As apostas no mundo político são de que a campanha digital pelo Planalto em 2022 será mais agressiva do que a anterior. Há razões: enquanto Jair Bolsonaro inaugurou uma potente máquina de fake news nas redes sociais em 2018, o PT, de Lula, domina há mais de uma década táticas de difamação, empregadas primeiro por meio de blogs chapas-brancas e, depois, numa campanha eleitoral visando Marina Silva. A legenda não teria problemas em replicá-las no formato online. Eram remotas, portanto, as chances de um embate limpo entre as duas principais lideranças. Dito e feito. Os 15 primeiros dias de campanha destacaram-se pelas trocas de ataques, xingamentos e informações falsas e pelo vazio de propostas. Já foram ajuizadas 124 ações no TSE por propaganda irregular nas redes.
A esquerda, que saiu combalida do bombardeio digital de 2018, mostra que gosta do jogo. Ainda que, aconselhado por nomes próximos, Lula busque externar o estilo “paz e amor”, a militância não parece ter a mesma disposição. Escalado para ampliar o engajamento do petista nas redes, André Janones, por exemplo, segue o caminho oposto. O deputado mineiro diz que é preciso fazer a direita “provar de seu próprio veneno” e abusa de provocações aos filhos de Bolsonaro nas redes, além de incitar discussões com aliados do presidente presencialmente, como no dia em que bateu boca com Ricardo Salles.

“Se a gente continuasse o politicamente correto, daqui a pouco estaríamos todos nos porões de uma ditadura falando bonito” André Janones

Tão grandes são os embates que Carlos Bolsonaro buscou o Supremo depois de ser chamado pelo parlamentar de “miliciano”, “vagabundo” e “bosta”. A postura incendiária divide o PT. A ala mais combativa lembra que, em campanha, há “gente para todo gosto” e pontua que Janones dá uma resposta à altura do bolsonarismo, além de tirar Lula do alvo dos ataques. Para o núcleo mais duro, soa contraditório condenar o discurso de ódio de Bolsonaro e aplaudir a beligerância do parlamentar.

“Sério que tinha quem achava esse merda desse @CarlosBolsonaro um gênio das redes? Esse cara é um bosta gente!” André Janones

Do lado de Bolsonaro, a agressiva campanha nas redes é arquitetada por Carluxo e Sérgio Lima, amigo de Eduardo e ex-estrategista do Aliança Brasil, partido que o clã tentou criar. Nas plataformas do capitão, prevalece a reciclada estratégia de 2018, com a aposta nos embates com o PT, a vinculação do partido a ditaduras e a lembrança dos escândalos de corrupção que envolveram Lula — o mote é distinto do usado na propaganda eleitoral, onde o foco recai sobre a economia e feitos do governo, a exemplo do Pix e do Auxílio Brasil.

Apesar do alvo principal dos Bolsonaro ser Lula, sobram ataques para todos os lados. Depois do debate televisionado pela Band, no qual Soraya Thronicke criticou a misoginia do presidente, os filhos do capitão comandaram um massacre digital contra a presidenciável do União Brasil, lembrando que ela venceu nas urnas graças ao trabalho de Bolsonaro como cabo eleitoral. A senadora reagiu. “Fui sim, eleita com Bolsonaro, acreditando nas bandeiras do combate à corrupção. Logo após, me decepcionei por completo, começando por você, que me ligou aos berros exigindo a retirada da minha assinatura na CPI da Lava Toga”, escreveu, em uma publicação direcionada a Flávio Bolsonaro.

GABINETE Carlos Bolsonaro venceu o embate com o QG de campanha do pai, mais moderado, e administra os ataques nas redes (Crédito:Pedro Ladeira)

Sites na mira

A equipe de Simone Tebet foi outra a identificar o aumento da “animosidade” nas redes, com ataques à emebebista por representantes de diferentes espectros políticos. “A esquerda constrói uma narrativa a partir da ideologia, disparando, por exemplo, a notícia falsa de que ela tem terras em áreas indígenas, além de acusá-la de ter feito campanha para Bolsonaro. Já a direita encampa a tese de que ela deu fôlego à misoginia do Senado na sessão em que Nise Yamaguchi foi inquerida”, conta um estrategista, sob reserva.

Mas a ofensiva não se restringe aos candidatos e ao núcleo próximo de cada um. Impulsionados pela polarização, entusiastas das campanhas se engajaram na destruição de reputações. Nesse mês, endereços na internet ligados a Bolsonaro e a Ciro Gomes foram usados para atacá-los. O site em que o presidente divulgava ações do governo (bolsonaro.com.br), por exemplo, estampa em sua página inicial uma imagem dele vestido em uma farda com o símbolo nazista e o bigode ao estilo Adolf Hitler. Procurado, o Planalto não esclareceu se Bolsonaro deixou de pagar pelo domínio ou se ocorreu um ataque hacker. Houve, no entanto, reações. O ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres, determinou que a PF investigue o caso, e a equipe jurídica da campanha de Bolsonaro defendeu que o TSE derrube o site.

APÓCRIFO Site que apoiava o governo Bolsonaro passou a atacar o presidente (Crédito:Divulgação)

O advogado Paulo Moreira explica que plataformas apócrifas não são ilegais quando nutrem somente críticas a algum candidato, mas frisa que a liberdade de expressão termina quando é iniciada a divulgação de conteúdo inverídico ou ofensivo à honra, como no caso do site que mira Bolsonaro. “A tendência é que piore”, pontua. “O debate político deveria ser mais consistente, mas, como o presidente venceu em 2018 com o tiroteio nas redes, outros agora querem usar a mesma estratégia”, completa. A campanha de 2022 comprova que o mal leva ao mal. Perde o eleitor.