ANDRÉ PORTO/AG. ISTOÉ

CLÁSSICO O brigadeiro de colher, antes caseiro, hoje pode ser encontrado em doçarias

Aquele cheiro familiar e o sabor conhecido aguçam lembranças antigas. Pode ser o bolo da casa da avó, a macarronada dos almoços de domingo ou o doce servido em datas especiais. O importante é a memória afetiva. A comfort food – numa tradução livre algo como comida emocional – desperta sensações agradáveis e evoca o prazer e o bem-estar ligado à infância, à história de vida. É uma tendência forte lá fora que começa a se popularizar no Brasil, num contraponto à praticidade do fast food e à racionalidade dos alimentos funcionais, nos quais os benefícios à saúde são o chamariz.

O brigadeiro de colher e o bolinho de arroz, partes da história de nove entre cada dez brasileiros, são exemplos de comfort food que antes só existiam em casa e hoje podem ser consumidos em qualquer lugar.


VISUAL O restaurante Miam Miam, no Rio: comida sem invencionices e ambiente aconchegante

“Os botecos, sobretudo, entraram muito forte nesta tendência ao resgatar iguarias como tapioca, bolinho de carne seca, entre outros”, diz Elis Cavalcanti, consultora na área de alimentação da Idéias e Tendências, que oferece cursos de comfort food. “É a comida para a alma. Quando desenvolvemos um cardápio baseado neste conceito, o objetivo é provocar sensações boas através do binômio sabor- sentimento.”

A indústria já descobriu este filão. A gigante Coca-Cola acaba de lançar um suco de laranja com este apelo. Até no nome o produto parece querer fazer as pessoas esquecerem de que se trata de néctar pronto. O “laranja caseira” vem com gominhos, como os sucos feitos em casa, e a embalagem diz: “Feito com carinho”. Tudo para fisgar o consumidor pela emoção. Nos Estados Unidos, onde nasceu o conceito de comfort food, existem sucos prontos com nenhum gomo, com algum gomo ou com muito gomo. O objetivo é atender a todos os paladares.

O restaurante carioca Miam Miam, aberto há dois anos, intitula-se de comfort food. A chef Roberta Ciasco utiliza produtos simples que, combinados, ganham um toque moderninho. Nesta tendência, também vale revisitar pratos do passado, utilizando técnicas ou ingredientes novos. O conforto do leve filé de peixe com ratatuille de legumes servido no restaurante está na farofa de pão e no purê de banana da terra que o acompanham. “Quem vem aqui não quer uma experiência gastronômica”, diz ela. “Tem dias que a pessoa quer sair para comer uma comida normal.” O conceito é aplicado na apresentação dos pratos, que é caprichada, mas os elementos continuam reconhecíveis, e também na decoração. O restaurante fica numa casa e as pessoas podem escolher jantar na “sala de estar” em poltronas com mesinhas de apoio ou na “copa” em mesas de fórmica antigas.

NOVIDADE Néctar de laranja lançado pela Coca-Cola: gomos para lembrar o suco feito na hora

A ambientação é uma importante aliada para vender a idéia de comfort food. A rede de doces Amor aos Pedaços iniciou no ano passado a reforma de todas as suas lojas. “Fizemos uma pesquisa e vimos que o consumidor não sentia falta de nenhum produto, mas queria mais conforto”, diz Ana Maura Werner, diretora de marketing da doçaria que surgiu no final dos anos 80, época do boom dos fast food e das praças de alimentação dos shoppings. Hoje, 20 das 42 lojas têm um visual mais aconchegante, com poltronas, cadeiras confortáveis, revisteiro. O investimento compensa: as unidades reformadas apresentam um crescimento de vendas entre 15% e 20%. Afinal, quer prazer maior do que comer um brigadeiro de colher confortavelmente sentado?