29/04/2022 - 9:30
Para não repetir os mesmos erros e cometer as mesmas atrocidades, não podemos apagar a memória ou reescrever a história. Após o extermínio de milhões de pessoas, entre elas judeus, deficientes, ciganos e homossexuais, a Alemanha virou ré no tribunal moral da humanidade. Carrascos nazistas foram perseguidos por décadas, julgados e condenados. A Alemanha se viu obrigada a indenizar suas vítimas e impelida a reconhecer publicamente o morticínio promovido pelo Terceiro Reich. Desde 1993, refutar o Holocausto é crime na Alemanha. Quem nega o morticínio e glorifica o nazismo pode ser condenado a até cinco anos de prisão. Em 2021, o país reconheceu o genocídio perpetrado contra duas etnias na Namíbia, ex-colônia alemã. Cerca de cem mil indivíduos dos povos herero e nama foram mortos pelos alemães entre 1904 e 1908.
No entanto, a Alemanha não foi a única a cometer atrocidades contra outros povos. Russos sob o comando de Joseph Stalin dizimaram cerca de cinco milhões de ucranianos, no genocídio que ficou conhecido como Holodomor, palavra que quer dizer “fome”.
Entre 1915 e 1923, a Turquia matou entre 600 mil e 1,5 milhão de armênios. Apesar das evidências históricas e da pressão de outros países, nem russos nem turcos reconheceram seus crimes. Negar ou tentar encobrir a história não apagará os fatos. Pois ainda que ninguém lhes dê voz, os mortos falarão por si. Fósseis de nossos ancestrais revelam marcas de violências cometidas entre grupos humanos – uns contra outros. Vítimas do fascismo espanhol contam suas histórias através de seus ossos, provas incontestes dos assassinatos cometidos pela ditadura do generalíssimo Francisco Franco.
Negar ou tentar encobrir a história não apagará os fatos. Pois, ainda que ninguém lhes dê voz, os mortos falarão por si
No Brasil, apesar dos fatos, dos fartos documentos, das revelações de torturadores e torturados, dos corpos das vítimas e dos mortos jamais encontrados, uma minoria teima em negar a ditadura e o golpe militar, que em 1 de abril completou 58 anos.
Há os que insistem em que o passado fique onde está, para que não venha assombrar de culpa e vergonha os torturadores e seus descendentes. O passado, entretanto, não se mata. Ele ecoa no presente e, para que não seja repetido no futuro, é preciso conjurá-lo para todo sempre. Como o Holomodor, o Holocausto e a escravidão, devemos lembrar e repudiar a grande tragédia política e civilizatória que foi a ditadura militar.
Graças à Lei da Anistia, assinada pelo último ditador, os criminosos do regime foram juridicamente perdoados — não é possível condená-los penalmente. Mas, lembremos: perdoar não é esquecer.