20/06/2007 - 10:00
"Louvado seja Deus na natureza, mãe gloriosa e bela.” Assim São Francisco de Assis escreveu no Cântico das criaturas. Notório por viver rodeado de animais, o santo defendia no século XIII um conceito que só ganharia relevância centenas de anos depois – a ecologia. Agora, o Vaticano dá uma demonstração efetiva de preocupação com o meio ambiente. “Jogar lixo nas ruas é pecado venial, mas quem destrói a Amazônia comete um pecado grave”, disse o cardeal italiano Renato Raffaele Martino, em conferência promovida pelo Conselho para a Justiça e Paz, órgão da Santa Sé presidido por ele.
Dentro do código da Igreja, o pecado venial é aquele que não causa um risco direto à vida das pessoas. É o contrário do pecado mortal. O grave está acima do venial e expressa séria preocupação. A declaração de Martino, portanto, é um significativo alerta. Durante os dois dias da conferência, 80 estudiosos e peritos de 20 países discutiram aquecimento global, água potável, preservação de florestas e desenvolvimento econômico. “São Francisco deve estar aplaudindo e dizendo: Finalmente perceberam que a irmã Terra merece cuidado”, diz o teólogo Fernando Altemeyer Jr. O chamado vale ainda para os representantes da Igreja. “Nos últimos 300 anos, a maior parte dos religiosos dormiu tranqüila enquanto os rios se deterioravam.”
A Igreja também manifestou suas preocupações no documento da 5ª Conferência- Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe (Celam), na cidade paulista de Aparecida. “Nos parágrafos 83, 140 e 493 fala-se sobre a agressão à Amazônia, o degelo na Antártida, o aquecimento global”, diz Jorge Cláudio Ribeiro, do Departamento de Teologia e Ciências da Religião da PUC. “Está se falando tarde demais desse tema. É o momento de se fazer uma leitura ecológica da Bíblia”, diz dom Pedro Luiz Stringhini, bispo auxiliar da Diocese de São Paulo.
O discurso é importante, mas a velocidade com que o ambiente vem sendo degradado exige medidas concretas. E o Vaticano quer dar mostras de que não se limita à pregação. A Santa Sé anunciou recentemente que substituirá o teto de cimento do auditório Paulo VI, utilizado como espaço para recepções, por células fotovoltaicas que converterão luz em energia solar. A reforma do local, prevista para 2008, é considerada um esforço do papa Bento XVI pela conservação dos recursos naturais. Essa decisão tem sentido simbólico. Afinal, a comunidade católica é uma das maiores do mundo. Mas se não houver uma ação articulada em nome da ecologia, com prazos, parcerias e recursos, a atitude soará como mera retórica.
Para Jorge Ribeiro, o papa deveria ter um gesto mais grandioso: sair em viagem de navio e visitar os oceanos, sem data para voltar. “É preciso mudar o jeito de agir. Na Igreja, sempre houve pessoas como o padre Júlio Lancelotti, que cuida de crianças e adolescentes soropositivos. Hoje, falta um padre Júlio da ecologia”, diz ele.