03/03/2023 - 9:30
Há muita desinformação e mistificação no debate sobre a liberdade de informação na internet. Criminosos, terroristas, ditadores e milícias digitais encontraram nas redes sociais um terreno fértil para suas atividades. Como foram criadas há menos de 20 anos, até hoje tem prevalecido a falsa equivalência entre essas redes e a imprensa, por exemplo. Ou entre elas e os espaços públicos de debate, como TVs e rádios, que são concessões.
Trata-se de uma falácia. Desde o início, as redes sociais foram desenvolvidas com tecnologia sofisticada para promover determinados fluxos de informação – como notícias que causam reação extremada, por exemplo – ou para reunir grupos de interesse ou tribos identitárias. Tudo para expandir o próprio negócio e permitir sua monetização. Empresas querem lucrar, autocratas querem controlar sua população ou acabar com a democracia em países que os ameacem. É simples assim.
Nem os criadores do Twitter acreditam mais no sonho libertário original desse aplicativo. Elon Musk, depois de comprá-lo, já está instrumentalizando essa utopia para fins particulares.
O governo ensaia um retrocesso perigoso ao aventar a criação de um órgão de controle que ficaria sob a guarda do Executivo
Vladimir Putin foi um dos primeiros a perceber o potencial político da nova tecnologia. Donald Trump, um dos maiores beneficiários. Os democratas, com as facas nos dentes, reagiram e tentaram domar as big techs, até hoje sem sucesso. O ponto de inflexão pode ocorrer com a decisão da Corte Suprema dos EUA, que julgará em breve a responsabilidade do Google e do Twitter na difusão de ataques terroristas, ainda que não intencional. É o que provavelmente ocorrerá, restringindo a blindagem jurídica que beneficia essas corporações gigantescas. A proposta não é impedir a livre circulação de ideias, mas submeter as companhias ao controle sobre o conteúdo que promovem ou aos seus espertos algoritmos protegidos sob o argumento de segredo industrial.
Esse é o caminho para o qual a Europa se encaminha. E é o espírito do projeto de lei contra as fake news que já está maduro no Congresso, depois de anos de debate. O governo Lula, no entanto, ensaia um retrocesso perigoso ao zerar o jogo recomeçando esse debate e aventando a criação de um órgão que pode ficar sob controle do Executivo para regular as redes. Essa tarefa obviamente não pode ser assumida pelo governo de plantão. Cabe apenas ao Judiciário, com regras claras amplamente debatidas no Parlamento.
E a Justiça pode atuar com agilidade, algo que o mundo digital permite.