09/08/2002 - 10:00
Lutar contra uma doença requer estratégias de guerra. Às vezes, o principal objetivo é atacar o invasor. Em outros casos, deve-se reforçar as linhas de defesa. E há momentos em que o melhor é contar com a ajuda de outros exércitos para controlar a situação. Quando se trata da esclerose múltipla, enfermidade neurológica que em geral atinge adultos com idade entre 25 e 40 anos, uma das respostas mais eficazes é justamente unir os esforços de diferentes campos da medicina. Isso porque o problema pode afetar áreas distintas do sistema nervoso central, comprometendo diversas funções, a exemplo da visão e da locomoção.
O valor do tratamento multidisciplinar já era reconhecido pelos médicos. “A doença abrange várias formas. Por isso, são envolvidos diversos profissionais, como fisioterapeutas, oftalmologistas, urologistas e psicológos”, explica o neurologista Charles Tilbery, da Santa Casa de São Paulo. Mas o fato é que o lado emocional vem ganhando cada vez mais destaque. Uma pesquisa britânica, apresentada no congresso da Sociedade Européia de Neurologia, realizado no final de junho na Alemanha, mostrou que a depressão dificulta a adesão à fisioterapia, essencial para quem perdeu parte dos movimentos. Segundo o trabalho, o estado depressivo é frequentemente escondido pelo paciente, a menos que o médico pergunte diretamente se ele está com o problema. “A depressão afeta a reabilitação física. Quando a pessoa nessa situação é tratada, ela fica mais propensa a cumprir os exercícios”, afirmou o pesquisador Christopher McGuigan.
Não é difícil entender como a depressão interfere no tratamento.
É comum o portador da enfermidade se sentir abalado ao descobrir
sua condição. A falta de informação a respeito da esclerose múltipla – uma doença sem cura, porém controlável – é a principal razão. A pessoa teme que o diagnóstico seja uma espécie de atestado de incapacidade física e mental. Um “atestado” dado em uma fase de construção da vida familiar e profissional.
A verdade é que, em boa parte dos casos, a vida e o trabalho podem ser tocados normalmente, desde que as medidas de controle – como o uso regular de remédios (entre eles o copaxone e os interferon beta 1a e beta 1b) – sejam seguidas à risca. E isso, esclarecem os especialistas, deve ficar claro desde a descoberta da doença. Na Inglaterra, foram criadas recentemente normas que orientam o médico a transmitir a notícia. “É preciso ter jeito ao dar as informações. Alguns pacientes choram quando lembram da angústia do diagnóstico. E muitas vezes eles têm de lidar também com o medo dos outros”, afirma a psicóloga Dawn Langdon, da Multiple Sclerosis Trust, entidade inglesa de assistência a portadores da enfermidade. Felizmente, a paulistana Carla Domingues, 32 anos, não passou por esse dilema. “Sinto-me bem. Não existe constrangimento para mim”, diz, sorridente. Sua tia, Yvonne Lombardi, conta que a jovem, que utiliza cadeiras de rodas e faz fisioterapia, não se revoltou. “No começo, ela era mais quieta. Mas seu humor melhorou muito quando iniciou o tratamento. Agora, ri bastante”, conta.
Já que cuidar da alma é importante, a Associação Brasileira de Esclerose Múltipla (Abem), em São Paulo, decidiu recentemente incrementar seus serviços e oferecer o auxílio de um psiquiatra. É mais um profissional que se junta aos que compõem a “brigada” médica da entidade, que reúne nutricionistas, psicólogas e outros especialistas. “O paciente pode viver estados emocionais diferentes, que variam do choque à ansiedade. Há casos de depressão, raiva e até hostilidade. Mas nem todos passam por isso”, afirma a superintendente Suely Berner. Há mais novidades. Neste mês, a Abem (www.abem.org.br) muda de sede. Passará a oferecer acupuntura para os pacientes que fazem fisioterapia, caso o conselho médico oficialize o tratamento na casa. Hoje, os especialistas indicam acupunturistas de outros lugares. A técnica ajuda a relaxar a musculatura. “Alguns pacientes apresentam grau severo de contração muscular. Então, recomendo massagem e acupuntura”, diz a fisioterapeuta Daniela Guidetti.
Outra boa notícia é a ampliação do socorro médico. Um desses reforços vem da Casa da Esperança, instituição de Santo André (Grande São Paulo) com especialização em enfermidades neurológicas, entre elas a esclerose múltipla. “Queremos ajudar todos os que nos procurarem”, afirma o diretor clínico Marcelo Annes. O hospital, além de atender pessoas com planos de saúde, está preparado para receber pacientes carentes. Há, inclusive, uma hidroterapia especial. “Ela ajuda a recuperar o paciente. O tratamento não depende apenas de medicamentos”, completa Annes.