24/02/2023 - 9:30
Talvez seja exagero decretar o fim da criatividade em Hollywood, mas os projetos anunciados pelos grandes estúdios nas últimas semanas dão a impressão de que a originalidade no cinema foi vítima de um vilão de filme de terror. Entre 2022 e 2023 foram produzidas mais de 48 sequências de sucessos anteriores, número que é recorde histórico. Trata-se de um sinal de que os estúdios não desejam investir em novas propostas, preferindo recorrer a produções que já têm público garantido. Isso significa que o elemento mais importante atualmente não é a inovação ou a qualidade artística, mas o nível de recall, a lembrança que a audiência guarda de uma realização anterior.
Continuações de grandes sucessos não são novidade, nem certeza de baixa qualidade. O Poderoso Chefão 2, O Império Contra-Ataca e Toy Story 2 estão aí para provar. Mas parece difícil justificar uma decisão artística que leve um estúdio a gastar dezenas de milhões de dólares em Velozes e Furiosos 10 ou em Pânico 6, como veremos em 2023. Andrea Giusti, produtora executiva da Abrolhos Filmes, acredita que o cenário é um reflexo da situação causada pela pandemia. “Os estúdios estão se recuperando lentamente e o retorno é maior em iniciativas comerciais. Sequências são uma garantia de público, uma aposta em algo que já deu certo”, afirma ela. “O mercado precisa de um estofo para se recuperar.” Segundo Andrea, o fenômeno se repete no Brasil: “também sofremos com a pandemia. Das cinco maiores bilheterias nacionais de 2022, três foram sequências”.
A estratégia, porém, tem incomodado artistas de peso. No Festival de Nova York, Martin Scorsese declarou que a busca por lucros bilionários “desvaloriza, degrada e diminui” o valor artístico das obras. “Desde os anos 1980, há essa obsessão com números. É meio nojento”. E continuou: “Sei que as produções custam caro e que esperam receber de volta o valor gasto, e mais um pouco. Mas a ênfase agora está só nos números. Como cineasta e como alguém que não consegue imaginar a vida sem filmes, acho isso um insulto”.

Apesar de ter dirigido tanto o original quanto a bem sucedida parte 2 da animação Os Incríveis, Brad Bird também faz críticas à movimentação: “As continuações começam a ser os únicos projetos em tamanho e ambição que Hollywood fará a partir de agora. E isso não é apenas triste. É míope”.
A situação não é simples. O executivo Bob Iger, que voltou ao cargo de CEO da Disney, anunciou a demissão de sete mil funcionários, entre outras razões, devido ao baixo resultado de produções originais como Encanto, Mundo Estranho e Lightyear. O estúdio confirmou três sequências: Toy Story 5, Frozen 3 e Zootopia 2. “Estamos nos inclinando para nossas marcas e franquias incomparáveis”, declarou.
Os números falam por si: o primeiro Toy Story, lançado em 1995, atrai fãs de diversas faixas etárias. A quarta parte da franquia faturou mais de US$ 1 bilhão em 2019, equivalente a mais de R$ 5 bilhões. Frozen, de 2013, é focado apenas no público infantil, mas é vitória garantida por ser uma das marcas de maior sucesso da Disney. O segundo longa da saga, também de 2019, ultrapassou US$ 1 bilhão nas bilheterias, assim como Zootopia, de 2016.

O tema é tão controverso que um dos mais bem sucedidos cineastas da história, Steven Spielberg, não poupou elogios às sequências, embora de forma indireta. Em um evento, ele derramou elogios a Top Gun: Maverick, arrasa-quarteirões estrelado por Tom Cruise e lançado em 2022, mas que já faturou mais de US$ 1,5 bilhão. O longa é a continuação de Top Gun, sucesso de 1986. “Você salvou Hollywood e o sistema de distribuição. Na verdade, Maverick pode ter salvado toda a indústria cinematográfica”, afirmou Spielberg. Pelo jeito, Maverick 2 vem aí.
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