Aperda do poder de compra, aliada à alta de preços nos mais diferentes setores e, em alguns casos, ao desejo de um consumo mais consciente e sustentável, tem levado consumidores a preferir alugar determinados itens em vez de comprá-los. “Experimentar” se tornou mais valioso do que “possuir” um item. Os mais jovens querem testar produtos e não se importam em pagar um aluguel para isso, uma tendência que começa a pegar também nos consumidores mais velhos, influenciados por seus filhos, sobrinhos ou netos.

A ideia de economia compartilhada começou quase como uma utopia, em meio à crise americana de 2008. Desde então, alastrou-se mundo afora e, hoje, virou uma realidade. O professor de economia da FGV Alberto Ajzental explica que o consumidor está menos preocupado em ter a posse dos bens. “Ele foca mais nas experiências que produtos e serviços podem oferecer.

A tendência já existia, mas deve se consolidar num futuro próximo em função das crises ambiental, climática, financeira, política e de saúde, que se tornam cada vez mais constantes.” Outra vantagem enfatizada pelo especialista é que o consumidor não precisa se preocupar com a desvalorização do produto, manutenção ou posterior processo de venda.

Estudo recente do Sebrae mostrou que o número de novas micro e pequenas empresas no ramo aumentou 25% entre 2018 e 2021 e que itens menos comuns são os mais procurados, como móveis, utensílios e aparelhos eletroeletrônicos de uso doméstico e pessoal, que cresceram 68%. Já os itens de escritório tiveram alta de 32%.

PRATICIDADE Para evitar acúmulo e obter economia, usuários alugam ferramentas para casa e construção (Crédito:Gabriel Reis)

Grandes varejistas também já começam a perceber essa tendência. Exemplo é a rede varejista Magalu, que lançou a VaiVolta, focada na locação de aparelhos domésticos. “O serviço surgiu a partir da demanda de clientes que precisam de diferentes formatos de consumo”, argumenta Robson Santos, gerente de PeD do Magalu.

Até a locação de itens de maternidade e primeira infância, que pesam no bolso de pais e muitas vezes acabam sendo pouco usados, tem ganhado espaço. “No caso dos bebês, isso é especialmente importante, pois eles se desenvolvem muito rápido. Por isso esse aluguel tem tido cada vez mais procura”, afirma Ana Carla Facchinato, proprietária da Baú do Bebê. Os itens mais procurados, segundo ela, são as cadeirinhas eletrônicas, que auxiliam a ninar o bebê e reduzir as cólicas. Mas também há busca por berços portáteis, carrinhos e cadeirinhas de carro.

Com a chegada da pandemia ao Brasil, em 2020, um nicho de aluguel que explodiu foi o de notebooks e celulares, a fim de atender à demanda de quem foi para casa trabalhar. O crescimento da Simpress, que faz esse tipo de locação, comprova esse aumento. Segundo Vittorio Danesi, CEO da empresa, a alta dos aluguéis foi de 40% entre janeiro e julho deste ano, comparado com o mesmo período do ano passado. Diferentemente de outros objetos de locação, esses itens não são contratados para eventos pontuais.

“Atingimos no ano passado o valor de R$ 1 bilhão de faturamento”, diz. Para o diretor-superintendente do Sebrae-SP, Marco Vinholi, por se tratar de um mercado ligado à mudança de comportamento do consumidor, e tendo em vista o cenário europeu, em que o aluguel é mais comum, podemos entender que esse é um bom negócio e veio para ficar. “Ainda existe muito a se explorar. Vale a pena prestar atenção, pode ser que exista uma oportunidade para se criar um serviço de locação ou clube de assinatura”.

A Clorent, uma loja online que faz locação de roupas de grandes marcas para o uso do dia a dia, nasceu a partir dessa demanda. “As assinaturas, por aqui, começam em 180 reais mensais por três peças e chegam a 550 reais por aluguel de 12 peças. A escolha é feita online e as entregas ocorrem em casa”, explica Eduarda Ferraz, co-fundadora da companhia. Na ponta do lápis, as assinaturas valem a pena. Por 240 reais, por exemplo, pode-se usar ao longo de um mês um blazer Versace, que custa na loja R$ 2.500. “Além de ter a vantagem de aluguel, nossas clientes podem ousar novos estilos sem medo de gastar e não gostar”, acrescenta a empresária. Já para homens, essa tendência de moda compartilhada ainda não pegou.

O que tem mais saída para esse público é a locação de ferramentas. Fundada em 1993, a rede Casa do Construtor, por exemplo, aluga desde andaimes e betoneiras até uma simples furadeira. Mais recentemente, foi acrescentada à lista de opções uma extratora para limpeza de estofados e carpetes. “Esse é um fenômeno que veio para ficar”, garante Altino Cristofoletti Junior, CEO da Casa do Construtor.