14/07/2004 - 10:00
O escritor cubano Pedro Juan Gutiérrez é um dos principais expoentes de uma geração que escancara nas artes o seu desencanto com o resultado social da revolução. Avanços alcançados no âmbito da educação, da saúde e da moradia para todos, em troca do cerceamento das liberdades e de uma vida de ambições limitadas, não bastam para quem sonhava com um éden socialista. E numa conjuntura em que o poder não muda de cara há décadas, o enfoque político já não interessa mais. Hoje, é na sensualidade caribenha que os últimos protestos dos indivíduos se expressam com mais força. Mas é de uma sensualidade esgotada, e do desespero por não perdê-la, que Gutiérrez constrói seu mais recente livro, O insaciável homem-aranha (Companhia das Letras, 202 págs., R$ 35).
Sexo é a derradeira barricada de uma vida sem objetivos, contada na primeira pessoa e vivida na decadente Havana dos que não compartilham o poder nem o deslumbramento dos novos e reluzentes hotéis de luxo de Varadero. Mas, o que sobra para contar quando a potência não é mais a mesma e a sensualidade adquire um tom patético em meio à explosão generalizada dos mais jovens que usufruem seus momentos de paixão? Este é o dilema que o personagem principal, um escritor bissexto, conformado com a vida medíocre, enfrenta ao longo da narrativa. Mulheres vão e vêm, sem paixões que reacendam o fogo antigo. E o gosto amargo do dia-a-dia se transforma num travo que cheira a mofo e lembranças rançosas. O autor também pinta, passa horas matando o tédio ao som de Brahms, porém a vida se esvai no suor e na desesperança, resultando numa obra pungente e interrompida num momento que não é o fim, nem um começo. É como se o escritor tivesse se cansado da palavra, que retomará em breve.