22/12/2022 - 9:30
Na cultura – Milton Nascimento
Milton Nascimento é carioca de nascimento, mas mineiro de coração. Nasceu em uma comunidade na Tijuca, zona norte do Rio de Janeiro. Sua mãe, Maria, morreu de tuberculose quando ele tinha dois anos. Adotado, ganhou o apelido de Bituca (por fazer bico quando contrariado) e foi morar na cidade mineira de Três Pontas. Além de ser amado pelos brasileiros, é um dos artistas nacionais mais reverenciados no exterior. Já gravou com Quincy Jones, Paul Simon e Peter Gabriel, entre outros. Sua primeira canção de sucesso, Travessia, de 1967, foi gravada pela cantora de jazz Sarah Vaugh, uma das vozes mais belas de todos os tempos. Milton fundou o Clube da Esquina, grupo que revolucionou a MPB nos anos 1970. Gravou mais de quarenta discos, venceu cinco prêmios Grammy e recebeu o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade de Berklee, nos EUA. Mas o maior reconhecimento veio mesmo do público, apaixonado por seu talento há seis décadas.
Entre as inúmeras imagens que marcaram o ano na área da cultura, nenhuma foi tão emocionante quanto a de Milton Nascimento no Estádio do Mineirão, em Belo Horizonte, em 13 de novembro de 2022. A noite histórica marcou a conclusão da extensa turnê A Última Sessão de Música, que contou com 35 shows no Brasil, EUA e Europa. Com a mobilidade reduzida devido a problemas de saúde, o cantor e compositor se apresentou sentado em um trono – o que acabou se tornando uma metáfora involuntária para a coroação de sua majestade artística. Sereno, magnânimo e vestido como um rei, Milton assistiu emocionado a milhares de pessoas cantarem seus maiores sucessos enquanto levantavam placas com a mensagem “obrigado, Bituca”, referência carinhosa ao seu apelido de infância. Milton respondeu com a inigualável voz que encanta o mundo há seis décadas – e também com lágrimas, chorando em diversos momentos.
Em entrevista à ISTOÉ, o artista descreveu a sensação. “Tudo que aconteceu ali, diante do carinho daquelas 60 mil pessoas, superou qualquer sonho. Posso dizer que foi a emoção máxima que já senti em cima do palco. Até agora a ficha ainda não caiu”, afirmou. O artista, que dedicou o show à amiga Gal Costa, que morrera poucos dias antes, falou ainda sobre o sentimento que o tomou no camarim após o evento que celebrou a despedida das apresentações ao vivo : “Fiquei muito emocionado com o carinho com que fomos recebidos em todos os lugares. A energia com que cada cidade me acolheu vai ficar marcada para sempre na minha alma. Quando desci do palco, após o acorde final, vi passar um filme de todos esses anos de estrada. Minha vontade era abraçar cada uma daquelas pessoas e agradecer”.
Entre os momentos inesquecíveis estava o reencontro com Wagner Tiso, Lô Borges, Toninho Horta e Beto Guedes, trupe que ficou conhecida como o lendário Clube da Esquina. O vocalista e guitarrista do Skank, Samuel Rosa, representou a nova geração. Em um texto publicado no dia seguinte, dirigiu-se aos torcedores dos maiores times de futebol de Minas Gerais: “Que me desculpem o Cruzeiro, Atlético e América, todos os grandes craques e artistas que passaram por aqui, mas ontem o Mineirão teve a noite mais gloriosa de sua história”. O deslumbrante repertório da noite incluiu Canção da América, Coração de Estudante, Travessia e Maria Maria, entre tantos outros sucessos.
A homenagem a Milton Nascimento, que foi transmitida ao vivo pelo streaming da Globoplay, marcou um dos períodos mais marcantes de sua carreira e se encerra com chave de ouro, com a escolha de seu nome como “Brasileiro do Ano” na área da cultura – uma decisão unânime da redação de ISTOÉ. “Foi sem dúvida o ano mais emocionante da minha vida. Tudo aquilo com que eu sonhei tempos atrás aconteceu. Mas, como eu disse, me despeço dos palcos, da música jamais. Por isso, muitas coisas ainda estão por vir.”
“Foi sem dúvida o ano mais emocionante da minha vida. Tudo aquilo com que eu sonhei tempos atrás aconteceu. Mas, como eu disse, me despeço dos palcos, da música jamais. Muitas coisas ainda estão por vir”
Aos 80 anos, Milton Nascimento não compôs álbum novo nesse ano, mas encontrou energia e tempo para investir em outra novidade: o lançamento de sua própria NFT. Foram colocados à venda 400 arquivos de arte digital criptografada com o desenho da “Serra das Três Pontas”, cena das montanhas mineiras feita pelo próprio artista. A imagem estampou a capa do disco Geraes, de 1976. A comercialização dos NFTs permitiu que os fãs vivessem uma série de experiências exclusivas, como acesso ao primeiro show da turnê, na Cidade das Artes, no Rio de Janeiro, além de coquetel e brindes. Outra inovação foi a parceria com a fábrica de brinquedos Estrela, que deu origem a um produto personalizado: uma edição especial da linha de trens de brinquedo Ferrorama.
Para o ano que vem, Milton Nascimento guarda uma mensagem positiva. “Espero que 2023 venha como um ano maravilhoso para o Brasil, e que seja repleto de sonhos, amor, juventude e, principalmente, esperança.”