15/12/2004 - 10:00
Um dos ícones do capitalismo, há tempos a IBM abandonou seus hábitos de vetusta senhora que ditava até a cor do traje de seus funcionários – terno azul-escuro, camisa branca e gravata discreta, em tons vermelhos. O dinossauro da informática deixou para trás os imensos computadores, ou mainframes, aos quais sua imagem se associava. E passou a ser uma empresa de soluções em tecnologia. A divisão de computadores pessoais, que ela ajudou a inventar em 1981, junto da Intel e da Microsoft, não ia bem se comparada à concorrência, apesar de faturar US$ 9 bilhões em 2003. Por isso, depois de vários meses de negociações, enfim na semana passada a Big Blue aceitou a oferta do grupo chinês Lenovo e vendeu, por US$ 1,25 bilhão, sua divisão de PCs.
A negociação, uma das maiores já realizadas pela China, eleva o tigre asiático do oitavo lugar para a terceira posição entre os maiores fabricantes de computadores pessoais do mundo, com quase 8% de participação global. Na liderança está a Dell, com 17%, seguida da também americana HP-Compaq, com 15%. Fundada em 1984, a Lenovo faturou US$ 3 bilhões no ano passado e é a marca líder em computadores pessoais, em especial os de mesa, na China e na Ásia, com um terço das vendas. Até agora, porém, ela era inexpressiva nos grandes centros ocidentais, como Estados Unidos e Europa, onde a IBM reina com sua força de vendas e distribuição espalhada por 160 países.
O acordo tem implicações históricas pelo tamanho e pelo aspecto simbólico. “É uma aliança estratégica de longo prazo, um jogo que só tem ganhadores”, define Flávio Haddad, diretor de computação pessoal da IBM Brasil, que será diretor-geral da subsidiária brasileira da Lenovo. A nova empresa será formada no segundo trimestre de 2005. Nasce com a força de vendas, os laboratórios de desenvolvimento, o time de marketing e a carteira de clientes da IBM. Haddad garante que nos próximos cinco anos, a Big Blue continuará a prestar serviços de suporte, assistência técnica e a respeitar a garantia dos produtos IBM.
Já a Lenovo representa uma alavanca em termos comerciais para a IBM. Com o volume de vendas para o mercado chinês, onde os números são superlativos, a tendência é de os preços dos PCs da IBM desabarem em pouco tempo. “Os concorrentes têm motivo para se preocupar”, diz Haddad. Na prática, a imensa maioria dos produtos de informática hoje é produzida na Ásia. Estima-se que sete em cada dez laptops e notebooks vendidos no mundo sejam projetados por empresas de Taiwan e fabricados na China.
Pelos termos do acordo, a IBM deve manter uma participação de 18,9% na Lenovo, que vai transferir sua sede de Pequim para Nova York. Nos próximos cinco anos, os chineses poderão usar a marca IBM e a de seus produtos, como a linha de computadores portáteis Think, onde a empresa americana tem tradição. A Lenovo promete desembolsar US$ 650 milhões a vista e outros US$ 600 milhões em ações. O total da transação, em dinheiro vivo e patrimônio, é de US$ 1,75 bilhão e o faturamento das duas companhias somado é de US$ 12 bilhões.
Nem todos reagiram bem à transação bilionária. Em vários aspectos, o acordo da semana passada lembra a aquisição da Compaq pela HP. Alguns clientes e analistas se mostraram temerosos quanto ao futuro da nova empresa. Ao contrário da HP-Compaq, no caso da nova gigante global não são apenas duas empresas se unindo. São dois países com culturas muito distintas, afinal. Antever o destino desse casamento, só com bola de cristal.