29/04/2022 - 9:30
Um dos principais museus da Europa, sede de um impressionante acervo artístico e com algumas das mais famosas obras de arte da história, a Galleria degli Uffizi, em Florença, é destino obrigatório para os admiradores da Renascença. Suas paredes abrigam, entre outros tesouros, O Nascimento de Vênus e A Primavera, de Botticelli, A Sagrada Família, de Michelangelo, e Retrato do Papa Leão X com Dois Cardeais, de Rafael. A Uffizi sempre foi um dos principais atrativos culturais da Itália, e em 2021 ela superou pontos tradicionais como os museus do Vaticano, as ruínas de Pompeia e até o Coliseu: mais de 1,7 milhão de visitantes passaram por seus corredores. Para efeito de comparação, o Coliseu, a segunda atração do ranking teve cerca de 100 mil visitas a menos.

Não foram apenas clássicos como a Medusa, de Caravaggio, ou a Anunciação, de Leonardo da Vinci, que levaram a Galeria Uffizi a essa posição privilegiada no turismo italiano. O público foi atraído também pela integração dos quadros históricos com as obras de arte contemporânea do acervo. Esse movimento em prol de uma arte mais inclusiva é uma tendência mundial e visa atingir um público mais jovem e diversificado. Na Uffizi, esse processo tem sido conduzido com sucesso desde 2015 pelo curador e historiador alemão Eike Schmidt.
Por suas mãos, se deu o aumento da presença de artistas mulheres e de diversas etnias. É o caso, por exemplo, da pintora e escultora japonesa Yayoi Kusama, assim como do etíope Tesfaye Urgessa, cuja obra combina a tradicional iconografia africana e o neo-expressionismo alemão. Pelo menos duas exposições anuais serão dedicadas a artistas mulheres: em 2021 foi a vez da mostra A Cicatriz, um alerta sobre a violência contra a mulher, e da exposição A Dor não é um Privilégio, com fotografias de mulheres que sofreram tentativas de feminicídio.
Instituição italiana, que não tinha sequer um site em 2015, hoje reúne quase um milhão de seguidores nas redes sociais
Outro destaque da temporada foi o escultor britânico Antony Gormley, aclamado por suas instalações que tratam da relação entre o corpo e o espaço, e o belga Koen Vanmechelen, que inaugurou a exposição Seduzione, com criaturas fantásticas de forte impacto visual. Vanmechelen propôs a integração do clássico com o contemporâneo numa cena simbólica ao expor, ladeando a Medusa de Caravaggio, suas esculturas Black Medusa e White Medusa.
“Se a Uffizi não se abrir para a diversidade, fica para trás”, afirma a artista contemporânea Sheila Ribeiro, do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências da UFBA, Segundo ela, a cultura digital fez com que as pessoas passassem a se sentir cidadãos do mundo – “ao mesmo tempo em que existem muitos mundos, e não um só mundo”, conclui. “Na tensão entre raízes e rotas, há um desejo de expansão do direito à dignidade, com a consequente criação de espaços mais heterogêneos. Essas curadorias não vêm sozinhas, elas são resultado de movimentos e lutas que nascem no corpo e na experiência de pessoas e que criam uma pedra no sapato, um incômodo, que vira mudança.”
A popularidade da Galeria Uffizi também cresceu graças a sua presença nas redes sociais. Até 2015, a instituição não tinha sequer um website, o que, nas palavras do próprio Schmidt, colocava a galeria “na idade da pedra”. De lá pra cá, o local tornou-se um fenômeno da internet. Houve até uma iniciativa considerada fora da programação tradicional: a criação de um programa de culinária no Youtube. O Uffizi Da Mangiare apresenta chefs que preparam pratos inspirados no acervo do museu.
A atuação na internet aumentou muito o número de visitantes mais jovens, com idades entre 21 e 25 anos. As redes sociais são bilíngues, em italiano e inglês. Só no Instagram, o museu tem 714 mil seguidores. No Facebook, são 132 mil. Há até um perfil no TikTok, mais voltada para adolescentes, com 108 mil. No TikTok há predominância da cultura pop: os posts trazem as obras de arte fazendo dublagens ou tomando café, imagens que rapidamente viralizam e se espalham pelas redes. É o renascimento do museu renacentista.