09/08/2006 - 10:00
Eles ameaçam 20 dos 187 quilômetros do litoral pernambucano. Só neste ano, ali, os tubarões fizeram quatro vítimas, duas delas fatais. De 1992 até hoje, o “terror dos mares” protagonizou oficialmente 50 ataques, deixando 19 mortos, 31 mutilados e uma onda de medo que atinge os surfistas e, principalmente, os banhistas. A média de três a quatro ataques por ano na área metropolitana do Recife colocou Pernambuco em estado de alerta. A mordida dilacerante do animal atingiu os cofres do Estado, que já contabilizam prejuízos ao turismo, sangrando desde a hotelaria até as atividades de mergulho e de esportes náuticos. O fato de ser um dos locais com os maiores índices de mortes do mundo, entre as vítimas de ataques (38%), também contribuiu para aumentar a imagem negativa da região.
Para mudar essa maré pessimista, o Comitê Estadual de Monitoramento aos Incidentes de Tubarão (Cemit) atua em quatro frentes: pesquisa e monitoramento; educação ambiental; vigilância e fiscalização; e recuperação ambiental. Nas campanhas educativas, universitários têm percorrido escolas de segundo grau para formar monitores voluntários. As autoridades são contrárias à extensão de redes de proteção ao longo da orla marítima, como acontece na África do Sul e na Austrália. “Optamos por espalhar bóias com anzóis especiais para capturar um a um os tubarões”, diz Fábio Hazin, professor da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e presidente do Cemit. Até o final do ano passado, 22 tubarões agressivos foram capturados por este método. Além disso, cartilhas de segurança vão sendo distribuídas com os seguintes mandamentos:
• Nunca entrar em mar aberto com água acima da cintura, principalmente durante a maré alta. O perigo aumenta nas fases de lua nova e cheia e em períodos de águas turvas. Esse conjunto de fatores facilita a aproximação de tubarões (de um a três metros) junto à orla.
• Preferir sempre usufruir das áreas protegidas pelos arrecifes (barreiras de coral) e jamais ultrapassá-las. A topografia marítima da região cria condições favoráveis aos ataques por formar um canal profundo, onde os tubarões costumam nadar. É justamente na borda desses canais que os surfistas esperam pela formação de boas ondas.
• Evitar banhos às 6h e no fim de tarde, horários em que eles se alimentam. Apesar dos esforços do Departamento de Pesca e Aqüicultura da UFRPE, que começou a pesquisar o fenômeno em 1994, Hazin admitiu que o Estado só mergulhou de cabeça para enfrentar o problema em 2004. No entanto, rebate críticas à fiscalização e atendimento às vítimas. Para ele a estrutura, feita pelo Corpo de Bombeiros, é suficiente. São dez postos salva-vidas, cada um com dois homens, distribuídos entre os municípios do Recife (6) Jaboatão (2) e Olinda (2). O monitoramento dessa área é feito com dois jet skis e um bote inflável. “Nossa estrutura é maior do que a da Flórida para o socorro e remoção de vítimas de ataques de tubarão. Em termos de fiscalização, temos duas vezes mais placas de advertência do que a África do Sul”, garante Hazin.
O paradoxo desse fenômeno é que o vilão do medo à beira-mar é uma espécie de porta-voz do meio ambiente. “O tubarão é uma das maiores vítimas da degradação ambiental provocada pelo ser humano”, ressalta o biólogo Otto Gadig, professor da Universidade Estadual Paulista. Para Gadig, a construção do Porto de Suape é a principal causa que levou as praias do Recife a se tornarem áreas de alto risco. Sua construção provocou forte impacto ambiental na região e destruiu o berçário do temido tubarão cabeça-chata. “Essa área foi deslocada para o estuário do Rio Jaboatão, que desemboca nas praias metropolitanas.” Além disso, áreas portuárias são tradicionalmente perigosas. “Eles são atraídos pelo lixo que os navios despejam no mar, apesar de essa prática ser proibida”, completa Hazin.
Outro fator determinante para os ataques são o aumento da população e a pesca de arrasto de camarão com descarte de peixes próximo às áreas de risco. Os técnicos asseguram que a atual situação é controlável. “Não há superpopulação de tubarões. Os 50 ataques certamente não foram cometidos por 50 tubarões”, aposta Gadig. Mesmo assim é preciso estar em alerta. Caso contrário, você poderá ficar nariz com nariz com um deles.