04/11/2022 - 9:30
Apartir de 1.º de janeiro, Lula pegará um País bem diferente do que recebeu em seus mandatos anteriores. “O presidente eleito vai enfrentar talvez o quadriênio mais complexo e difícil desde a redemocratização”, alerta Maílson da Nóbrega, economista e ministro da Fazenda durante o governo de José Sarney. Além de uma oposição mais aguerrida e de um rombo orçamentário deixado pela atual administração, pesa um cenário externo adverso.
Lula precisará remar contra a corrente para colocar de pé suas propostas econômicas audaciosas de campanha e encontrar um modo de reduzir a pobreza e a desigualdade. Também terá que lidar com problemas imediatos, como a desorganização do Estado, resultado do desmonte das políticas públicas nos últimos quatro anos. Na frente externa, terá de lidar com a crise instaurada pela invasão da Ucrânia e pela guerra comercial entre EUA e China. “Lula encontrará um ambiente internacional desfavorável, contas públicas em desordem, consequência dos desatinos do governo Bolsonaro, e um potencial de crescimento menor da economia brasileira, que está prisioneira a armadilha do baixo crescimento”, diz Maílson.

Para o economista-chefe da MB Associados e pesquisador do IEA-USP Sérgio Vale, são vários os desafios econômicos para 2023 e o primeiro é a questão fiscal. “A gente tem aí uma promessa de expansão de gastos sociais, manutenção do auxílio Brasil, isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil, entre outros benefícios que vão pressionar os gastos”, explica. Outro fator que, segundo ele, contribuirá com o desafio econômico inicial é a queda de receitas que já são esperadas, por conta de um crescimento menor do PIB. “Em 2023, o mundo vai crescer menos e a Europa tem expectativa de recessão. Estados Unidos e China crescem menos e são importantes parceiros comerciais para o Brasil. Então, nesse cenário, a parte fiscal é um grande desafio para o próximo governo.”
A bomba fiscal, de acordo com a consultoria Tendências, pode somar R$ 280,3 bilhões. As medidas que foram propostas ao longo da campanha não cabem no teto de gastos. Será difícil fazer a conta fechar. Para o próximo ano, as previsões para o crescimento da economia estão próximas de 0,5%, a inflação tende a ceder e a expectativa de uma recessão global deve contribuir para um preço mais baixo das commodities. Pode haver uma aceleração na alta dos preços no início do novo governo. Essa inflação seria puxada pelo fim do teto do ICMS que incide sobre combustíveis e energia, medida válida até dezembro deste ano, para conter a escalada dos preços.
O combate à pobreza, que aumentou na pandemia, será prioridade do governo Lula. Grande parte do investimento deve ser feito em programas de transferência de renda, como o Auxílio Brasil, que vai voltar a se chamar Bolsa Família. A equipe também quer garantir recursos para dar aumento real ao salário mínimo, zerar as filas do SUS, recompor programas como o Farmácia Popular, assegurar o funcionamento dos centros que fazem o cadastro da população para programas sociais e retomar obras estruturantes. “Acho que haverá ganhos importantes em relação à reforma tributária: tem a PEC 45, a PEC 110, penso que há vontade do Congresso e do governo em seguir com essa reforma. Acredito que isso aconteça já no primeiro semestre”, diz Joelson Sampaio, professor de economia da FGV EESP.

Reforma tributária
Uma boa sinalização em relação à disposição para fazer a Reforma Tributária é a provável indicação de Bernard Appy para a nova equipe. Diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), Appy é coautor da PEC 45. Outra boa sinalização para a composição de uma equipe de alto nível é a provável nomeação do atual secretário da Fazenda de São Paulo, Felipe Salto, para secretário do Tesouro Nacional.
Para os especialistas, o cenário desafiador exigirá muita vontade política e capacidade da equipe. Henrique Meirelles, que esteve ativo durante todo o segundo turno da campanha de Lula, é cotado para esse time. “Devemos esperar um governo com responsabilidade social e fiscal”, afirma Meirelles, que completa enumerando os principais desafios para esse primeiro ano de governo. “Os principais desafios serão corrigir as distorções orçamentárias, assegurar fontes de financiamento sustentáveis para os programas sociais e fazer as reformas de aumento de produtividade da economia, visando a aumentar a criação de emprego e renda”, resume.