“É praticamente impossível passar despercebida a influência da nossa cultura na moda nesse momento”, diz o rapper paulistano Rashid. O hip-hop, que surgiu no Bronx em 1973, comemora meio século de vida, assim como a moda originária do gênero musical. Roupas oversized, tops com recortes, tênis brancos, bonés de aba reta, estampas de logomarcas e jaquetas bomber fazem parte dos elementos que vêm ganhando outros grupos e até a alta costura no decorrer dos anos. Enquanto músicos nacionais lançam linhas de roupas próprias, Balenciaga e Louis Vuitton apostam na calça cargo para a próxima estação, o bucket hat volta a compor o streetwear, e grandes joias de ouro ganham coleções de famosos designers.

Falar de moda hip-hop fora da periferia é delicado, e passa por temas como representatividade, protagonismo e apropriação cultural. Somado ao visual, ela é usada para expressar uma postura, além de um descontentamento. “’Eu não me encaixo naquilo que vocês querem que eu seja’”, diz Rashid. Muito antes de compor catálogos de grifes e influenciar renomados estilistas, a estética nasceu para atender as necessidades da base. “Os casacos precisam ser resistentes e proteger do frio, o tênis precisa de um dinamismo, para dançar e grafitar”, pontua Andreza Delgado, diretora criativa e fundadora da PerifaCon. Sem esquecer a beleza e a autoestima. “A gente tem nosso estilo, e vai estar lindo e elegante onde quer que esteja. A moda hip-hop comunica o momento, talvez até o status da carreira, para quem gosta de ostentar”, continua Rashid. As referências estão por toda a parte, embora alguns insistam em apagá-las: nos grafites e no break dançado nas ruas, nas principais atrações dos festivais, nos podcasts, na rádio e nas páginas das revistas. “Acho que a presença massiva dos representantes do hip-hop acaba fazendo com que essa influência seja espalhada”, fala o músico que esbanja tanto estilo quanto os colegas Mano Brown e Post Malone. “Eu só acho negativo quando essa relevância nos é negada”.

GPS DA TENDÊNCIA Representatividade: Rashid é embaixador da marca Adidas e dono da Foco na Missão (Crédito:Divulgação)
CONFORTO Parceria de anos: coleções da Converse levam assinatura de Tyler, The Creator Parceria de anos: coleções da Converse levam assinatura de Tyler, The Creator (Crédito:Divulgação)

Protagonismo rapper

Nos últimos anos, não só itens de tendência ganharam as passarelas, mas também os protagonistas dessa história. “A partir do momento em que astros do hip-hop começam a estar em espaços antes jamais imaginados, o mundo começa a olhar seus elementos de outra forma e isso auxilia na valorização da cultura de rua”, fala Julliana Terra, editora de moda, especialista em comunicação de moda, tendências e semanas de moda, e criadora do Blog Julli Terra. Sem abandonar a base, Rashid acha importante a tomada destes lugares, e o objetivo vai além da representatividade: “A gente acaba levando essa verdade, e estendendo nossos braços culturais e financeiros também”. É a economia criativa, como lembra Andreza: “É muito importante você ter figuras públicas investindo nesse código de vestimenta e fazendo girar o dinheiro entre quem promove essa cultura”. Para Rashid, a disseminação entre outras realidades é incontrolável, à medida que seus códigos passam a se fundir com outros símbolos da identidade nacional: “Estamos interferindo diretamente na estética e no visual brasileiro, que vem misturando essa influência mais urbana com a pegada tropical”. Ele ainda lembra sobre a importância de Pharrell Williams e do cancelado Kanye West na propulsão da moda hip-hop para o mundo: “Se em algum momento as calças diminuíram e as roupas passaram a ser mais coloridas, e passou a ser permitido sorrir também, eles são os grandes responsáveis”.

DE LUXO Além da rua: calça cargo volta em looks sofisticados, e maxi joias compõem nova linha da Hector Albertazzi (Crédito:Divulgação)

Em um universo ainda muito masculinizado, a mudança tem caráter mais gradual para o gênero feminino: “Por muito tempo, as mulheres não se sentiam à vontade para usar peças que mostrassem o corpo. Hoje, elas estão mais livres para escolher como querem se vestir: calça cintura alta com salto ou tênis, cropped ou camiseta”, diz a rapper, cantora e compositora Drik Barbosa, que se inspirou nas antecessoras para compor sua imagem e espera ser referência para as profissionais do futuro. Hoje, ela possui uma linha própria na Lab Fantasma, de Emicida.

Um astro pop na Louis Vuitton

O rapper Pharrell Williams é o novo diretor criativo masculino da Louis Vuitton. O norte-americano foi embaixador da Chanel por nove anos e é conhecido pelos looks polêmicos, tendo combinado smoking e bermudas em plena festa do Oscar. O primeiro desfile assinado por ele será em junho, em Paris.