Anos depois de se tornar famoso como
autor do livro Tubarão, que deu origem em
1975 ao filme de mesmo nome, o escritor
americano Peter Benchley foi questionado se
seria capaz de escrever outra obra com o
mesmo teor. “Eu nunca mais poderei criar uma
situação como aquela – de uma criatura
assassina que não sumia porque tinha pego
o gosto pela dieta de seres humanos”,
respondeu. “Hoje sabemos que os tubarões
não atacam barcos, e só decidem o que
comer ao morder o alimento.”

O escritor se desculpou pela fama assassina que atribuiu aos tubarões, mas a imagem que o filme consagrou, de um predador ávido por banhistas desavisados, continuou forte. A realidade, no entanto, é bem diferente: são os humanos que representam uma ameaça aos tubarões. Sua atividade pesqueira, cada vez mais abrangente, está contribuindo para a diminuição alarmante de diversas espécies pelo globo.

O último alerta apareceu na sexta-feira 16, em uma pesquisa publicada na revista americana Science. Cientistas canadenses fizeram um levantamento detalhado das espécies presentes no norte do oceano Atlântico e chegaram à conclusão de que o número de tubarões caiu em cerca de 75% na região.

Alguns casos são críticos. O tubarão-martelo, espécie de cabeça achatada que pode atingir até três metros de comprimento, teve um declínio de 89% desde a metade da década de 80. O tubarão-tigre, espécie solitária de predador que pode chegar aos seis metros, caiu 65%. Até o tubarão-branco, estrela do livro de Benchley, está sumindo. Hoje, estimam os cientistas, seu número é 79% menor do que há 15 anos. “É bem provável que o mesmo esteja acontecendo em outras partes do planeta, já que a pesca em grande escala exerce uma enorme pressão em quase todos os lugares”, comenta Julia Baum, da Universidade Dalhousie, no Canadá, e uma das autoras da pesquisa.

Alvo secundário – Os primeiros indícios do sumiço desses predadores começaram a aparecer nos anos 90 e, desde então, as pesquisas
vêm se tornando mais precisas. “Os tubarões são capturados por uma enorme variedade de equipamentos de pesca, mesmo quando eles não são o alvo principal”, comenta Otto Gadig, especialista em tubarões
da Universidade Santa Cecília, em Santos. Além disso, a recuperação
das espécies é muito difícil. Os tubarões atingem a maturidade muito tarde e produzem poucos filhotes por vez. “Uma população precisaria
de mais de 50 anos para se restabelecer numa determinada área”,
diz o pesquisador brasileiro.

Como principais predadores dos oceanos, os tubarões controlam a cadeia alimentar marinha. Assim, seu desaparecimento poderia trazer graves problemas de desequilíbrio entre as espécies, com consequências ainda desconhecidas pelos cientistas. Os esforços de proteção, iniciados na década passada, não são suficientes para brecar sua extinção. Espécies como o tubarão-branco já são protegidas em países como a Austrália e a África do Sul. No Brasil, o Ibama mantém algumas espécies, como o tubarão-martelo e o tubarão-azul, na nova lista de animais ameaçados. Apesar disso, alerta Gadig, ainda são necessários mais esforços para que o seu número volte a crescer.