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DUELO Equívocos de Cristina Kirchner
provocaram reação da Fiesp, que agora exige
retaliação do Palácio do Planalto

Diante das incertezas que cercam a economia mundial, o pior remédio ao alcance dos governantes é o protecionismo. Se insistirem em fechar suas fronteiras aos produtos importados, o fluxo de comércio internacional cairá em ritmo acelerado, agravando o quadro de recessão. Só não vê quem não quer. E esse é o caso do governo da Argentina. Num dos muitos equívocos cometidos pela presidente Cristina Kirchner, a Casa Rosada, em resposta à crise, criou entraves às exportações brasileiras ao exigir licenças não obrigatórias para eletrodomésticos, eletroeletrônicos, calçados, tecidos, confecções, autopeças, aço e vidros. O Brasil reagiu e, na terça-feira 17, em reunião bilateral de alto nível no Itamaraty, esperava-se que os argentinos escutassem os apelos do governo Lula e derrubassem as novas barreiras alfandegárias. Eles, contudo, não recuaram um milímetro. "Não consideramos que as medidas sejam barreiras comerciais. As normativas continuam vigentes", disse o chanceler Jorge Taiana, ao deixar o encontro.

Do lado brasileiro, participaram da reunião os ministros Celso Amorim, das Relações Exteriores, Guido Mantega, da Fazenda, e Miguel Jorge, do Desenvolvimento, e pela Argentina, além de Taiana, os ministros Carlos Fernandez, da Economia, e Débora Giorgio, da Produção. Na presença de quase 40 assessores, as negociações consumiram duas horas e meia, mas, se fosse o dobro, o resultado seria o mesmo. Acontece que o foco da Argentina não é bem o impacto da crise econômica mundial, mas, sim, a preocupação de sempre: o déficit comercial com o Brasil, que, no ano passado, subiu para US$ 4,3 bilhões. Os argentinos não se conformam e acreditam que as exigências alfandegárias devem equilibrar o jogo. O tiro, porém, pode sair pela culatra, pois os setores da indústria brasileira prejudicados cobram uma represália de Brasília. A Fiesp defende uma política de olho por olho, dente por dente, com barreiras contra os produtos argentinos. O Palácio do Planalto, porém, desconversa e não perde as esperanças. Na visão do presidente Lula, "a relação entre Brasil e Argentina é tão profunda e forte que não há divergência que não possa ser solucionada."

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Os fatos não dão margem a tanto otimismo. Não bastasse a intransigência quanto às medidas protecionistas, a Argentina faz pressão para que o Brasil endureça as exigências no comércio com a China. Argumenta que está sendo invadida por produtos chineses. Nesse pleito, curiosamente, os argentinos têm o apoio do presidente da Fiesp, Paulo Skaf, para quem é preciso endurecer com a China para preservar empregos locais. Mas o Brasil, segundo Amorim, não pretende ultrapassar os limites das normas da Organização Mundial do Comércio. "É preciso evitar o protecionismo como prática, buscando o crescimento do comércio como objetivo final", diz ele. Para não dizer que a reunião do Itamaraty fracassou, foi criado um grupo de trabalho, que se reunirá no dia 4 de março, em Buenos Aires, com a missão de produzir propostas a serem discutidas por Lula e Cristina, quando se encontrarem no dia 20 de março, em São Paulo. Amorim espera do grupo "medidas criativas". No entanto, se vale a experiência brasileira, os grupos de trabalho só servem para empurrar decisões com a barriga. Ou melhor, para não chegar a lugar nenhum.