13/12/2001 - 10:00
Palestinos lutando contra palestinos. Este era o cenário da madrugada da quinta-feira 6, na Faixa de Gaza, quando três membros do grupo extremista islâmico Hamas entraram em confronto com policiais da Autoridade Nacional Palestina (ANP) que mantinham em prisão domiciliar o líder espiritual da organização, o sheik Ahmed Yassim, detido por ordem de Yasser Arafat. Yassim é o mais importante prisioneiro já detido pela ANP. Em 14 meses da nova Intifada, esta é a pior situação para Arafat, que está sendo pressionado por Israel e Estados Unidos a dar fim à violência e conter os terroristas palestinos. O Hamas (Movimento de Resistência Islâmica) assumiu a autoria da série de sangrentos atentados que mataram 26 civis israelenses entre sábado 1º e domingo 2. Dois homens-bomba explodiram em uma rua de Jerusalém, matando dez israelenses e ferindo quase 200. Um suicida palestino matou outros 15 e feriu mais 40 em um ônibus que explodiu em Haifa (norte). Por fim, um israelense foi morto à bala na Faixa de Gaza.
A revanche de Israel veio através de dezenas de ataques aéreos com aviões, helicópteros e mísseis que atingiram em cheio o prédio do Ministério do Interior da ANP, vizinho ao escritório de Yasser Arafat em Ramalá, na Cisjordânia. Duas pessoas morreram e 150 ficaram feridas, entre elas 60 crianças. A Fatah, facção de Arafat dentro da Organização de Libertação da Palestina (OLP), e a Força-17, responsável pela segurança da ANP, foram consideradas pelo governo israelense “entidades que apóiam o terrorismo”. A tentativa de tirar Arafat do cenário provocou um racha no gabinete do premiê Ariel Sharon. O ministro das Relações Exteriores, Shimon Peres, do Partido Trabalhista, ameaçou deixar a coalizão governista, mas acabou recuando. Para alguns analistas israelenses, o objetivo de Sharon é mesmo liquidar Arafat. “As operações refletem uma falta de estratégia, própria de Sharon. No fundo, a intenção dele é provocar, de algum modo, a queda de Arafat e da Autoridade Palestina”, disse Joseph Alpher, da Universidade de Tel-Aviv.
Trégua – Mas, para que isso acontecesse, seria necessário que as tropas israelenses retomassem a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, e há muitos impedimentos para essa empreitada. O primeiro deles é a população de cerca de 200 mil colonos judeus assentados nesses territórios, a poucos quilômetros das cidades controladas pela ANP. Depois, Sharon teria que contar com todo o apoio dos EUA para viabilizar esses ataques, o que certamente ele não conseguirá. É verdade que os americanos reafirmaram o apoio ao premiê, mas Washington também quer evitar o engajamento de Israel no plano de combate ao terrorismo internacional e o consequente enfraquecimento de Arafat. “O importante é que os dois lados lembrem que toda ação gera uma reação e o ideal é que haja uma trégua para o retorno à mesa de negociação”, afirmou o secretário de Estado americano, Colin Powell. Os EUA preferiram atitudes como o congelamento dos bens de organizações que supostamente dão apoio aos extremistas, como foi anunciado na terça-feira 4 pelo presidente George W. Bush. “Quem faz negócio com os terroristas não negocia com os EUA”, disse Bush em menção aos inimigos dos americanos, como os terroristas do al-Qaeda de Osama Bin Laden. Para Bush, quanto mais longe Sharon estiver da cruzada americana ao terrorismo, melhor.
O problema é que com Arafat pode ser ruim, mas sem ele certamente será pior. Ainda não surgiu outro interlocutor com seu carisma e facilidade para aglutinar facções distintas entre os palestinos. Arafat também não preparou ninguém que o pudesse substituir. Os israelenses sabem disso e também temem que haja um vácuo político entre os palestinos que possa ser preenchido pelos grupos radicais islâmicos. De fato, Arafat perdeu a grande oportunidade de negociação quando recusou o acordo de paz do ex-primeiro-ministro Ehud Barak. Agora, para mostrar serviço, em 48 horas mandou prender 131 palestinos. Mas, para Israel, ainda não é o suficiente. Sharon foi eleito sob a promessa de maior segurança para os israelenses, o que ele não conseguiu até agora. O premiê exige que a ANP use mão-de-ferro contra o terrorismo palestino. Do outro lado, quanto mais prisões houver, mais a fúria dos palestinos cresce. Uma pesquisa mostra que 70% deles são favoráveis à Intifada. Enquanto isso, Arafat tenta ganhar tempo e pede a intervenção internacional e tropas da ONU na região para acalmar a situação. O líder da ANP terá que ser rápido porque o descontentamento cresce sob suas barbas. Respondendo ao pedido de ISTOÉ para uma entrevista, um membro da organização palestina Bailasan, em Ramalá (Cisjordânia), afirmou: “Não sou da Autoridade Palestina. Sou do outro lado, o lado que está sendo preso a mando de Arafat. Lamento não poder ajudar.”