Um estudo publicado na revista científica Nature confirmou que a costa oriental da África já integrava o comércio global pré-Vasco da Gama. Liderada pelo antropólogo Chapurukha Kusimba, da Universidade do Sul da Flórida, e o geneticista David Reich, de Harvard, a pesquisa analisou 80 indivíduos mortos entre 1200 e 1800 na Costa Suaíli, que abriga trechos de Quênia, Tanzânia, República Democrática do Congo, Uganda e Moçambique. Nos corpos antigos, foram encontrados resquícios genéticos de persas, árabes e indianos, que teriam aportado por ali no século VII, à procura de riquezas como marfim, ouro, chifres e âmbar.

Segundo Tábita Hünemeier, professora da USP, especialista em Genética de Populações Humanas, a recuperação genética em fósseis se dá por meio de ossos e dentes: “Como o DNA está muito fragmentado, são usadas técnicas de laboratório e análises de bioinformática para evitar contaminação e melhorar a robustez da informação”. Mas a Paleogenética é uma das ferramentas para desvendar a História: “É necessário contextualizar os achados com informações históricas, arqueológicas e culturais”.

A questão da herança vai além: mais de 80% dos indivíduos carregavam um cromossomo Y (usualmente transmitido pelo pai) do Oriente Médio e mais de 95% tinham DNA mitocondrial (de origem materna) africano. A civilização teria se formado pela união, forçada ou não, de homens asiáticos e mulheres africanas. Elder Al Kondari Messora, professor de História do Colégio Presbiteriano Mackenzie, cita o caráter matriarcal das sociedades e a busca por ascensão social dos viajantes, para justificar os casamentos: “O poder político e econômico normalmente estava com as mulheres. Seria muito plausível que persas, árabes e indianos se casassem com integrantes da elite africana, adotando costumes locais”.

MATRIARCADO Elder Messora: análise social feita pelo DNA (Crédito:Divulgação)

A formação civilizatória local pode ter mais relação com o Brasil do que se pensa. Isso porque muitos escravizados do País eram provenientes da área. Messora dá um exemplo, com base nos testes de genética que taestão na moda. “Por que tenho parte da genética de Omã, na Península Arábica? Pode ser justamente dessa miscigenação no território Suaíli e da herança dos escravizados.”