A discussão sobre a preservação do mogno, iniciada no começo do mês em Santiago, capital do Chile, terminou na quarta-feira 13, depois de uma tensa votação que garantiu à espécie um maior grau de proteção. A briga foi acirrada. Desde o princípio ficou clara a oposição entre a delegação brasileira, contrária ao aumento na proteção, e os ambientalistas, que defendiam um controle internacional mais rígido para a madeira conhecida como ouro verde por seu
alto valor comercial. Momentos antes
da decisão final, a própria delegação
nacional rachou, deixando evidentes
as divergências de opinião entre o
Itamaraty e o Ministério do Meio Ambiente (MMA).

Na queda de braço, valeu a força do Itamaraty, contrário ao controle mais rigoroso. O resultado final da votação sobre o destino da madeira no mundo, porém, acabou pendendo para o lado dos ecologistas. “Esse é um grande resultado na luta pela preservação”, festejou Paulo Adário, coordenador de Amazônia na ONG Greenpeace. “Apesar de o Brasil ter votado contra, a proteção foi aprovada pela comunidade internacional.”
O debate ocorreu durante a Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas da Fauna e Flora, Cites, que começou no dia 3 e terminou na sexta-feira 15. O encontro chileno reuniu 160 países em torno do debate sobre a proteção de dezenas de animais e plantas em risco de extinção. O Cites, que regulamenta as espécies ameaçadas desde 1975, classifica cada uma delas em três categorias.

O apêndice 3, no qual o mogno estava até a semana retrasada, é o menos rigoroso deles. Para que um produto entre nessa listagem, basta que o país exportador o inclua espontaneamente. Esse mesmo país se compromete a criar recursos para fiscalizar sua extração e comércio. O apêndice 2, para onde o mogno foi transferido, é mais rigoroso. Nele, o mecanismo de controle deve ser feito também por órgãos científicos dos países importadores. E, enfim, há o apêndice 1, onde estão os produtos de comércio proibido, como o pau-brasil. Para que uma espécie passe do apêndice 3 para os demais, é preciso de dois terços de votos a seu favor na convenção internacional, que ocorre a cada dois anos e meio.

A decisão inicial do Ministério do Meio Ambiente era prorrogar a votação sobre o futuro do mogno. O argumento era de que os estudos sobre a espécie no Brasil ainda são inconclusivos. “Precisamos avaliar a situação real do mogno antes de tomar qualquer decisão técnica definitiva”, sustenta o ministro do Meio Ambiente, José Carlos Carvalho. Já o Itamaraty tinha a intenção de manter o mogno no apêndice 3 para não prejudicar as exportações. “Um controle internacional criaria barreiras de comércio, prejudicando iniciativas brasileiras de manejo do mogno”, diz Éverton Vargas, responsável pelo meio ambiente no Itamaraty.

A história recente do mogno no Brasil é conturbada. Em 1996, o governo deu partida a 11 projetos de manejo sustentável na Amazônia. Os planos foram arquivados depois que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) constatou irregularidades em todos eles. O resultado foi uma medida drástica: em outubro de 2001, o governo decretou a proibição total do comércio da madeira, decisão que só deverá ser posta em debate em março de 2003. “Com a moratória que temos hoje, é como se estivéssemos no apêndice zero do Cites. Passar o mogno para o apêndice 2 só torna as coisas mais fáceis”, diz a senadora Marina Silva (PT-AC). “A votação é importante porque traz novo fôlego e vai incentivar os projetos brasileiros de manejo sustentável”, calcula Tasso Rezende de Azevedo, coordenador do Núcleo Amazônico do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora).

Elefantes e baleias – Na discussão em Santiago, não era só o mogno que estava em jogo. Numa das votações mais polêmicas, o Cites aprovou o comércio parcial do marfim extraído dos elefantes da África do Sul, de Botswana e da Namíbia, encerrando um embargo de 13 anos. A norma permite a venda de 30 toneladas de marfim em 2004 e causou revolta entre os ecologistas. A população de elefantes caiu de 1,2 milhão em 1989 para cerca de 600 mil animais hoje. Segundo o secretário-geral do Cites, Willem Wijnstekers, o acordo prevê apenas a comercialização de marfim apreendido ou obtido de animais mortos de causa natural.

Outras decisões vitoriosas para a ecologia foram o aumento da proteção ao cavalo-marinho e a rejeição à nova tentativa do Japão para diminuir o controle sobre a caça e o comércio da carne de baleia. Em duas sessões, os países-membros do Cites mantiveram a proibição de captura das baleias minke e de bryde. “Esse é um passo importante para garantir que as baleias continuem sob um manto de proteção”, disse Vassili Papastavrou, do Fundo Internacional para a Conservação Animal (Ifaw, na sigla em inglês). A próxima rodada de negociações, só em 2005.