13/07/2005 - 10:00
Tudo indica que a ciência vai ficar mais próxima da ficção científica. Os exemplos da revolução da nanotecnologia, que lida com dimensões até 100 mil vezes menor do que um fio de cabelo, beiram o inacreditável. Nos laboratórios já se trabalha com tinta à prova de riscos, embalagens que mudam de cor quando seu conteúdo estraga, roupas que não mancham nem sujam, baterias e memórias de maior capacidade, plásticos leves, maleáveis e mais resistentes do que o aço.
Com reflexos em quase todos os setores, essa nova fronteira do conhecimento ultrapassa os limites da criatividade humana. O exemplo mais impressionante é o nano-robô. Injetado na corrente sangüínea do paciente, ele percorre suas entranhas e modifica um ou mais genes para o próprio organismo reagir à doença. Ou medica diretamente as células doentes, sem comprometer as sadias, como já ocorre nos testes clínicos de drogas contra o câncer.
“A nanotecnologia deve afetar desde a gastronomia até as indústrias têxtil, eletrônica, de plásticos, cosméticos, automóveis e a agricultura”, diz o químico Henrique Toma, professor titular da Universidade de São Paulo (USP). Ele integrou o time de cientistas que exibiu produtos e idéias durante a Nanotec 2005, que ocorreu na semana passada, em São Paulo, para tratar dos desafios da ciência que lida com átomos e moléculas.
Os especialistas garantem que ela deve ser a quinta revolução industrial, tão fundamental quanto a têxtil, a siderúrgica, a automobilística e a informática. No Brasil, o projeto mais maduro é fruto de uma parceria entre a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e duas unidades da Universidade de São Paulo (USP). A língua eletrônica é um conjunto de sensores parecido com uma espátula de batedeira, capaz de reconhecer padrões básicos do paladar, como salgado, doce, azedo e amargo. Foi criada pelo engenheiro Luiz Henrique Capparelli Mattoso para degustar vinhos e cafés. “O próximo passo é investir no nariz eletrônico, que analisa substâncias químicas para indicar o tempo de maturação das frutas”, diz Mattoso, cujas pesquisas estão voltadas para o agronegócio.
No Brasil faltam especialistas, recursos e um parque industrial de microeletrônica que dê sustentação à pesquisa. “Estamos no início de uma onda que requer investimentos enormes. Por isso, é preciso ter visão de longo prazo e unir o setor produtivo (indústria) e a pesquisa acadêmica”, diz Moshe Eizenberg, vice-presidente do Instituto de Tecnologia de Israel, que investe mais de US$ 80 milhões na área. “Se o Brasil não planejar bem, vai ficar para trás”, diz.
Os países que mais investem em nanotecnologia são EUA, Alemanha e Japão. Só os americanos consumiram US$ 850 milhões em 2004, e a soma dos países desenvolvidos chegou a US$ 80 bilhões e deve superar US$ 1,3 trilhão até 2015. No Brasil, a promessa não chega a US$ 50 milhões.
“O mais importante é o impacto econômico que isso terá na manufatura, no campo médico e de defesa”, diz Mark Welland, da universidade britânica de Cambridge.
As vendas anuais em produtos de dimensões mínimas podem chegar a US$ 3 trilhões. “É um dos setores mais promissores do futuro, junto da biotecnologia e
da produção de energia limpa”, diz Rogério Loures, presidente do conselho de políticas industrial e tecnológica da Confederação Nacional da Indústria (CNI). “A nanotecnologia é um imperativo para se ganhar produtividade e competitividade,
mas os industriais não estão atentos a isso”, diz Loures. Uma pesquisa recente mostra que só 1,7% das 72 mil empresas nacionais dá atenção à inovação. “É preciso despertar a indústria para esse tema, antes que seja tarde demais”, diz Loures. E o Brasil perca mais uma vez o bonde da história.