“Meu pai queria que eu fosse gerente de uma loja. Respondi que nunca trabalharia em algo que tivesse de fazer a mesma coisa todos os dias.” George Lucas, criador de Star Wars (Crédito:Divulgação)

Há muito tempo, em uma galáxia distante, alguém teve a ideia genial de fazer um filme utilizando efeitos especiais. A origem dessas técnicas se confunde com a própria história do cinema: no início, as imagens que surgiam em movimento nas telas foram recebidas pelo público como se fossem parte de um universo mágico, onde tudo era possível.

Há controvérsias sobre a primeira produção a utilizar esse tipo de recurso. Em 1902, o francês Gaston Méliès produziu Viagem à Lua: com 14 minutos de duração e inspirado por Júlio Verne e H.G. Wells, é considerada a primeira obra da ficção científica. Já os norte-americanos defendem que o primeiro efeito especial veio em 1895 – A Execução de Mary, Rainha da Escócia, de apenas 1 minuto, traz uma cena da decapitação em que a atriz foi substituída por um boneco no momento crucial.

Esse era um universo romântico até entrar em cena George Lucas, enfant terrible de Hollywood e obcecado por carros de corrida, livros do mitologista Joseph Campbell e aviação – ele tem um filho chamado “Jett”, variação de “jato”, em inglês. O diretor de 30 anos havia chamado a atenção da indústria pela originalidade de seus dois primeiros filmes, THX 1138 e Loucuras de Verão (American Graffiti). Contratado pela 20th Century Fox, seu novo projeto seria ainda mais ambicioso. Ele sonhava com um filme que misturasse ficção científica e ação em uma escala nunca vista: o resultado foi Star Wars – Guerra nas Estrelas, uma das franquias mais bem-sucedidas nas bilheterias até hoje.

CRIATIVIDADE Maquete da Milenium Falcon, de Han Solo: inspiração para o modelo da espaçonave veio do formato de um hambúrguer (Crédito:Divulgação)

Para alcançar seu objetivo, Lucas precisava reunir um time à altura. Saiu em busca de jovens ilustradores, mecânicos, modelistas, escultores e inventores. Queria contratar garotos sem muita experiência, para que chegassem com um olhar fresco e sem os vícios dos profissionais acostumados à rotina dos grandes estúdios. Nascia então a Industrial Light & Magic, empresa criada inicialmente para atender ao projeto Star Wars. O sucesso foi tão grande que a IL&M tornou-se um império descolado de sua criação, passando desde então a prestar serviço para todos os outros estúdios em filmes como E.T. – O Extraterrestre, Parque dos Dinossauros, Titanic, Avatar, Harry Potter e as produções da Marvel, entre outros.

Essa jornada pela história dos bastidores de Hollywood é contada na nova série documental Light & Magic, dirigida por Lawrence Kasdan e em cartaz no streaming Disney+. O artista conhece bem esse mundo: ele foi roteirista de O Império Contra-Ataca, O Retorno de Jedi e O Despertar da Força, todos da série Star Wars. Além de curiosidades para os fãs, a produção em seis episódios faz uma homenagem aos pioneiros do cinema. Chamados por George Lucas de “gangue dos excluídos”, os fundadores da IL&M tinham um perfil parecido: eram todos típicos hippies dos anos 1970, mas com vocação intuitiva para a tecnologia.

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O primeiro a ser convocado foi John Dykstra, assistente de Douglas Trumbull, mestre responsável pelos efeitos especiais de 2001: Uma Odisseia no Espaço, de Stanley Kubrick (leia o box à direita). Um dos profissionais mais completos de sua geração, Dykstra colocou um anúncio na revista Monstros Famosos da Terra do Cinema, editada pelo mestre do terror Forrest J. Ackerman. Na publicação, os leitores trocavam informações sobre materiais e técnicas.

Foi assim que ele encontrou Joe Johnston, Lorne Peterson, Dennis Muren e Ken Ralston. Alguns começavam a trabalhar na Cascade Pictures,  primeiro estúdio a ter uma divisão de efeitos especiais. Além das experiências em comum – eram todos cineastas amadores, com curtas-metragens que abusavam da criatividade –, eles compartilhavam o amor por um artista que mudou o cinema nos anos 1950: Ray Harryhause, gênio por trás dos filmes Simbad e a Princesa e Monstro de um Mundo Perdido. As novas gerações devem muito a esses pioneiros da ilusão.

Obra-prima original

Em Light & Magic, George Lucas revela que a maior influência para o visual de Guerra nas Estrelas foi 2001: Uma Odisseia no Espaço (1968), obra-prima de Stanley Kubrick – ele foi agraciado com o Oscar de Efeitos Especiais, junto com o diretor de fotografia Douglas Trumbull. Lucas, porém, achava o longa muito lento para o público adolescente. Decidiu, então, combinar as imagens do espaço com cenas de combates aéreos da Segunda Guerra, criando um estilo mais dinâmico. Relançado em 4K, a obra de Kubrick continua incrivelmente atual devido ao seu caráter visionário. O estilo do filme influenciou a própria NASA e até empresas atuais de tecnologia. Impossível, por exemplo, ouvir o robô HAL 9000 e não associá-lo aos assistentes de voz atuais, como a Alexa, da Amazon. Ou ver Dr. Floyd falando com a filha pela tela do telefone e não se lembrar das chamadas por Zoom. Entre todos, Kubrick foi mesmo o maior.

VISUAL Stanley Kubrick em ação: seu filme influenciou até a própria NASA (Crédito:Divulgação)
VISIONÁRIO A nave espacial por dentro (à esq) e sua estrutura externa (acima): o futuro criado em 1968 (Crédito:Divulgação)