Confesso.

Nas últimas seis semanas estive obcecado pelo julgamento do caso Johnny Depp versus Amber Heard.

Não me julgue. Não sofro de nenhuma preferência especial por tabloides sensacionalistas ou fofocas de celebridades.

Assisti por curiosidade sobre um fenômeno que vai muito além do interesse pelo destino dos dois atores.

Esse julgamento, à primeira vista, parece um caso pontual, coisa de celebridades e suas vidas distantes do mundo real.

Ledo engano.

O que aconteceu nesse tribunal foi, em realidade, o melhor exemplo de como mudou, nas últimas décadas, a maneira pela qual a opinião pública recebe, digere e reage ao que é exposto pela mídia.

O caso Depp x Heard foi uma master class de como conquistar da preferência do público nos dias atuais.

Não entro no mérito das provas, pois, fossem elas únicas responsáveis pelas nossas escolhas, estaríamos vivendo outra realidade, na vida, na economia e na política.

Esse julgamento representou uma janela para assistirmos como se constrói, hoje, a preferência em um debate.

Foi à soma de pequenos gestos e fragmentos de comunicação que decidiram o veredito.

Acusada de difamação ao alegar que o ex-marido a fez sofrer diversos episódios de violência doméstica, Amber tinha tudo para vencer, principalmente pelo momento sócio cultural que atravessamos.

É fácil imaginar que a atriz poderia contar com o apoio de um contingente infinito de apoiadores, de todos os gêneros, feministas ou não.

Aqueles prontos para “cancelar” o ator, em seu primeiro deslize.

Num texto no Washington Post, de 2018, a atriz se valeu do movimento Me Too, para revelar ao mundo o que passou entre quatro paredes, com seu companheiro, um homem que sofreu, comprovadamente, problemas com álcool e drogas.

Ele, o monstro. Ela, a mulher forte, que se rebelou contra as agressões de um mundo machista.

A equipe de advogados de Amber se preparou para esse julgamento nos moldes do que faria no passado.

Mas não vivemos tempos óbvios.

Johnny Depp, de seu lado, optou por construir, dia após dia, uma persona cativante, além de qualquer fato.

Mostrou-se um sujeito humano, até ingênuo, de riso fácil, humor constante, recorrendo ao sarcasmo ou a seus dramas pessoais em momentos precisos.

Aos poucos, foram essas atitudes que conquistaram o público, seja no tribunal, seja nas redes sociais.

Foram esses gestos que demoliram a defesa de Amber Heard, não as provas e testemunhas.

Ocorre que um julgamento não é muito diferente de uma eleição. Não é diferente de uma votação no Supremo Tribunal Federal.

O que Ciro Gomes e Lula podem aprender com o ator norte-americano

Não é diferente da escolha do síndico de um condomínio.

Não foi a análise fria e lógica de fatos que elegeu Donald Trump ou Jair Bolsonaro.

Foi exatamente essa capacidade de encontrar falas e gestos precisos que conquistou a preferência do eleitorado.

Mesmo considerando que uma eleição envolve uma infinidade de outros fatores a capacidade de gerar empatia se tornou, hoje, ainda mais importante do que qualquer plano de governo ou promessa de campanha.

Por isso esse julgamento é digno de ser estudado.

A poucos meses das próximas eleições, os candidatos que desejam derrotar Bolsonaro, deveriam assistir a construção da vitória de Depp com base nas ferramentas que o ator usou para atrair a preferência de mais de 98% da opinião pública.

Se conhecesse essa lição, o experiente Ciro Gomes teria se dado melhor em seu debate com Gregório Duvivier.

E Lula deveria pensar nisso quando sobe num palanque para discursar como fazia há 20 anos, apenas para dar dois exemplos.

A verdade é que Johnny Depp tem muito a ensinar para nossos candidatos.

Quem diria?