Não há nada mais improvável na televisão brasileira do que o repentino sucesso da TV Senado. Criado em fevereiro de 1996 para exibir aqueles enfadonhos discursos repletos de réplicas e tréplicas entabulados por senhores e senhoras que se dirigem um ao outro por Vossa Excelência – mesmo sendo furiosos desafetos – ainda assim o canal passou a ser sintonizado por milhares de brasileiros. O interesse, é óbvio, foi despertado pela crise provocada pelos senadores Antônio Carlos Magalhães, José Roberto Arruda e a ex-diretora do Prodasen, Regina Célia Borges, desmascarados em atitudes bem mais que suspeitas a partir da publicação por ISTOÉ da fita do procurador Luiz Francisco de Souza. As investigações em torno deles, cujo ápice foi a imperdível acareação de 7h15 de duração, atraíram a atenção do público. As pessoas passaram a sintonizar o canal, cuja missão é divulgar, 24 horas por dia e sem nenhuma opinião, os acontecimentos do Senado. Restrito a quem tem tevê por assinatura, cerca de 40% do que exibe é ao vivo.

Antes de adquirir visibilidade, a TV Senado, como outros canais ligados ao Legislativo, registravam audiência próximo a zero. Pego de surpresa, Antonio Ricardo Alves Ferreira, diretor de divisão de audiência do Ibope, apenas intui o óbvio aumento da procura pela emissora. Até porque ele mesmo acompanhou a tal acareação, acontecida no dia 3. “Aquilo funciona como um julgamento, igual àqueles dos filmes americanos”, diz Ferreira. O jornalista e crítico de tevê Gabriel Priolli nota uma certa crueldade por trás de tanto interesse. “Nada mais divertido que um político em apuros”, opina. Segundo o crítico, a repentina atenção despertada pela TV Senado coloca por terra a idéia de que as pessoas só gostam de entretenimento rasteiro. “O canal tem um formato chato, mas o conteúdo é importante. O público assiste.”

Segundo Aluizio Oliveira, diretor do canal, a presença das três câmeras da tevê no plenário mudou o comportamento dos senadores. “Quando começaram a perceber a repercussão, passaram a falar olhando para a câmera e a acentuar suas falas”. Outros até largaram o cigarro depois que espectadores reclamaram do mau exemplo. Só não abandonaram os celulares, cujos ruídos interferem na transmissão.

As intrigas reais mostradas pela TV Senado chegaram até a novela das oito da Rede Globo, Porto dos Milagres. Não por coincidência, Victório (Lima Duarte) vive na trama um certo senador baiano que enfrenta momentos delicados por ter feito revelações perigosas, gravadas como instrumento de chantagem pelo político Félix Guerreiro (Antonio Fagundes). O co-autor do folhetim, Ricardo Linhares, diz que Victório, ao contrário do que possa parecer, “não foi calcado em nenhum político específico”. Confirma, porém, que se inspirou mesmo nas gravações feitas pelo procurador Luiz Francisco de Souza para incluir na trama a situação do gravador escondido.