27/10/2022 - 17:30
Rishi Sunak senta na cadeira de primeiro-ministro em meio a uma das mais profundas crises da história do Reino Unido. O que os súditos querem saber é: como esse bilionário, que tem um patrimônio maior do que o rei Charles III, vai tratar a população, emparedada entre o alto custo de vida e a insegurança social? O premiê diz que sua meta será conseguir “estabilidade econômica e confiança no governo”, por meio de “decisões difíceis” que baixem a inflação recorde e a dívida pública.
Como ex-ministro das Finanças, ele tem crédito dos investidores e mesmo de 68% dos britânicos, que confiam em sua competência, segundo a agência de pesquisas YouGov. Mas os desafios são grandes: 62% exigem a baixa no custo de vida. Responsável pelas finanças do país na pior fase da pandemia, Sunak liberou fundos para UTIs, equipamentos e vacinas. Era o que tinha a fazer. Mas a dívida pública, que já era alta, subiu mais ainda.
Com a guerra na Ucrânia, a crise virou uma tempestade. O ex-primeiro-ministro Boris Johnson caiu e foi substituído por Liz Truss, que ficou apenas um mês e meio no cargo. Ameaçado de implosão, o Partido Conservador decidiu por Sunak, 42 anos, em apenas um fim de semana.

Foi assim que os britânicos chegaram à inusitada situação de contar com um primeiro-ministro mais rico que o rei –ainda que boa parte da fortuna venha da mulher Akshata Mutry, herdeira da Infosys, líder global de software. O patrimônio do casal é de 730 milhões de libras, ou 4,5 bilhões de reais, enquanto o “pobre” rei conta com apenas 435 milhões de libras em ativos pessoais, nos cálculos da revista Forbes.

Sunak nasceu em Southampton, onde os avós aportaram, depois de emigrar de Punjab, na Índia. O pai foi clínico geral do respeitado serviço público de saúde, o NHS, e a mãe tinha uma farmácia. Sunak estudou em Oxford e fez MBA em Stanford, na Califórnia (onde conheceu a mulher, com quem tem as filhas Anoushka e Krishna). Tornou-se sócio de uma empresa de investimentos com atuação entre o Vale do Silício e Bangalore, na Índia.
Entre cruz e espada
Praticante do hinduísmo – e ainda de críquete e futebol –, Sunak e família irão morar na residência oficial da Downing Street. Mas mantêm o apartamento para visitas e a casa comprada em 2010 por cerca de R$ 28 milhões em Kensigton, sofisticado bairro de Londres; a mansão georgiana em North Yorkshire, com lago particular; e uma cobertura na Califórnia. O político havia sido eleito para o Parlamento em 2015 e reeleito em 2017 e 2019, pelo Partido Conservador. A defesa do Brexit lhe valeu o posto de ministro das Finanças, em 2020, quando começou a se projetar até chegar ao posto mais cobiçado da política britânica.
Para a economista Natalie Verndl, o Partido Conservador está rachado entre fiscalistas, que defendem a austeridade fiscal, e os que querem uma política mais populista. “A Liz Truss partiu para o corte de impostos dos mais ricos, mirando crescimento econômico, mas sem oferecer contrapartida, o que provocou forte reação dos mercados.
“Em tempos difíceis, protegerei os mais vulneráveis. Fizemos isso na Covid e faremos novamente” Rishi Sunak, primeiro-ministro britânico
A libra esterlina derreteu – o que, para os britânicos é um choque, da mesma forma que a inflação de dois dígitos aterroriza”, analisa. Sunak terá de equilibrar austeridade fiscal e cortes em benefícios sociais. Precisa de estabilidade, com manutenção das taxas de juros, controle da inflação (em 10,1%) e redução da dívida pública, explica a especialista. “Os juros devem bater acima de 5%, condição inaceitável para eles, enquanto o PIB tem previsão de queda em 2023.”
O professor António Costa Pinto, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, coloca o Brexit na raiz da crise. “A economia piorou muito com a saída da União Europeia. Trocas comerciais caíram 30% e não foram substituídas, como os conservadores esperavam, por alianças nos EUA e na Ásia”.
Por isso, o cientista político avalia que o novo primeiro-ministro fará uma “gestão de emergência”, onde o fundamental será a união política do governo. “Ele depende muito do partido. E os conservadores têm nele sua última chance, porque não passam de 20% nas intenções de voto. Se ele não se portar bem, nas eleições de 2025 o Partido Conservador será varrido do Parlamento. E por longos anos.”