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DEBAIXO D’ÁGUA São Paulo, 23 de fevereiro: inundação tem a ver com ilhas de calor na cidade

As imagens da Avenida Nove de Julho, uma das principais de São Paulo, alagada na segundafeira 23, são um lembrete de que a natureza não perdoa deslizes de planejamento urbano em grandes cidades. As ilhas de calor – áreas densamente povoadas, com solo impermeabilizado e sem vegetação arbórea, como é o caso da Nove de Julho – contribuem para a formação de grandes e volumosas nuvens de chuva. Por isso, a inundação, em certa medida, é culpa do homem. E parte dessa culpa tem a ver com o desleixo com que se tem lidado com um importante fenômeno meteorológico: o aquecimento local.

Ele sempre foi responsável por pequenas variações de temperatura entre regiões de uma mesma cidade. Mas, com o aumento das intervenções humanas, viraram enormes. Em 2007, estudo da Universidade Estadual Paulista (Unesp) observou, em setembro, recorde na diferença de temperatura entre bairros paulistanos: 12ºC, o dobro do já registrado em Nova York. Enquanto os termômetros do Centro marcavam 32ºC, os da Serra da Cantareira mostravam 20ºC. "Se continuarmos construindo prédios, pavimentando ruas e canalizando córregos indiscriminadamente, a tendência é de as mudanças climáticas transformarem São Paulo em um inferno", alerta Magda Lombardo, geógrafa da Unesp.

A maior variação ocorre entre março e setembro, quando chove menos e há mais poluição no ar. Vários fatores interferem nas temperaturas locais. Bairros arborizados e altos têm temperatura mais baixa e estável, enquanto regiões com o solo impermeabilizado por concreto e sem áreas verdes sofrem com temperaturas elevadas e instáveis. Outra variável importante é a poluição. "Ela absorve e mantém o calor emitido pela cidade pairando no ar", diz José Tadeu Garcia Tommaselli, professor de climatologia e hidrologia da Unesp. Para ele, uma forma de combater o problema é criar e preservar áreas verdes em toda zona urbana. "Temos de investir nisso por pelo menos 15 anos."

A cidade de Sacramento, na Califórnia, que em escala menor sofria com os mesmos problemas, conseguiu reverter o quadro em menos de uma década. "Eles investiram na distribuição da vegetação. Hoje 30% da área da cidade é verde e a temperatura média caiu em 2ºC", explica a geógrafa Magda. Assim, gastase menos com energia elétrica e com a saúde da população. "Diferenças bruscas de temperatura têm efeito direto sobre o sistema respiratório e favorecem infecções", diz Arnaldo Lichtenstein, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

EXTREMOS
Uma variação de 12ºC foi detectada em São Paulo em setembro de 2007. Enquanto os termômetros do Centro da cidade marcavam 32ºC, na Serra da Cantareira a temperatura não passava dos 20ºC