17/05/2006 - 10:00
O brasileiro Nelson Freire é um dos melhores pianistas do mundo. É também um dos músicos mais ecléticos, apresentando-se tanto como solista quanto em duo com a sua velha amiga argentina Martha Argerich. Seu talento e ecletismo estão agora amplificados em seu último trabalho, o álbum duplo Brahms – the piano concertos (gravadora Decca). Nele, Freire mostra a sua arte acompanhado pela orquestra alemã Gewandhausorchester, considerada a mais antiga do mundo (foi formada no século XVIII) e regida atualmente pelo maestro italiano Riccardo Chailly. Os encontros de Freire com essa verdadeira instituição da música erudita aconteceram em duas sessões de gravação ao vivo, entre novembro de 2005 e fevereiro deste ano.
Aos 61 anos, o mineiro Nelson Freire reúne as qualidades ideais para tornar sublime as tantas contradições e emaranhados da música de Brahms – de um Brahms perdido nas constantes crises de oscilação de seu humor, quadros depressivos e perda da auto-estima a cada crítica que recebia. Hoje alinhados entre os maiores concertos de todos os tempos, as duas obras do alemão Johannes Brahms (1883-1897), executadas por Freire em seu novo disco, foram bastante polêmicas e criticadas em sua origem. O próprio Brahms descreveu a estréia do Concerto para piano nº 1 em ré menor, op. 15 como um “brilhante e completo fracasso”. O trabalho deixava transparecer o seu estado psíquico bastante abalado: Brahms se dividia entre a paixão que sentia por Clara, mulher de Robert Schumann, e a gratidão que cultivava pelo próprio Schumann, que era seu mestre. Quanto ao Concerto para piano nº 2 em si bemol, op.83, ele foi simplesmente aniquilado pelas críticas de Franz Liszt, que o chamou de “opaco e cinzento”.
Brahms – the piano concertos não fica a dever absolutamente nada para a exuberância do talento demonstrado em Chopin: piano works, que consolidou a posição de Freire na prestigiada gravadora inglesa Decca, com a qual ele assinou contrato há seis anos. A única diferença é que, sobre o novo disco, o pianista quase não fala – é como se o seu trabalho, por si só, falasse tudo por ele. Ou ainda: o que tinha para falar, falou ao piano – e dessa vez acompanhado por orquestra. Freire continua vivendo entre Paris e Rio de Janeiro e adora assistir a clássicos musicais hollywoodianos. Seu dinamismo e seu gosto por viagens profissionais o trarão novamente ao Brasil no mês que vem. Em São Paulo, ele se apresentará à frente da Orquestra Sinfônica do Estado. No repertório, infelizmente, nada de Brahms. Nelson Freire tocará Richard Strauss, Almeida Prado e Serguei Prokofiev.