01/09/2004 - 10:00
Há menos de dez anos, quem quisesse ouvir rap paulista e funk carioca tinha que ir até as periferias das cidades. Aos poucos, os estilos saíram dos guetos e tomaram conta dos ouvidos e cabeças da moçada bem-nascida, que passou não só a frequentar shows de rap e a ouvir CDs dos Racionais MCs, como a se vestir à moda ? homens de camisetas e calças largas e moças de bonés, calças justíssimas, decotes e saltos altos, no melhor estilo Beyoncé. Hoje, não há casa noturna que se preze na capital paulista que não tenha ao menos uma noite semanal dedicada à chamada black music (geralmente rap, soul e funk). Agora, a nova onda nas discotecas é contratar, para essas noites, além de DJs, também os MCs ? mestres de cerimônia que animam a galera e entoam rimas antes carregadas de protesto social e, agora, mais lights, adaptadas aos novos ambientes. E se o rap está dominando as pistas mais abastadas em bairros como Itaim e Vila Olímpia, o funk carioca ? quem diria ? invadiu as baladas de modernos e descolados, frequentadas por amantes da chamada cena eletrônica.
Um dos mais antigos produtores de bailes hip hop de São Paulo é Primo Preto, que contrata DJs e MCs para algumas das casas mais caras, frequentadas por quem desembolsa, no mínimo, R$ 50 para curtir uma noite. Primo acha que é bom os baladeiros mais abastados gostarem do movimento que nasceu na periferia, em locais onde jamais estiveram. ?Isso ajuda a integrar os dois mundos. Esse público acaba conhecendo e valorizando movimentos que nasceram no subúrbio?, garante. Numa das noites produzidas por Primo, na Disco Club, o frequentador paga R$ 70 de consumação mínima. Por R$ 60, os baladeiros puderam curtir na quarta-feira 18 o som de DJ King e outros três MCs na inauguração da noite black da Maleysian.
Além do rap, o funk carioca também entrou pela porta da frente na programação noturna de São Paulo. Se os descolados do Rio ainda torcem o nariz para o movimento e fazem questão de mantê-lo no subúrbio, na capital paulista o pancadão usa o elevador social. Depois do show da funkeira Tati Quebra-Barraco na boate A Lôca, durante a SP Fashion Week, foi a vez de o embaixador do funk, DJ Marlboro, virar celebridade.
A badalada casa noturna Lov.e, na Vila Olímpia, famosa por lançar tendências da vida noturna da cidade, inaugurou uma noite fixa quinzenal, sob o comando de Marlboro, dedicada ao pancadão. ?O funk é o hip hop brasileiro. As rimas falam do dia-a-dia das periferias, só que com o suingue daqui?, diz o DJ. Ele já tocou em vários festivais na Europa e agora, depois de mais de dez anos, começa a ser respeitado em seu país. ?O pessoal está lavando os olhos do preconceito?, anima-se. Ver a pista dominada por essa atmosfera do funk só confirma o que diz um dos refrões mais ouvidos ? e cantados ? nos bailes: ?É som de pobre, preto e favelado, mas, quando toca, ninguém fica parado.?