31/07/2020 - 9:30
Desde o lançamento do best-seller .O capital no século XXI, que já vendeu mais de 2,5 milhões de exemplares desde 2014, o economista Thomas Piketty se transformou em fenômeno e cada novo livro é recebido como um evento. Em linhas gerais, sua obra é um extenso estudo atuarial da renda nos últimos 250 anos e a mensagem é que o mundo está condenado ao aumento da desigualdade. Portanto, é necessário erradicar o capitalismo para se obter uma sociedade justa. Essa simplificação quase caricata não está muito longe das teses defendidas pelo francês.
Sua visão utópica causa atritos irritados com o mundo político. Na França, ele sugere candidamente taxar os ricos em até 90%. A proposta é fantasiosa. Na verdade, a hipertaxação dos ricos, já abandonada, afundou a economia francesa e destruiu o Partido Socialista. No Brasil, sua teoria também se choca com os fatos. Ele tentou participar do debate da Reforma Previdenciária, em 2019, e seus argumentos foram demolidos por Pedro Fernando Nery, Paulo Tafner e Arminio Fraga em O Estado de S.Paulo (“A lacroeconomia de Piketty”). No recém-lançado Capital e ideologia (também editado pela Intrínseca), ele discorre sobre como a política falha para reverter a injustiça social. Ao abordar o PT, faz afirmações que soam risíveis. Segundo ele, o verdadeiro sufrágio universal no País só foi obtido com o partido de Lula. A transformação só não foi perfeita por injunções políticas que o partido não conseguiu, ou não soube, enfrentar, como a regulação social da mídia ou o financiamento das campanhas eleitorais.
Há um quê de nova esquerda, já envelhecida, nesse cenário. O PT e outras forças representariam uma inexorável marcha rumo ao socialismo, a ser analisada apenas pela clivagem identitária (por fronteiras, por exemplo) e pela clivagem classista (desigualdades socioeconômicas que cresceram, na visão do francês, após o reaganomics
e a revolução liberal de Thatcher).
São teses difíceis de engolir. O maior problema é que essa visão marxista pressupõe, para Piketty, que se negue
o populismo. Ele mesmo dá a chave para o problema. No Brasil, falar de populismo bolsonarista pressupõe admitir um populismo lulista. Não é o único contorcionismo teórico. Nos 13 anos de petismo, a concentração de renda não diminuiu. No mundo não acadêmico, a pandemia trouxe novos desafios e pensar diferente é inevitável. Já evitar a política, ou praticá-la com uma mentalidade anacrônica, pode ser exuberante para o debate intelectual, mas tem escassa utilidade prática.
Sensação da nova esquerda, economista francês exibe uma visão irreal do PT e propostas utópicas desconectadas da realidade