20/04/2023 - 9:30
Elaborar uma proposta factível de arcabouço fiscal parecia ser um dos maiores desafios deste início de governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que em janeiro subiu a rampa do Palácio do Planalto para dar início ao seu terceiro mandato à frente da Presidência da República. De fato, a missão era complexa, mas os desafios foram superados e o projeto foi ao enviado ao Congresso na terça-feira, 18. Só que a parte mais difícil da empreitada vem agora: faltam os votos para que a medida seja avalizada pelo Parlamento. O diagnóstico, feito há mais de um mês pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), de que o Planalto “ainda não tem uma base consistente nem na Câmara nem no Senado”, permanece inalterado. Líder do governo no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) disse em entrevista à ISTOÉ que projetos da importância da nova âncora fiscal ou da Reforma Tributária não podem ser objeto de barganha, mas sim de “debate político”. Fato é que, até agora, argumentos lógicos não têm sido suficientes para aumentar a base de Lula. O governo, aliás, não conta hoje nem mesmo com o apoio de partidos agraciados com postos de primeiro escalão na Esplanada dos Ministérios.

Tem contribuído para minar ainda mais as tentativas de ampliar a frágil base governista no Congresso a crise no União Brasil. O prefeito de Belford Roxo, Wagner Carneiro, deixou o partido de Luciano Bivar rumo ao Republicanos e levou consigo a mulher, Daniela Carneiro, além de seis deputados federais. Daniela é a titular da pasta do Turismo, um dos três ministérios que haviam sido destinados ao União, por sugestão do ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, na tentativa de atrair a legenda para a base governista. Não deu certo: a bancada argumenta que a ministra não foi uma indicação do partido, mas de Lula, já que Waguinho e Daniela foram importantes cabos eleitorais do petista na Baixada Fluminense. Também não seria da cota do União o titular da pasta das Comunicações, Juscelino Filho, indicado por Davi Alcolumbre (União). “Acredito que essa debandada vai alterar a dinâmica da atuação do partido na base”, diz um deputado da legenda. “Lula terá que mostrar se o ministério é do União ou se é do PT, do governo. Se for do União, não abriremos mão de indicar um nome.”
“Indicação de Daniela no ministério do Turismo é do nosso partido” Luciano Bivar, presidente do União Brasil

Partido bolsonarista
Mas se a ida de Daniela Carneiro para a pasta do Turismo não resultou na adesão do União à base de Lula, tampouco deve garantir o apoio do Republicanos. O partido presidido por Marcos Pereira é fortemente identificado com o bolsonarismo — no Senado, conta com a ex-ministra Damares Alves e com o ex- vice-presidente Hamilton Mourão. Também é a legenda do governador de São Paulo, Tarcisio de Freitas, que tem potencial para rivalizar em 2026 com o candidato da coalizão de Lula. “É difícil uma adesão integral à base por questões de identidade mesmo”, diz um parlamentar do Republicanos. “Mas eventualmente podemos votar com o governo, sobretudo os parlamentares do Nordeste que precisam se manter fortes junto às suas bases.” Certo é que nem o debate político defendido por Randolfe Rodrigues nem a distribuição de ministérios têm sido suficientes para adensar a base de Lula no Congresso. E o caminho já começa a passar pela concessão de cargos de segundo e terceiro escalões. Na semana passada, Alexandre Padilha se reuniu com a cúpula do União, que já emplacou nomes na Codevasf, no FNDE e no Dnocs, e agora está de olho no Dnit e no Incra. Na terça-feira, 18, o Republicanos também deu uma piscadela para o governo: atendendo a aliados de Lula, o partido atuou para adiar a instalação da CPMI do 8 de janeiro, demonstrando que, se por ora não quer se comprometer, pelo menos está disposto a dar uma olhada no que o Planalto tem a oferecer.
Além das dificuldades do governo junto aos demais partidos, o próprio PT segue um tanto reticente em relação à nova âncora fiscal proposta pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Os petistas temem que a limitação de investimentos prevista no projeto inviabilize os compromissos firmados por Lula durante a campanha — ele prometeu priorizar programas sociais para os mais pobres. Em outra frente, mas com eventuais impactos na base de apoio de Lula no Congresso, o PT também se movimenta para não perder espaço para partidos de esquerda nas eleições de 2024. Expoente do PSOL, Guilherme Boulos planeja disputar a Prefeitura de São Paulo no ano que vem com o apoio do partido do presidente, de quem é bastante próximo. Mas o secretário de Comunicação do PT, Jilmar Tatto, negou a existência de qualquer acordo nesse sentido, embora o psolista sonhe em disputar o pleito tendo um petista como vice. Coincidência ou não, Boulos afirmou no início da semana ao jornal O Globo que, embora o PSOL seja da base de apoio de Lula no Congresso, o partido tem “ressalvas” em relação ao novo arcabouço fiscal e não prometeu apoio ao projeto. Vai ser longo e árduo o caminho do governo rumo a uma maioria no Congresso.
