27/10/2022 - 17:30
Quando completou 65 anos, o ator Paul Newman decidiu escrever sua autobiografia. Havia recebido o primeiro Oscar quatro anos antes, após mais de três décadas de carreira, e achava que finalmente sua trajetória merecia ser eternizada em um livro. Contratou Stewart Stern, autor de Juventude Transviada, filme que catapultou seu amigo James Dean ao estrelato. O roteirista conduziria as entrevistas com o próprio Newman e com as pessoas que ele indicasse, da esposa inseparável, a atriz Joanne Woodward, às personalidades do mundo do cinema, atores e diretores. Fez uma única exigência: que todos fossem sinceros. O projeto sofreu então uma reviravolta inesperada: Newman reuniu as fitas cassete com as gravações das maiores lendas de Hollywood e queimou todo o material.
O astro não sabia, no entanto, que Stern havia transcrito as entrevistas e entregue tudo para Joanne. Trinta anos depois, suas filhas encontraram as transcrições e entraram em contato com o ator e diretor Ethan Hawke para que ele avaliasse se era possível produzir um documentário a partir dos apontamentos. Hawke percebeu que tinha ouro em suas mãos. Bateu de frente, no entanto, com um obstáculo: a pandemia.

Com as filmagens paralisadas, Hawke teve uma ideia brilhante. Enviou o texto para amigos e, ao longo de inúmeras sessões pelo Zoom, pediu que regravassem as entrevistas, interpretando os textos. Dessa maneira, George Clooney fez o papel de Newman, Laura Linney leu as falas de Joanne, Alessandro Nivola interpretou Robert Redford, Bobby Cannavale foi Elia Kazan. Nascia ali não apenas um documentário, mas uma série de seis episódios, com uma hora de duração cada. O que deixou a produção ainda mais original foi a decisão de Hawke de incorporar o processo criativo das leituras por videoconferência ao enredo. Além de narrar o depoimento de Newman, por exemplo, Clooney acrescentou comentários ao texto, trazendo leveza e mostrando que todos ali, além de colegas de profissão, eram fãs do casal homenageado.

O foco principal de The Last Movie Stars (HBOMax) é a vida conjugal e profissional de Newman e Joanne. Sobre a carreira do casal já se conhecia muita coisa: atuaram juntos em produções como O Mercador de Almas e Amor Daquele Jeito, e tiveram grandes sucessos individuais. Além do Oscar por A Cor do Dinheiro, Newman brilhou em clássicos como Gata em Teto de Zinco Quente, Butch Cassidy & Sundance Kid e O Veredito – a lista é longa. Joanne não ficava para trás: atuou ao lado de Marlon Brando em Vidas em Fuga e ganhou o Oscar bem antes do marido, por As Três Faces de Eva, em 1958. Hoje, aos 92 anos, ela vive no estado norte-americano da Geórgia e sofre de Alzheimer.

As informações mais reveladoras estão no campo pessoal. Viveram um caso secreto por quatro anos, antes de Newman se divorciar da mulher, a também atriz Jackie Witte, deixando-a com os três filhos pequenos. Além do amor, que durou cinco décadas, de 1958 até a morte de Newman, em 2008, a relação foi marcada por forte libido. “Joanne me transformou em uma figura sexual”, escreveu Newman. “Deixamos uma trilha de paixão por todos os lugares, hotéis, estúdios de filmagem, carros.” A vida sexual das últimas estrelas de Hollywood era intensa como a dos personagens que eles eternizaram.
Livro revela insegurança do grande astro
Além da série dirigida por Ethan Hawke, as entrevistas feitas por Stewart Stern também ganharam versão em livro. A edição de The Extraordinary Life of an Ordinary Man (foto), dedicada principalmente aos depoimentos de Newman, traça um perfil curioso sobre um dos maiores nomes da história do cinema.
Humilde e inseguro, tinha inveja dos colegas, especialmente de Marlon Brando, que era visto como o melhor ator de sua geração. Ambos frequentavam o Actor’s Studio, curso de atuação em Nova York que revolucionou o cinema.
Newman teve uma carreira gloriosa: foi indicado ao Oscar por dez vezes, tornou-se um filantropo exemplar, criou uma bem sucedida empresa na área de alimentos e pilotou carros de corrida. Mesmo assim, não se achava merecedor do sucesso. Em meio a tantos acertos na vida, nisso ele estava completamente enganado.