Contemplar as estrelas começa a ganhar um novo patamar no Brasil. O astroturismo está em expansão no País, com oferta de pacotes específicos para a modalidade. A prática envolve a observação dos astros, integra ecoturismo e o geoturismo. Mais do que isso, conscientiza sobre preservação ambiental e poluição luminosa ­— excesso de luz artificial emitida pelos grandes centros urbanos. Entre especialistas, viajar para estudar o céu noturno já era comum. Agora o público em geral passa a ter interesse na imensidão do universo.

Uma motivação para essa mudança de comportamento tem relação com o Parque Estadual do Desengano, em Santa Maria Madalena, no Rio de Janeiro. Em 2021, o local ganhou o título de primeiro Dark Sky Park (parque de céu escuro, em tradução livre) da América Latina — um reconhecimento dado pela Internacional Dark-Sky Park Association. Em resumo: foi atestado que a área tem conservação de qualidade excepcional para noites estreladas e ambiente protegido. “Esse título aguçou a curiosidade de muita gente e fez com que movimentasse toda uma estrutura para que as pessoas pudessem visitar o parque”, avalia Marcelo de Oliveira Souza, professor da Universidade Estadual do Norte Fluminense e coordenador do Clube de Astronomia Louis Cruls. “Ajuda a movimentar a economia da região. Santa Maria Madalena agora é conhecida como Cidade das Estrelas”, aponta o astrofísico.

De fato, virou um negócio. Em Cambará do Sul, no Rio Grande do Sul, o hotel Parador oferece o pacote Imersão nas Galáxias a seus hóspedes. Também em localização avantajada como o Desengano, o estabelecimento se beneficia por estar longe da poluição luminosa. Aliás, essa informação motivou Rafael Pecci, diretor de marketing do empreendimento, a conceber a expedição de observação. “Nossa experiência começa ainda de dia, no pôr do sol, quando o especialista explica a razão das diferentes cores no céu antes da chegada da noite”, diz. “É possível enxergar a sombra da Terra, satélites e galáxias, como a Via Láctea em seu esplendor. Com um pouco de sorte, algumas estrelas cadentes deixam tudo mais emocionante.” O conforto não fica de fora, pois o programa inclui piquenique com queijos, vinhos e espumantes. O tour é conduzido por Egon Filter, astrônomo e astrofotógrafo, que não somente dá uma aula: é o responsável pelas fotos espetaculares que os clientes levam para casa. “Foi uma experiência sensacional, interessante e educativa. Valeu cada minuto”, enaltece o empresário Romar Antônio Petry, de 62 anos, que fez o passeio em março último. A Imersão é oferecida por R$ 690 por pessoa.

ESPETÁCULO Astroturistas observam a Lua em trilha no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, em Goiás: educação científica (Crédito:Divulgação)

Na Chapada dos Veadeiros, em Goiás, os viajantes encontram a Céu de Gaia, agência de turismo científico-cultural com profissionais da Universidade de São Paulo e Universidade Estadual de Campinas. Entre as opções há o Tour astronômico no Observatório Bellatrix e a Trilha da Lua no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. O astrônomo Elielson Pereira, um dos fundadores, idealizou o conceito durante sua pós-graduação no Chile, referência no astroturismo. “Por lá, vivi temporada de eclipses e pensei que isso poderia ser feito no Brasil. Clubes de astronomia costumam fazer passeios de exploração, mas defendo que essa é uma ciência para todos”, considera.

As vivências no coração do País são beneficiadas igualmente pela localização, com o privilégio da altitude – 1.700 em alguns pontos. “Aqui temos o deslumbramento de poder ver tudo a olho nu. O céu é cristalino e o horizonte é livre.” A depender do tour, os valores iniciam em R$ 175, pois divulgar a educação científica é o propósito do empreendimento. “Nossa intenção é trazer uma ciência acessível e democrática, sem terminologias acadêmicas. Falamos sobre as fases da Lua e sobre as manchas solares, por exemplo, de maneira lúdica”, explica o físico Raphael Alves Silva, também sócio.

O interesse acerca de corpos celestes e fenômenos que se originam fora da atmosfera da Terra vai muito além. “As crianças querem saber como nascem as estrelas. Os adultos procuram entender o que significa dizer que somos feitos de poeira estelar. E tem quem pergunte de disco voador, extraterrestres ou se a ciência sabe alguma coisa sobre isso”, diverte-se Silva. O universo instiga.