17/12/2008 - 10:00
Entrevista
"Governo não é só o Executivo"
O presidente do PMDB critica o excesso de medidas provisórias e rejeita o rótulo de candidato do alto clero na sua terceira campanha à presidência da Câmara
por Mário Simas Filho

Presidente nacional do PMDB, o deputado Michel Temer (SP) anda tão obcecado com a campanha pela presidência da Câmara que outro dia cabalou votos dentro do elevador do Anexo IV, onde se concentra a maioria dos gabinetes dos deputados. Só quando o elevador parou, descobriu que sua interlocutora não tinha mandato. Não foi um erro por desconhecimento. Temer ocupou duas vezes a presidência da Câmara, entre 1997 e 2000. Mas por excesso de animação. A disputa pela presidência da Casa está tão quente que, nas últimas semanas, ele retomou o pique de candidato a primeiro mandato: tem percorrido os gabinetes, comparecido a eventos, promovido encontros.
Se a eleição fosse como o destino do peru de Natal, que se resolve na véspera, Temer estaria eleito. Há dois anos, ele fechou um acordo com o PT para garantir a presidência da Câmara a Arlindo Chinaglia. Há dez dias, o PT retribuiu o apoio a Temer, que enfrentará em 1º de fevereiro o deputado Ciro Nogueira (PP-PI). Além disso, PSDB, DEM e a maior parte dos partidos que dão sustentação ao governo tendem a apoiar o candidato do PMDB. "Minha base de apoio é muito ampla e muito boa, mas preciso esperar o dia da eleição", diz Temer. "Ninguém pode ser apressado nessas questões." O seu problema é que, com tanta experiência acumulada em seis mandatos, ele é tido como um legítimo representante do alto clero, o pequeno grupo de líderes que tem as rédeas na Câmara. "Não existe parlamentar de baixo clero", afirma Temer.
Michel Temer – Já fui presidente duas vezes e no meu tempo as coisas no Legislativo caminharam com muita tranqüilidade. Nunca fui nem quero ser um presidente burocrático. Quero realizar algo útil para o Legislativo, para a harmonia entre os poderes e para o País.
Temer – Isso não existe. Quando fui presidente da Casa não se falava em alto clero ou baixo clero. Se chegar novamente à presidência, quero eliminar as expressões baixo clero e alto clero. Quem chega ao Congresso não pode ser rotulado de baixo clero. Não admito essa espécie de distinção.
Temer – Não (risos). Isso eu não faço. Não sei se é prejudicial ou não, mas não mandei nenhum presente para parlamentar. O que tenho feito é visitar os gabinetes. Já visitei quase todos os deputados. Deixo a eles uma mensagem e mais para a frente vou lhes encaminhar minhas propostas. Minha campanha é exatamente essa.
Temer – Acho minha base de apoio muito ampla e muito boa. Mas preciso esperar o dia da eleição. Ninguém pode ser apressado nessas questões nem se influenciar pelo noticiário.
Temer – Não podemos interferir nas relações dos partidos com o governo, mas quando se fala em fisiologismo também está se referindo a um tópico que há muito tempo faz parte do meu programa. É a questão do Orçamento. Nisso, podemos e devemos interferir.
Temer – O Orçamento é uma lei e toda lei é obrigatória. Entretanto, essa é a única lei que não é obrigatória. É editada uma lei orçamentária e depois o Executivo bloqueia determinadas verbas. Ou seja, o Executivo fica à vontade para mandar seu projeto de lei, o Legislativo coloca todas as emendas que deseja colocar e depois a lei não é cumprida. Quando isso ocorre, o deputado vai legitimamente cobrar sua emenda e o Executivo libera. Isso gera o noticiário horroroso de compra de votos. Mas, na verdade, se está apenas cumprindo a lei.
Temer – Propomos algo que é óbvio. Uma lei orçamentária impositiva. Só entra no Orçamento aquilo que numa perspectiva para o próximo ano seja factível. Se ocorrer algo inesperado, o Executivo deve mandar uma mensagem ao Legislativo para que aprove o bloqueio desta ou daquela verba. Isso melhora o gasto do Executivo e qualifica o Legislativo.
ISTOÉ – O sr. foi presidente da Câmara duas vezes, e essa medida nunca foi aplicada. Por quê? Temer – Falo nisso há seis anos. O senador Antônio Carlos Magalhães foi um paladino do Orçamento impositivo e essa idéia vem amadurecendo, embora ainda haja alguma resistência no Executivo. No Parlamento, é natural que as coisas passem por um processo de amadurecimento. Mas quem mais sofre com isso é a própria base de apoio do governo no Congresso.
Temer – Deixamos de lidar com conceitos e passamos a lidar com pontuações. Hoje, mesmo no interior de cada um dos órgãos do poder há desarmonia. Essa disputa intensa dentro da Polícia Federal, por exemplo, é fruto de uma desarmonia mais global. Há desarmonia também no Judiciário. É lamentável um juiz de primeiro grau insurgir-se contra uma decisão do STF. Isso acontece quando não se governa conceitualmente, mas pontualmente.
Temer – É fruto da cultura política nacional que agora desandou. Há falta de diálogo entre os órgãos de poder e essa falta de diálogo gera a desarmonia.
Temer – Isso não é verdade. O que o STF muitas vezes faz é interpretar o dispositivo constitucional. No caso da fidelidade partidária, por exemplo, o Supremo interpretou o conjunto constitucional e disse que o mandato é do partido e não do parlamentar.
Temer – O Legislativo simplesmente achou que nesse momento não deveria legislar sobre isso. A omissão também é uma forma de ação. Mas reconheço que várias vezes o Legislativo deixou de cumprir sua função. Quando o Congresso regulamentar os vários dispositivos constitucionais e editarmos a legislação infraconstitucional, o Supremo passará a pautarse por essa legislação, e isso precisa ser feito.
Temer – Tempos atrás o presidente Arlindo Chinaglia designou a mim como presidente de uma comissão que está sendo instalada agora com o objetivo de verificar todos os dispositivos que demandam regulamentação e providenciar um levantamento dos projetos existentes. São mais de 200 dispositivos, mas precisamos examinar melhor isso, pois muitas vezes há leis anteriores que já regulamentam algumas questões.
Temer – Acho que isso vai além de uma intromissão. O traço principal do Judiciário é a imparcialidade. Uma associação de magistrados faz um elenco daqueles que considera ficha suja. Se um deles um dia precisar do Judiciário, como é que vai pleitear a imparcialidade se já está catalogado como ficha suja? Isso gera conflitos enormes. Também não pode um parlamentar exigir uma relação de magistrados fichas sujas.
Temer – Tem havido restrições às MPs. A primeira gerou o chamado trancamento de pauta, que num primeiro momento foi muito bem recebido, mas depois se verificou um efeito perverso, pois o trancamento impossibilitava o Legislativo de executar sua tarefa. Agora foi aprovada nova restrição. Acho que em um ano poderemos aprovar nova restrição. Assim, a coisa caminha, passo a passo.
Temer – É a que restringe materialmente. Ou seja, definimos dois ou três casos que sejam fundamentais para o País, que exijam urgência absoluta e são relevantes. Daí para a frente, as MPs só poderiam versar sobre esses assuntos.
Temer – Que bom o fato de o processo legislativo ser lento! Isso significa que há amadurecimento.
Temer – O fato de os deputados passarem parte da semana em seus Estados é altamente positivo. É lá que eles devem buscar sua pauta de atuação. Quero colocar a TV Câmara acompanhando os parlamentares em suas bases. A população precisa conhecer o trabalho dos deputados.
Temer – Ela facilita o Executivo. Mas, em matéria de MPs, a relação é a mesma que com os governos passados.
Temer – Em primeiro lugar, precisamos discutir a crise. Quero transformar o Congresso num permanente centro de debates das questões nacionais. O Legislativo não será um órgão onde apenas se legisle e se fiscalize. Deve ser um órgão de debates, que proponha soluções. Governo não é só o Executivo. Se a crise abrir a porta, pode ser controlada, mas, se arrombar a porta, ficará muito mais complicado.
Temer – Acho que o governo Lula tem lançado a mensagem para incentivar o consumo e agido de maneira capaz de controlar a crise.
