Tudo na cor rosa (quanto mais choque melhor), brilho, rabo de cavalo, pelagens, salto alto plataforma, brincos grandes, mini bolsas, croppeds. Esse é o cardápio visual das cenas já veiculadas na imprensa de Barbie, novo filme de uma diretora americana consagrada e declaradamente feminista, Greta Gerwig. No papel da boneca mais famosa do mundo, lançada no mercado nos anos 1960, está Margot Robbie, estrela quente de Hollywood. A seu lado, como o boneco Ken, o namorado da Barbie que também é brinquedo de sucesso, vê-se Ryan Gosling, outro nome estelar no cinema norte-americano.

As aventuras “humanizadas“ de Barbie e Ken levam ao público a força do simbolismo do rosa, que passou por mudanças nas últimas décadas e hoje quer ultrapassar normas de gênero que associavam a cor à fragilidade e futilidade, abraçando a feminilidade como forma de empoderamento e incentivando as pessoas a se expressarem. De certa forma, a presença de Ken é essencial na adesão recente dos homens à moda rosa. Para eles, a tendência se mostra mais criativa, não se limitando ao estilo do namorado famoso e adaptando a cor para estilos streetwear e casual, atraindo figuras como o multicampeão de Fórmula 1 Lewis Hamilton, o rapper Lil Nas X e atores como Brad Pitt e Sebastian Stan, símbolo de virilidade nas telas como o Soldado Invernal, um herói da Marvel.

SUPER-HERÓI Soldado Invernal: Sebastian Stan, astro dos filmes da Marvel, adere ao tom completo em evento parisiense (Crédito:JAMIE MCCARTHY)

Esse universo de moda, o Barbiecore, tem relação direta com a moda colorida do início dos anos 2000, mas também é visto por analistas como reação à pandemia de Covid-19, por exaltar “a alegria de estar vivo e poder ostentar isso”. Cores numa tendência de neon, chamativas e vibrantes, têm espaço junto a muita roupa de vinil, que atrai a atenção por lembrar o plástico original dos bonecos Barbie e Ken. E, claro, rosa, muito rosa.

INFLUÊNCIA DIGITAL A brasileira Ju Romano: blogueira com meio milhão de seguidores aderiu à paleta (Crédito:Divulgação)

Segundo Maíra Zimmermann, historiadora de moda e professora da Faap, o rosa tem um lugar e, como tendência, vai e volta. “Essa questão do que é coisa de menino e de menina começa a se diluir nos anos 1960, com a revolução juvenil. E a própria questão do uso de cores e silhuetas. Não é todo mundo que vai se vestir com a moda mais moderna dos anos 1960. Mas a gente já começa a ter essa inserção, principalmente com atores, celebridades, cantores e cantoras, que começam a trazer a ousadia na roupa.”

Sobre a influência do filme nas ruas, ela traça um equilíbrio entre causa e efeito. “Acho que está rolando há algum tempo esse lance de cores mais fortes, tanto para homem quanto para mulher. Eu prefiro pensar no produto filme como um resultado do que vem acontecendo em relação às transformações de gênero.”

“Eu acho que é muito mais um filme que traz uma brincadeira, uma ironia. Eu acho que isso é uma maneira de a gente poder lidar com a nossa cultura, aquilo que nos constitui, mesmo que inconscientemente”, afirma. “Desde os anos 1960, são três gerações sendo influenciadas por uma boneca. Não são só mulheres, mas também homens.”O uso do rosa por uma maior quantidade de homens é visto pela professora como uma grande resistência. “Acho que talvez seja aquele último clichê que precisa ser derrubado, como marco que virou, e que ainda faz essa barreira entre o que é masculino e o que é feminino.”

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“Tem muita homofobia e o medo de ter a virilidade questionada. Essa ideia da masculinidade é tão frágil que o uso de uma cor faz com que ela possa se diluir”, analisa Maíra. “A questão é essa divisão entre o que é masculino e feminino, que é tão apavorante para os homens, porque as mulheres há muito tempo já romperam.” Sobre a disseminação do rosa na moda masculina, ela vê a influência dos artistas, com ressalva. “O que a cultura de entretenimento tem de poder de convencimento é muito inconsciente. Vai depender das grandes marcas e se lojas de departamento vão oferecer o produto.”

EM CARNE E OSSO A boneca de plástico ganha vida: Margot Robbie é a estrela do filme Barbie, que estreia nos cinemas em 20 de julho (Crédito:Divulgação)

Para Marcio Banfi, styling e professor do curso de Moda da Faculdade Santa Marcelina, “as novas gerações passam pela Barbie de uma maneira diferente em relação a outras épocas. Hoje uma criança fica pouco tempo com um brinquedo físico.” Ele não vê a tendência como algo persistente. “A boneca em si não me incomoda, mas sim essa coisa do ultra rosa, um pouco figurativo, ou até mesmo essa coisa do consumo excessivo. Mas, no mundo, não existe uma tendência que dure tanto. As tendências duram muito menos do que elas já duraram, então não dou muito tempo para a atual onda acabar.”