A economia brasileira conseguiu até agora passar incólume pelo furacão político chamado Roberto Jefferson, o deputado petebista que acusou dirigentes do PT e parlamentares da base aliada do governo de se beneficiarem com o chamado mensalão. Natural que o mercado financeiro tenha alternado altos e baixos nos primeiros dias logo após a denúncia de Jefferson (entre os dias 6 e 9 de junho), mas nada que alterasse a rota prevista por investidores, economistas e empresários para 2005. O Ibovespa, principal índice da Bolsa, o dólar, o risco-país e os C-Bonds, os títulos da dívida brasileira vendidos lá fora, registraram pequenas alterações para baixo, normais para um setor que está acostumado a turbulências. Especialistas avaliam que a crise só não contaminou a economia porque passou longe dos homens que controlam a área econômica, como os ministros Antônio Palocci, da Fazenda, e Paulo Bernardo, do Planejamento, e, claro, o presidente Lula.

Discernimento – A rigidez da política monetária, quem diria, também acabou ajudando, criando uma espécie de colchão de superávits – fiscal (4,5% do PIB) e externo (US$ 34 bilhões) – acumulados ao longo do ano passado. No caso das exportações, os números positivos continuam surpreendendo, apesar do câmbio em baixa: junho deve fechar com vendas acima dos US$ 10 bilhões. “O mercado tem mais discernimento e controlou melhor a situação”, disse o economista Alex Agostini, da consultoria econômica GRC Visão, que acompanhou o mercado no período mais agudo da crise. Em relação à denúncia que envolveu Waldomiro Diniz, ex-assessor do então ministro da Casa Civil José Dirceu, o mercado reagiu melhor: a Bolsa, por exemplo, caiu 9,2% entre o início e o pior momento do caso Waldomiro. Desta vez, a queda foi de 7,1%. No risco-país, houve um aumento de 89 pontos com o Waldomiro e de apenas 27 pontos na atual crise. “O que se percebe é que a economia está mais blindada em relação a problemas de ordem política”, diz Agostini.

O ministro Palocci também não tem dúvida. Utilizando termos médicos, ele explicou a não-contaminação da economia pela crise política em um evento com empresários na terça-feira 28, em São Paulo. “O sistema imunológico do Brasil está muito mais fortalecido”, disse o médico-ministro. Sem mencionar o momento delicado por que passa o governo com a atual crise, o ministro garantiu que o Brasil também ganhou “tecido muscular” para fazer frente com mais tranqüilidade às oscilações da economia. O discurso de Palocci tem guarida em um dos maiores produtores de aço do País. O grupo Gerdau, com sede no Sul do Brasil, informou que flutuações de curto prazo não influem em sua estratégia de investimento. “As perturbações políticas não representam fatores de decisão para o nosso programa de investimentos”, afirmou Jorge Gerdau Johannpeter, presidente do grupo, que está investindo US$ 2,4 bilhões em suas unidades brasileiras até 2007. Já Heron do Carmo, presidente do Conselho dos Economistas de São Paulo, diz que, apesar do sistema imunológico fortalecido, a crise vai acabar atrapalhando o crescimento econômico. Ele lembra que a confusão política pegou o Brasil em um momento em que se preparava para um salto de qualidade. Agora, diz ele, a paralisação do governo e do Congresso com as CPIs vai trazer efeitos negativos à economia e prejudicará em algum momento a performance do crescimento . “Não vai derrubar o crescimento, mas vai tirar o seu ímpeto”, diz o economista.

Apesar da provável paralisação, Júlio Gomes de Almeida, diretor executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), sugere ao governo aproveitar o momento para injetar ânimo na economia via redução das taxas de juros e liberação de recursos para projetos de infra-estrutura. E aproveitar também o movimento de economistas e empresários para zerar o déficit nominal. Na mesma linha, o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, defende, além da redução dos juros (uma recorrente reivindicação da entidade), uma guinada austera no controle dos gastos públicos. Na quarta-feira 29, Skaf apresentou um estudo propondo um corte de despesas em torno de 2% ao ano durante seis exercícios consecutivos (2006 a 2011), entre outras sugestões para enxugar o setor público. O estudo – entregue a Palocci há dois meses – será tema da próxima reunião de lideranças empresariais em Brasília, marcada para a noite da terça-feira 5, em Brasília. No jantar, Skaf vai propor uma agenda mínima para o governo afastar a crise e voltar a crescer. “Enquanto a turma da CPI apura, temos que trabalhar para que a economia entre em um círculo virtuoso, e não vicioso como o que estamos vivendo”, disse o empresário.

Acuado pela crise e por três mil tratores estacionados na Esplanada dos Ministérios em Brasília, o governo fez na quarta-feira 29 o primeiro movimento de liberação de verbas para os agricultores. Chamado de “tratoraço”, o movimento reuniu 20 mil produtores na capital federal que pediram dinheiro para financiamento de suas dívidas com fornecedores durante a época do plantio. Levaram R$ 3 bilhões do BNDES. No início da semana, o presidente Lula anunciou em seu programa de rádio mais R$ 3,8 bilhões para a recuperação de estradas no País. A crise está fazendo o governo abrir a mão.