempestade”, descreve um aliado do Planalto à ISTOÉ. Os nomes mais “políticos”, portanto, estariam descartados pelo receio de que se transformem em “novos Pachecos”, já que o pessedista é conhecido pela firmeza na defesa das instituições. Entre os bochichos, já foram aventadas as indicações de Damares Alves e Magno Malta — mas, mesmo para os bolsonaristas, eles tenderiam a “radicalizar demais”. Cita-se, também, Wilder Morais. “Mostra experiência, porque foi senador depois da cassação de Demóstenes Torres, e teria peito para levar o impeachment de Moraes adiante”, completa a mesma fonte.
A decisão de Valdemar de manter o jogo aberto não surpreende os políticos de sua cozinha, que vêem há décadas a habilidade do mensaleiro em se reinventar em nome do poder. O todo-poderoso do PL já está em uma situação confortável — ao eleger as maiores bancadas da Câmara e do Senado, garantiu as maiores fatias dos fundos eleitoral e partidário para as próximas eleições municipais e nacionais e retomou o status de um dos nomes mais influentes da capital. Depois da disputa presidencial, como um camaleão, se acomodará no lado que melhor lhe servir. Poucos nomes representam tão bem o jeito de fazer política do Centrão.