Era a mulher mais famosa do mundo. E era a mulher que sentia a mais solitária do mundo. É assim que a atriz Ana de Armas define a personagem intepretada por ela na aguardada cinebiografia Blonde, que estreia na próxima quarta-feira, 28, na Netflix. Inspirado no best-seller de Joyce Carol Oates, o filme sobre a vida de Marilyn Monroe narra a improvável trajetória de uma garota tímida – cuja mãe fora internada à força com problemas mentais –, mas que, apesar das dificuldades, acabou se tornando, graças ao seu talento, a maior estrela de todos os tempos da história do cinema norte-americano.

Norma Jean Baker tinha sete anos quando foi abandonada por um tutor no orfanato de Los Angeles. Sairia dali apenas aos 16, para se casar com seu primeiro marido, o policial James Dougherty, oportunidade que aproveitou para escapar do local. Quatro anos depois, após dar os primeiros passos como modelo, divorciou-se e começou uma vida nova. Seu desejo por iniciar uma história totalmente diferente era tão grande que a primeira coisa que fez foi apagar o próprio nome: adotou o pseudônimo Marilyn Monroe e mudou-se para Hollywood. Aos 24 anos foi escalada para uma ponta em A Malvada, filme que chamou a atenção da indústria após ganhar 14 Oscars, em 1950. Quando a câmera do diretor Joseph Mankiewicz encontrou o rosto da Srta. Caswell, personagem da charmosa novata, houve um alinhamento dos astros: nascia ali uma história de amor entre o público e a grande estrela, que só terminaria em 5 de agosto de 1962, quando seu corpo foi encontrado após uma overdose de barbitúricos.

O primeiro grande sucesso de Marilyn veio com Torrentes de Paixão, de 1953. Logo surgiram Os Homens Preferem as Loiras, Como Agarrar um Milionário e O Pecado Mora ao Lado, além de Quanto Mais Quente Melhor, seu melhor papel. Após Dougherty houve outros dois relacionamentos, ambos complicados: o primeiro foi com o “Pelé” do baseball, Joe DiMaggio (Bobby Cannavalle, no filme); o segundo, com o premiado dramaturgo Arthur Miller (Adrien Brody), de A Morte do Caixeiro Viajante – isso sem contar o período como amante de John F. Kennedy (Caspar Phillipson). Em relação a ele, há algo perturbador: o suposto estupro pelo então presidente dos EUA é uma das cenas que têm recebido críticas nos festivais em que o filme concorreu.

SÓSIA Ana de Armas como Marilyn Monroe: o maior desafio foi imitar a voz (Crédito:Netflix)

Ana de Armas, protagonista de Blonde, chama a atenção não apenas pela semelhança física, mas pela encarnação dos trejeitos da homenageada. É o papel de sua vida – e a cubana de 34 anos sabe disso. Ela conta que o primeiro passo foi encontrar o registro vocal característico, agudo, que era a marca registrada da estrela. “Para mim, a voz foi o aspecto mais assustador da transformação”, afirma Ana. “Foi um processo desafiador que começou assistindo aos filmes e ouvindo entrevistas. Depois precisei encontrar referências fora dos momentos captados pelas câmeras, o que foi mais difícil. Ela era uma pessoa assustada, insegura. Pensava muito antes de falar porque sentia que tinha sempre que dizer algo inteligente. Sua entonação era típica de alguém que queria se aproximar das pessoas. Ela precisava disso porque nunca foi próxima de ninguém.”

A autora Joyce Carol Oates também falou sobre a adaptação de seu livro: “Blonde é fantástico porque não é o que eu esperava. É atmosférico e poderoso. A performance de Ana é inesquecível, lembrando as atuações de Charlize Theron em Monster e Robert DeNiro em Touro Indomável, ambos vencedores de Oscars”. Ela diz mais: “Quando Andrew me mandou o roteiro, vi que ele compreendeu o conflito central da história. Marilyn Monroe foi uma invenção brilhante de Norma Jean Baker, que salvou sua vida, inicialmente, mas que depois a engoliu.”

Andrew Dominik
Diretor

“A atriz tinha uma personalidade autodestrutiva”

Matt Kennedy/NETFLIX

O que o levou a adaptar o premiado livro de Joyce Carol Oates?
É difícil dizer. Foi algo subjetivo, como amor à primeira leitura. Fiquei atraído pela oportunidade de mostrar como um trauma de infância pode afetar a vida adulta. As pessoas acham que o filme é provocativo, mas tentei apenas relatar as experiências da atriz de maneira autêntica.

Era fã dos filmes de Marilyn?
Não. Eu tinha uma visão superficial dela, mas estava errado. Em O Príncipe Encantado, Marilyn oferece uma das melhores atuações que já vi. Temos de lembrar que se tratava de uma criança que veio do orfanato e se tornou a maior estrela do mundo. Tinha, porém, uma personalidade autodestrutiva.

Ana de Armas está excelente. Quando percebeu que ela era ideal?
É sempre instintivo, como se apaixonar pela pessoa certa no momento em que ela entra pela porta. Ana e Marilyn são pessoas muito diferentes. Ana foi criada para vencer, enquanto Marilyn, não. No fundo, atuar não é sobre acertar, mas sobre errar revelando a verdade.

O que Marilyn teria achado do filme?
Acredito que ela compreenderia que foi algo feito com amor. Tentei observar o mundo por meio de seus olhos, e com isso aprendi sobre sua vida. Ela logo entendeu que as pessoas se relacionavam com uma fantasia, não com uma mulher de carne e osso.