Rishi Sunak senta na cadeira de primeiro-ministro em meio a uma das mais profundas crises da história do Reino Unido. O que os súditos querem saber é: como esse bilionário, que tem um patrimônio maior do que o rei Charles III, vai tratar a população, emparedada entre o alto custo de vida e a insegurança social? O premiê diz que sua meta será conseguir “estabilidade econômica e confiança no governo”, por meio de “decisões difíceis” que baixem a inflação recorde e a dívida pública.

Como ex-ministro das Finanças, ele tem crédito dos investidores e mesmo de 68% dos britânicos, que confiam em sua competência, segundo a agência de pesquisas YouGov. Mas os desafios são grandes: 62% exigem a baixa no custo de vida. Responsável pelas finanças do país na pior fase da pandemia, Sunak liberou fundos para UTIs, equipamentos e vacinas. Era o que tinha a fazer. Mas a dívida pública, que já era alta, subiu mais ainda.

Com a guerra na Ucrânia, a crise virou uma tempestade. O ex-primeiro-ministro Boris Johnson caiu e foi substituído por Liz Truss, que ficou apenas um mês e meio no cargo. Ameaçado de implosão, o Partido Conservador decidiu por Sunak, 42 anos, em apenas um fim de semana.

CASA NO CAMPO Mansão georgiana em North Yorkshire, com lago particular, e onde apenas a piscina custou R$ 2,5 milhões

Foi assim que os britânicos chegaram à inusitada situação de contar com um primeiro-ministro mais rico que o rei –ainda que boa parte da fortuna venha da mulher Akshata Mutry, herdeira da Infosys, líder global de software. O patrimônio do casal é de 730 milhões de libras, ou 4,5 bilhões de reais, enquanto o “pobre” rei conta com apenas 435 milhões de libras em ativos pessoais, nos cálculos da revista Forbes.

REI E SÚDITO No Palácio de Buckingham, Charles III, recém-empossado, recebe Rishi Sunak para sua primeira transmissão do cargo de premiê (Crédito:Aaron Chown)

Sunak nasceu em Southampton, onde os avós aportaram, depois de emigrar de Punjab, na Índia. O pai foi clínico geral do respeitado serviço público de saúde, o NHS, e a mãe tinha uma farmácia. Sunak estudou em Oxford e fez MBA em Stanford, na Califórnia (onde conheceu a mulher, com quem tem as filhas Anoushka e Krishna). Tornou-se sócio de uma empresa de investimentos com atuação entre o Vale do Silício e Bangalore, na Índia.

Entre cruz e espada

Praticante do hinduísmo – e ainda de críquete e futebol –, Sunak e família irão morar na residência oficial da Downing Street. Mas mantêm o apartamento para visitas e a casa comprada em 2010 por cerca de R$ 28 milhões em Kensigton, sofisticado bairro de Londres; a mansão georgiana em North Yorkshire, com lago particular; e uma cobertura na Califórnia. O político havia sido eleito para o Parlamento em 2015 e reeleito em 2017 e 2019, pelo Partido Conservador. A defesa do Brexit lhe valeu o posto de ministro das Finanças, em 2020, quando começou a se projetar até chegar ao posto mais cobiçado da política britânica.

Para a economista Natalie Verndl, o Partido Conservador está rachado entre fiscalistas, que defendem a austeridade fiscal, e os que querem uma política mais populista. “A Liz Truss partiu para o corte de impostos dos mais ricos, mirando crescimento econômico, mas sem oferecer contrapartida, o que provocou forte reação dos mercados.

“Em tempos difíceis, protegerei os mais vulneráveis. Fizemos isso na Covid e faremos novamente” Rishi Sunak, primeiro-ministro britânico

A libra esterlina derreteu – o que, para os britânicos é um choque, da mesma forma que a inflação de dois dígitos aterroriza”, analisa. Sunak terá de equilibrar austeridade fiscal e cortes em benefícios sociais. Precisa de estabilidade, com manutenção das taxas de juros, controle da inflação (em 10,1%) e redução da dívida pública, explica a especialista. “Os juros devem bater acima de 5%, condição inaceitável para eles, enquanto o PIB tem previsão de queda em 2023.”

O professor António Costa Pinto, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, coloca o Brexit na raiz da crise. “A economia piorou muito com a saída da União Europeia. Trocas comerciais caíram 30% e não foram substituídas, como os conservadores esperavam, por alianças nos EUA e na Ásia”.

Por isso, o cientista político avalia que o novo primeiro-ministro fará uma “gestão de emergência”, onde o fundamental será a união política do governo. “Ele depende muito do partido. E os conservadores têm nele sua última chance, porque não passam de 20% nas intenções de voto. Se ele não se portar bem, nas eleições de 2025 o Partido Conservador será varrido do Parlamento. E por longos anos.”