“Não é um blefe”, garantiu Vladimir Putin sobre o uso de armas nucleares, no caso de a Ucrânia seguir atrapalhando seus planos de anexar à Rússia ao menos quatro províncias já parcialmente ocupadas no leste e sul do país vizinho. Ele quer incorporar essas províncias por meio de referendos-relâmpago neste fim de semana – uma farsa, denuncia a comunidade internacional. Para “defender” essas posições, disse estar preparado para usar “todos os meios”, depois de anunciar a convocação de mais 300 mil soldados. A ameaça de Putin, na quarta-feira, 21, representou a maior escalada do conflito desde a invasão, em 24 de fevereiro, e se segue a uma série de humilhantes derrotas militares.

Nem no auge da Guerra Fria os soviéticos ousaram sacar seu arsenal atômico. O temor é que o russo use bombas nucleares táticas, com potencial mais restrito e menor efeito residual. Por isso, Putin vê diminuir o pequeno apoio internacional que ainda detém (da China, principalmente). O alerta sobre um desastre nuclear sem qualquer precedente rodou o planeta como um rastilho de terror, provocando reações imediatas. Na Assembleia Geral da ONU, em Nova York, Joe Biden advertiu Putin que “uma guerra nuclear não tem vencedores e, portanto, nunca deve ser travada”. Acusou o Kremlin de violar descaradamente os princípios de adesão às Nações Unidas com a invasão da Ucrânia e disse que a ameaça nuclear é irresponsável. “A guerra na Ucrânia é brutal e desnecessária, decidida por um homem.” Ao mesmo tempo, pediu pelo “fortalecimento de acordos de não-proliferação nuclear por vias diplomáticas”.

TOM ACIMA Analistas detectaram ameaça mais séria de Vladimir Putin; Joe Biden disse que “guerra nuclear não tem vencedores e, portanto, nunca deve ser travada” (Crédito:Russian Presidential Press Service via AP)

Na Rússia, o movimento antiguerra Vesna convocou manifestações, divulgando nota de que “Você não precisa morrer por Putin. Você é necessário na Rússia por aqueles que amam você. Para as autoridades, você é apenas bucha de canhão”. Prisões em massa foram feitas, logo após Putin anunciar a mobilização por mais tropas. Em poucas horas não havia mais vaga em voos para fora do Rússia, rumo a Geórgia, Turquia, Armênia, Azerbaijão, Cazaquistão, Uzbequistão e Quirguistão (basicamente, países onde vistos não são necessários para russos). O presidente ucraniano Volodymyr Zelenskiy disse que “o mundo não vai permitir que a Rússia use armas nucleares”. Também afirmou que negociações de paz só acontecerão se Putin retirar suas tropas da Ucrânia.

Anna Moneymaker

Blefe e fraqueza?

Os gestos de Putin foram encarados com apreensão, mas também como um sinal de fraqueza. Peter Stano, porta-voz da Comissão Europeia, garantiu que os “referendos falsos e ilegais de Luhansk, Donestsk, Kherson e Zaporizhzhinia não serão reconhecidos”. Jens Stoltenberg, o secretário-geral da OTAN, criticou a retórica nuclear “perigosa e imprudente”. Para o ex-secretário da aliança militar, Robertson de Port Ellen, ela “esconde fraqueza”. A mesma leitura fizeram Ursula Von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, e Liz Truss, primeira-ministra do Reino Unido. As duas divulgaram nota conjunta na ONU, dizendo que as declarações de Putin indicavam que a invasão russa está se fragilizando. Para o chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, a ameaça de Putin foi um “ato de desespero”.

Além da resposta contundente de Biden, que já havia ameaçado com uma resposta “proporcional” diante do uso de armas de destruição em massa, as nações que já sofreram a ocupação soviética, como os países bálticos, foram as mais enfáticas contra a nova intimidação. A Lituânia quer sua força de reação rápida em alerta máximo e a Finlândia disse que os 1.300 quilômetros de fronteira com a Rússia estão sendo monitorados de perto por forças bem preparadas. Enquanto a sociedade russa não consegue reagir a Putin, que aproveitou o conflito para calar a oposição e reprimir a imprensa, resta à comunidade internacional mostrar que ele mesmo poderá ser vítima de sua aventura imperial.

Lideranças classificam ameaça nuclear como inaceitável

“Aqueles [países] que hoje se calam servem a um novo imperialismo”
Emmanuel Macron, presidente francês

“A lei deve vencer a força e a força nunca pode ser mais forte que a lei”
Olaf Scholz, primeiro-ministro alemão

“Faremos tudo o que pudermos para que a Otan apoie mais a Ucrânia”
Mateusz Morawiecki, primeiro-ministro polonês

“Putin faz uma aposta perigosa, parte de seu arsenal de terror”
Peter Stano, porta-voz da Comissão Europeia