Na sexta-feira, 6 de dezembro de 2002, o engenheiro mecânico venezuelano Jacques Giraud Herrera, então com 32 anos, assistiu à morte de seu pai pela TV. Jaime Giraud Rodriguez era químico, professor universitário e protestava na Praça Altamira, em Caracas, contra o governo de Hugo Chávez, que completara três anos no poder. A destruição sistemática das instituições democráticas por parte de Chávez, a miséria crescente levaram a população a greves gerais e manifestações como aquela, para a qual Jacques fora convidado pelo pai e declinara. Tivesse ido, ele talvez fosse alvo do manifestante pró-Chávez que descarregou duas vezes uma pistola contra a multidão matando três e ferindo 29 pessoas. Essa história é o ponto de partida do inferno particular de Jacques e do livro que lança, Super-Resiliente — Transforme as Crises em Oportunidades, onde narra os anos sequentes até que formalizasse a carreira de mentor e coach como cidadão norte-americano.

MÁRTIR Jacques (acima) não pisa na Venezuela desde 2010, oito anos após o pai (abaixo) ser morto em protesto

Nos dias seguintes ao assassinato do pai, Jacques presenciou a transformação dele em mártir, com quase 100 mil pessoas presentes aos velórios dos três mortos. O engenheiro deu uma guinada na carreira e foi para o mercado financeiro. Seus gestores no Banco del Sol, onde trabalhava, eram oposicionistas ao governo e seu caminho bateu de frente com o de Chávez novamente em 2010. O presidente emitiu ordem de prisão contra ele e cinco outros executivos do banco. Jacques fugiu do país para onde não voltou até hoje. “Saí apenas com o que eu estava vestindo no corpo”, diz.

Ele foi para Miami, migrou para o México e voltou aos EUA, onde seguiu procurado até 2014, por “fraude, peculato e operação de câmbio clandestino”. Recebeu oferta para depor contra antigos chefes e recusou. “A Interpol me enviou carta de desculpas afirmando que meu caso era perseguição política e meu asilo estava garantido.” Sob essa condição e tocando carreira de mentor e coach executivo ele permaneceu até 2019, quando virou cidadão americano. “Uma parte de mim escolheu não voltar para a Venezuela”, admite. “Tenho fé de que um dia poderei assistir aos destruidores do meu país pagarem as consequências de seus atos.” Ele se refere ao antigo presidente e ao vice, que assumiu a cadeira desde que Chávez morreu em 2013, Nicolás Maduro. “O poder político é administrado por uma quadrilha de criminosos que são perseguidos internacionalmente, mas, como não saem do país, não correm riscos.”