O livro mais vendido em todo o mundo tem 773.693 palavras e acaba de ganhar mais três. Essa quantidade parece ser algo irrelevante, mas não é quando se trata da Bíblia. Um grupo de pesquisadores de diversas universidades descobriu recentemente um novo trecho que denominaram “capítulo oculto”, escrito há aproximadamente 1.500 anos. O estudo refere-se ao capítulo 12 de Mateus no Novo Testamento. Na escritura original, em grego, o primeiro versículo diz: “Naquela época, Jesus passou pelas searas no sábado e seus discípulos ficaram com fome e começaram a colher as espigas e comer”. Já a tradução, em idioma siríaco, relata: “[…] começou a colher as espigas, esfregá-las nas mãos e comê-las”.

O trabalho foi divulgado pela revista Estudos do Novo Testamento da Universidade de Cambridge, na Inglaterra. E, para além de indicar novas palavras, tal trecho da escritura sagrada confere melhor compreensão e reforça a mensagem original. “As traduções dos textos bíblicos eram feitas por copistas que as adequavam acrescentando palavras mais conhecidas por sua comunidade”, afirma o historiador e teólogo paulista Gerson Leite de Morais. O termo “capítulo oculto” veste como luva nesse caso. A passagem foi encontrada sob três camadas de textos já existentes no mesmo pergaminho (material feito de couro de ovelhas). É necessário lembrar que nesse período a prática era comum, pois a quantidade de pergaminhos disponíveis era escassa. Então, sim, anotações mais antigas eram apagadas para dar lugar a novas. Por sorte, vestígios permaneciam. Somente três textos em siríaco eram conhecidos. O primeiro está guardado na Biblioteca Britânica e os outros dois no Mosteiro de Santa Catarina, no Monte Sinai, no Egito.

CIÊNCIA O medievalista Grigory Kessel: especialista em leituras raras e quase indecifráveis (Crédito:Divulgação)

Os cientistas dividiram caprichosamente o trabalho em duas etapas: Iniciaram com a visualização da página do pergaminho e, depois, a leitura do conteúdo. Isso foi possível por meio da utilização de fotografias com luz ultravioleta (UV). Grigory Kessel, medievalista da Academia Austríaca de Ciência, esteve à frente da pesquisa. Ele foi o responsável por tornar legíveis palavras escritas no século III que foram copiadas no pergaminho 300 anos mais tarde. “A tradução siríaca é uma das mais antigas dos Evangelhos. Sua importância está em oferecer um grande número de leituras raras e únicas”, pontua Kessel. O material está guardado na Biblioteca do Vaticano, onde os estudos bíblicos e paleográficos devem continuar.