A Itália saiu das eleições parlamentares simetricamente dividida entre a esquerda e a direita, repetindo o que aconteceu na Alemanha em setembro do ano passado. Na mais acirrada disputa eleitoral desde a implantação da República, em 1946, a coalizão de centro-esquerda L’Unione (A União), liderada por Romano Prodi, venceu a Casa delle Libertà (Casa das Liberdades), de centro-direita, do atual primeiro-ministro Silvio Berlusconi. A vitória se deu pela ínfima margem de 0,1 ponto porcentual. Cerca de 83% dos eleitores compareceram às urnas, um índice muito elevado num país onde o voto não é obrigatório. No Senado, o fiel da balança foram os oriundi, cidadãos de ascendência italiana que adquiriram cidadania, mas residem no exterior, como no Brasil, e que votaram pela primeira vez: quatro dos seis senadores eleitos pelos filhos e netos de emigrantes são partidários de Prodi.

Il professore, como Prodi é conhecido, é o oposto do errático e bufão Berlusconi. Sem ser brilhante ou carismático, esse acadêmico e jornalista de 67 anos é comedido e tem uma reputação inatacável. Ele é católico, casado e tem dois filhos. Formado pela London School of Economics (com passagem por Harvard), Prodi é egresso do setor progressista da Democracia Cristã, partido centrista que governou a Itália quase ininterruptamente entre 1946 e 1990. Chefiou o primeiro governo de esquerda da Itália do pós-guerra (1996-1998) e presidiu a Comissão Européia. Atualmente, Prodi se tornou a principal estrela da esquerda italiana.

O governo que Prodi vai liderar tomará posse em maio, depois que o Parlamento eleger o sucessor do presidente Carlo Azeglio Ciampi. Até lá, il professore terá de formar o seu gabinete administrando o saco de gatos que é a sua coalizão, formada por ex-comunistas, comunistas ortodoxos, liberais, verdes e independentes. Além disso, com o frágil equilíbrio parlamentar conquistado, não será fácil enfrentar os enormes desafios que tem pela frente. O milionário Berlusconi foi eleito em 2001 prometendo aplicar ao país a fórmula de sucesso com que geriu as suas empresas. Mas, apesar de ter feito o mais longevo e estável governo do pós-guerra, revelou-se um completo fiasco para modernizar o paquidérmico Estado italiano. O resultado é uma economia estagnada nos últimos anos: o crescimento do PIB italiano foi zero em 2005, o déficit orçamentário está além dos padrões estabelecidos pela União Européia e o nível de desemprego é muito alto (8%). Prodi promete estimular a criação de empregos reduzindo custos trabalhistas e contendo o déficit orçamentário, mas isso poderá jogá-lo contra setores mais à esquerda da União. Há mais consenso no plano externo, onde todos concordam que é preciso resgatar o prestígio do país no exterior, abalado por uma política externa excessivamente a favor do modelo que o presidente dos EUA, George W. Bush, imprime ao seu país. Uma das primeiras medidas do novo governo será a retirada de tropas italianas do Iraque. E, de olho nos oriundi que lhe garantiram a vitória, Prodi promete aprofundar as relações com a América Latina, que ele definiu como “continente esquecido” pela política externa italiana.