17/12/2008 - 10:00
Brasil
Chegou no Judiciario
Presidente do tribunal de Justiça do espírito santo e dois desembargadores são presos por vender sentenças
Sérgio Pardellas
Há mais de uma década, o Espírito Santo tem sido palco de uma série de escândalos de lavagem de dinheiro e denúncias sobre a ligação de políticos, tanto do Legislativo quanto do Executivo, com o crime organizado. Na semana passada, quem caiu no mesmo lodaçal foram os representantes do Judiciário. Na terça-feira 9, a Polícia Federal prendeu nada menos do que o presidente do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, Frederico Guilherme Pimentel, e outras seis pessoas – entre as quais dois desembargadores e um juiz – suspeitas de participar de um esquema de venda de decisões judiciais. De acordo com o Ministério Público Federal, o grupo patrocinava e intermediava interesses particulares perante o tribunal, "para obtenção de decisões favoráveis e ou- tras facilidades que pudessem ser conseguidas por meio da interferência dos agentes públicos em troca de favores e vantagens pessoais".
Segundo o inquérito da PF, os advogados combinavam com clientes a compra das decisões do TJ e pagavam a funcionários do setor de distribuição para que os processos fossem remetidos aos desembargadores integrantes da suposta quadrilha.Os desembargadores, por sua vez, julgavam as ações em benefício dos clientes dos advogados. "O Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo transformou- se num balcão de negócios em que os jurisdicionados podem garantir o êxito de suas demandas se estiverem dispostos a pagar propina ou trocar favores lícitos ou ilícitos com os alvos que têm o papel de intermediários na organização criminosa", relata o inquérito.
As investigações foram iniciadas em 2007 e revelam ainda que o TJ virou terreno fértil para grandes negociatas entre familiares e amigos. "A ganância dos familiares e agregados do presidente do Tribunal para se locupletar da coisa pública não conhece limites", acrescenta o Ministério Público. Além do presidente do TJ e do filho dele, o juiz Frederico Luiz Schaider Pimentel, foram presos também os desembargadores Elpídio José Duque e Josenider Varejão Tavares; a diretora de Distri-buição do Tribunal, Bárbara Pignaton Sarcinelli, cunhada do filho do presidente do TJES; o advogado Paulo José Duque, filho do desembargador Elpídio Duque; e o advogado Pedro Celso Pereira. Uma das interceptações telefônicas, gravada com autorização judicial, flagra o filho do presidente do TJ negociando a criação de um cartório em Vitória com a cunhada. Na conversa, eles falam em "bolo" a ser dividido.
Os escândalos no Estado são mais do que recorrentes. A corrupção no Espírito Santo é como um raio que cai diversas vezes no mesmo lugar. Entre 1996 e 2003, a Assembléia Legislativa do Espírito Santo foi presidida pelo ex-integrante do jogo do bicho José Carlos Gratz (Pfl), considerado um dos líderes do crime organizado local. Durante sua gestão, a Assembléia foi acusada de dar "suporte jurídico" para o desvio de verbas públicas. Em 2000, a CPI do Narcotráfico acusou Gratz de envolvimento com o crime organizado associado à Scuderie Le Cocq, organização criada no Rio de Janeiro para vingar o assassinato do detetive Le Cocq mas que logo se transformou num esquadrão da morte. Em 2001, caiu em suspeição o Poder Executivo.
Fitas gravadas por um empresário e entregues ao MP desmontaram um esquema de cobrança de pedágios dentro do governo estadual. O objetivo era liberar financiamentos e evitar a cobrança de impostos. Com o escândalo, o então governador José Ignácio Ferreira exonerou cinco secretários, entre eles a própria mulher e o procurador- geral do Estado. Em abril, o Espírito Santo ocupou o epicentro da Operação Titanic, também da PF, com 21 pessoas presas, entre elas o filho do governador de Rondônia, Ivo Júnior Cassol, acusado de envolvimento com uma quadrilha de importação de carros e motos de luxo subfaturados. Os veículos entravam pelo porto de Vitória, com a complacência da Receita estadual. Agora, com a denúncia sobre o Judiciário, o Espírito Santo mostra que é terra sem lei.