10/03/2023 - 9:30
Caiu do cavalo quem apostava que o titular das Comunicações, Juscelino Filho (MA), seria apeado do governo por ter utilizado um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para participar de leilões de cavalos de raça. O ministro segue no cargo, pelo menos por ora. Não que tenha convencido Lula de sua inocência: o presidente foi pragmático – o governo precisa dos votos do União Brasil, partido de Juscelino, para fazer avançar suas pautas no Congresso. Os votos são fundamentais, especialmente para aprovar a Reforma Tributária, uma das principais promessas da equipe econômica do petista. A sigla tem 59 deputados federais e 10 senadores, e se movimenta para formar uma federação e futuramente se fundir com o PP de Artur Lira, presidente da Câmara e prócer do Centrão. Não é pouca coisa.
Como mostrou o jornal O Estado de S. Paulo, o ministro utilizou avião da FAB para voar de Brasília para São Paulo no dia 26 de janeiro, uma sexta-feira, para alguns poucos compromissos oficiais, que foram cumpridos em menos de três horas. Eram reuniões com a diretoria da operadora Claro e com as gerências regionais da Telebrás e da Anatel. Prolongou a estadia até a segunda-feira seguinte, sem agenda oficial – e recebeu diárias, num total de R$ 3 mil, referentes ao final de semana em que prestigiou um leilão de cavalos de raça e a inauguração de uma praça em homenagem ao cavalo Roxão, de propriedade do seu sócio. Juscelino diz estar sendo vítima de “ataques distorcidos”, e o caso será submetido à Comissão de Ética Pública da Presidência da República. No ano passado, o ministro, que é aficionado pelos equinos, havia omitido da Justiça Eleitoral um patrimônio de R$ 2 milhões em cavalos de raça. Também pesam contra ele a destinação de verba do orçamento secreto para asfaltar uma estrada em suas fazendas em Vitorino Freire, no interior do Maranhão, e a proximidade excessiva com empresários que têm contratos milionários com a prefeitura do município, comandada por Luanna Bringel, sua irmã.
Ao manter Juscelino no posto, o presidente optou por uma política de redução de danos. Na terça-feira, o ministro foi ao Palácio do Planalto para apresentar sua defesa a Lula. Também participaram da reunião os titulares das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, e da Casa Civil, Rui Costa. Não há como saber ao certo o que ocorreu a portas fechadas, mas o ministro das Comunicações saiu animado do encontro. Por meio de suas redes sociais, falou sobre agendas futuras ao lado de Lula, como a inauguração de um projeto para ampliar o acesso à internet na Região Amazônica.

A avaliação do Planalto é que, no momento, a prioridade deve ser a consolidação da base do governo no Congresso – mesmo com o elevado custo político de manter o ministro no cargo. Mais uma vez, portanto, o pragmatismo do presidencialismo de coalizão se sobrepôs à ala ideológica do PT, representada por Gleisi Hoffmann. A presidente do partido vinha cobrando o afastamento de Juscelino, o que acabou irritando parlamentares do Centrão e também ministros palacianos. No PT, discordâncias públicas como essa não são novidade. Recentemente, Gleisi também criticou publicamente a desoneração sobre combustíveis defendida por Fernando Haddad, ministro da Economia. E no ano passado, a petista também protestou quando Lula iniciou as tratativas para ter como vice em sua chapa Geraldo Alckmin (PSB).
“Hoje o governo não tem base consistente nem na Câmara nem no Senado” Arthur Lira, presidente da Câmara
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Coincidência ou não, são do União Brasil os dois ministros que vêm dando bastante dor de cabeça para o governo. Antes do surgimento dos episódios escandalosos envolvendo o nome de Juscelino Filho, era a ministra do Turismo, Daniela Carneiro, quem dominava o noticiário. Suspeita de ligação com milicianos, ela é mulher do prefeito de Belfort Roxo, conhecido como Waguinho. Em 2018, quando se elegeu deputada federal pelo estado do Rio de Janeiro e foi campeã de votos, teve como cabo eleitoral o ex-policial militar Juracy Alves Prudêncio. Conhecido como Jura, o ex-militar foi condenado por homicídio e apontado como chefe de uma milícia da Baixada Fluminense. De acordo com a assessoria de Daniela, “apoio político não significa que ela (a ministra) compactue com qualquer apoiador que por ventura tenha cometido algum ato ilícito”, e que “compete à Justiça julgar quem comete possíveis crimes”.

Embora comande três pastas na Esplanada dos Ministérios – o pedetista Waldez Góes é indicação do senador Davi Alcolumbre (União Brasil) –, o partido, que nasceu a partir da fusão entre o Democratas e o PSL, se diz ”independente”. Depois de confirmar sua permanência no Ministério das Comunicações, Juscelino Filho prometeu que a legenda será uma “grande parceira do governo” nas votações. Mas em evento da Associação Comercial de São Paulo, na terça-feira, Artur Lira fez questão de reforçar que Lula não tem hoje votos suficientes para aprovar seus projetos. “O governo não tem base consistente nem na Câmara nem no Senado”, disse. Pelo andar da carruagem, e em nome da “governabilidade”, o Centrão vai se manter no centro do poder – e não há sinais de que vá perder o fôlego tão cedo.
