O mercado brasileiro de motocicletas vai se lembrar de 2004 como o ano em que ultrapassou a barreira do um milhão de unidades produzidas. Nunca se vendeu tanta moto como nos últimos anos. Só na última década, a produção brasileira cresceu 1.200% – saiu de 83 mil unidades, em 1993, para 1,050 milhão previsto para este ano. Preço, economia e agilidade estão entre os principais motivos que justificam o recorde histórico. Os atrativos também servem para converter curiosos interessados em novos compradores. Outro fato que vem puxando as vendas nesses tempos de desemprego é a utilização das duas rodas como fonte de trabalho e renda. Além dos conhecidos entregadores de encomendas, as motinhas estão sendo adaptadas para veículos de transporte de passageiros e de cargas. É comum, hoje, ver em cidades menores motos puxando reboques com botijões de gás ou servindo de táxi (os chamados mototáxis). Mas foi nos grandes centros urbanos, onde se tornaram indispensáveis para vencer os gigantescos congestionamentos, que as motocicletas aceleraram mais, ganhando espaço e até uma classe específica de trabalhadores, os motobóis. Hoje, já são 6,6 milhões de motos trafegando em todo o País, boa parte delas (mais de 80%) rodando com um motor de 125 cilindradas.

As cidades do Sul e Sudeste ainda são as que mais utilizam motocicletas no País e respondem pela compra de quase 60% de tudo o que é produzido. Os nordestinos vêm em segundo lugar, com pouco mais de 22%. “Cada vez mais, as pessoas estão buscando ter seu próprio meio de transporte”, justifica Moacyr Alberto Paes, diretor executivo da Abraciclo, associação que reúne as cinco principais montadoras de motos no País. Mas não é só o desejo de ter a própria condução que move esse mercado cada vez maior. O preço, em torno de R$ 5 mil – um carro básico não sai por menos de R$ 15 mil –, e as facilidades de financiamento ajudam muito a vida
de quem não quer mais depender do transporte público. A conta é simples: na cidade de São Paulo, uma pessoa que utiliza quatro conduções por dia gasta cerca de R$ 6,80. Em 22 dias, terá gasto em torno de R$ 150. Com essa quantia, paga tranquilamente uma prestação de consórcio. O valor menor da moto e da sua prestação tem feito a diferença.

As motos Sundown, marca lançada pela Companhia Brasileira de Bicicletas (CBB), no segundo semestre de 2002, têm se dado bem na briga para enfrentar as gigantes japonesas Honda e Yamaha, que, juntas, detêm mais de 90% do mercado. Desde que inaugurou sua linha de produção em Manaus, a companhia não pára de crescer e já tem planos para expandir a fábrica no ano que vem. Em relação às vendas de 2003, a companhia deve fechar o ano com um crescimento superior a 400%.

Fator preço – O segredo para todo esse sucesso é o preço, em torno de 15% menor que o das marcas líderes. Durante todo o ano passado, a empresa vendeu pouco mais de duas mil motos. Este ano, até o mês de novembro já foram vendidas 10,2 mil unidades. Outra que vem acelerando o crescimento é a Kasinski, que, além de motocicletas, produz motonetas e ciclomotores. Fundada em 1999 pelo criador do grupo Cofap no Brasil, Abrahan Kasinski, as vendas no primeiro ano chegaram a quatro mil unidades. Neste ano, os números de janeiro a novembro já ultrapassaram as seis mil motos.

O crescimento da concorrência, por enquanto, não tem assustado a japonesa Honda, líder absoluta que concentra mais de 84% das vendas. Com investimentos pesados em desenvolvimento e tecnologia – desde que se instalou no Brasil, em 1976, foram aplicados US$ 600 milhões –, a montadora tem capacidade para produzir um milhão de motos por ano. “Estamos experimentando um ciclo de expansão no setor de duas rodas no Brasil, graças ao uso cada vez maior da motocicleta como meio para geração de renda”, diz Kazu Nozawa, diretor executivo da empresa. De janeiro a novembro deste ano, já foram comercializadas no mercado brasileiro 715 mil unidades. E as exportações atingiram 112 mil motos.

O aumento das exportações também é a meta da Yamaha, vice-líder do mercado, com pouco mais de 13% de participação. A subsidiária brasileira ganhou recentemente uma concorrência interna para fornecer motores de 125 cilindradas para todas as outras filiais no mundo. No mercado interno, as vendas da marca, em 2004, devem chegar a 123 mil unidades. Para 2005, a meta é vender 228 mil unidades. Para isso, a empresa está investindo US$ 80 milhões em uma nova planta com capacidade de produção de 300 mil unidades/ano. Hoje, a fábrica localizada em Manaus produz 180 mil motos. Estão previstos também o lançamento de novos modelos e a ampliação da rede de concessionárias.

Disputas mercadológicas à parte, a motocicleta sempre foi uma paixão dos brasileiros. Em 1910, 20 anos depois que se teve notícia da primeira moto no
mundo (com motor de dois cilindros e movido a vapor), o Brasil se dava ao
luxo de contar com 19 marcas rodando nas precárias ruas e estradas do País.
Na década de 50, as primeiras lambretas começaram a ser produzidas por aqui, além da Monark, que montou uma moto com motor importado. De lá para cá, muita coisa mudou. Hoje, muito mais que liberdade, elas representam uma alternativa de combate ao desemprego.

Acelerando: a diferença entre a venda de automóveis e a de motos no mercado interno diminuiu bastante. De janeiro a novembro foi vendido 1,4 milhão de carros, contra 989 mil motocicletas