AFINIDADE Bolsonaro cumprimenta o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, no lançamento do Casa Verde e Amarela: Guedes não estava lá (Crédito:Marcos Corrêa/PR)

O “Posto Ipiranga”está sem combustível, já não tem todas as respostas que o chefe precisa. Em outras palavras, os tempos do ministro da Economia, Paulo Guedes, no governo de Jair Bolsonaro parecem estar se esgotando. Sua insistência no respeito intransigente ao teto de gastos e na limitação das despesas, corroeu seu prestígio junto ao presidente. De olho nas próximas eleições, Bolsonaro não quer saber de impedimentos para suas maquinações políticas e aposta em programas sociais parrudos e em obras no Norte e Nordeste para aumentar sua popularidade entre os mais pobres. Com isso, Guedes virou um estorvo. A situação está tão ruim que o ministro nem compareceu ao lançamento, terça-feira 25, do novo programa habitacional Casa Verde e Amarela, sucessor do Minha Casa, Minha Vida – quem protagonizou o evento foi outro ministro, o do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho. Além disso, seu projeto de renda mínima, o Renda Brasil, que deveria ter sido lançado no mesmo dia, foi recusado por Bolsonaro por não atender às suas expectativas. Guedes foi desautorizado publicamente em um assunto econômico.

O Renda Brasil vai entrar no embalo do auxílio emergencial da pandemia. É com ele e com o Casa Verde e Amarela que Bolsonaro pretende se reeleger em 2022. Guedes queria estabelecer uma renda mensal de R$ 250 para os beneficiários e Bolsonaro quer que atinja R$ 300 – o Bolsa Família, que será substituído, paga, em média, R$ 190. O ministro também pretendia cortar outros programas sociais para conseguir caixa, como o abono salarial do PIS, o seguro-defeso (pago ao pescador artesanal) e o Farmácia Popular. O presidente não pretende cortar benefícios existentes. Em declarações dadas em uma viagem à Ipatinga (MG), ele se mostrou especialmente incomodado com a intenção do ministro de usar o dinheiro destinado ao abono salarial para garantir o pagamento do novo programa. O abono beneficia 23,2 milhões de trabalhadores e custará R$ 18,3 bilhões neste ano. “Não posso tirar de pobre para dar para paupérrimos, não podemos fazer isso aí. Como a questão do abono salarial, para quem tem até dois salários mínimos. Seria um 14º. Não podemos tirar de 12 milhões de famílias para dar para o Bolsa Família, ou Renda Brasil, seja qual for o nome deste programa”, disse Bolsonaro. Ele deu três dias de prazo para Guedes apresentar uma nova proposta que chegue em R$ 300 e não passe pela revisão do abono ou pela retirada de qualquer benefício.

“É assim mesmo. Ele é o presidente e é quem decide” Paulo Guedes, ministro da Economia

Conflito de ideias

“É assim mesmo. Ele é o presidente e é quem decide”, disse um resignado ministro, depois que seu projeto de renda mínima foi defenestrado. “A economia é o cara que faz o papel do mau e a política, o cara que faz o papel do bem”. Há um evidente conflito entre as ideias liberais de Guedes e o projeto populista de Bolsonaro, sempre de olho nas eleições e querendo melhorar sua reputação entre os mais pobres. Existe uma contradição de origem entre os dois. Enquanto Bolsonaro é essencialmente estatista, Guedes sonha com um Estado mínimo. Outra diferença diz respeito ao funcionalismo público. Enquanto o ministro detesta os servidores em geral e chegou a chamá-los de “parasitas”, Bolsonaro serviu fielmente a esse público durante toda sua carreira. A negativa presidencial à proposta de renda mínima de Guedes teve efeitos no mercado, causando uma queda imediata no Ibovespa de 1,53% e um aumento de 1,54% no dólar comercial.

Há quinze dias, Guedes afirmou que os auxiliares que aconselham Bolsonaro a elevar o teto de gastos o estão levando para uma área altamente perigosa. “Os conselheiros do presidente que o estão aconselhando a pular a cerca e furar o teto vão levá-lo para uma zona sombria, uma zona de impeachment, de irresponsabilidade fiscal”, disse. Para Bolsonaro agora, esse não é o problema. O importante é conquistar as massas. Em vez de se preocupar com a “zona de impeachment”, ele tem se queixado com interlocutores sobre a inflexibilidade e intransigência de Guedes em relação ao uso dos recursos orçamentários. Na avaliação do presidente, há uma falta de sintonia entre a política econômica e o projeto do governo. Surfando no aumento de popularidade detectado pelas últimas pesquisas, Bolsonaro espera que Guedes diminua sua resistência à elevação dos gastos públicos, considerando especialmente os programas sociais. Ele quer que Guedes pense como o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, que relativiza o discurso de austeridade orçamentária e defende a ampliação dos gastos para acelerar a recuperação da economia. Marinho, inclusive, já aparece na lista de possíveis substitutos de Guedes.

Com os programas Renda Brasil e Casa Verde e Amarela, copiados do PT, Bolsonaro espera ganhar popularidade e se reeleger em 2022