15/06/2005 - 10:00
A poeira dos escândalos em série ainda está longe de baixar, mas uma primeira visão dos escombros da maior crise do governo Lula permite vislumbrar um cenário político que afeta diretamente as eleições do próximo ano. Pesquisa Ibope realizada no período de 2 a 6 de junho, um ano e quatro meses antes de os brasileiros escolherem seu próximo presidente, mostra que o tema corrupção virou um dos calcanhares-de-aquiles do Planalto. Chamados a avaliar o governo Lula, 57% das pessoas reprovaram os resultados do combate à corrupção, contra 34% que viram uma luz no fim do túnel. A pesquisa mostra que, mais do que a decantada polarização entre PT e PSDB, um personagem ganha cada vez mais importância. O Fator Garotinho, mostra o Ibope, será decisivo para a equação eleitoral.
Diante do eleitor – 2.002 pessoas ouvidas em 143 municípios –, o Ibope embaralhou as cartas da sucessão. O presidente Lula lidera todas as pesquisas, com uma margem mais ou menos elástica – variando de 10% a 25% –, diante de candidatos como o secretário de Governo do Rio de Janeiro, Anthony Garotinho (PMDB), o prefeito do Rio, Cesar Maia (PFL), a senadora Heloísa Helena (PSOL) e um quarteto de tucanos que se revezam em bicar fatias do eleitorado – o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o prefeito de São Paulo, José Serra, e os governadores Geraldo Alckmin, de São Paulo, e Aécio Neves, de Minas Gerais. O dado que impressiona, porém, aparece quando o Ibope coloca a oposição para brigar. Sem Lula na disputa, Garotinho emerge como favorito, com 26% das intenções de voto, à frente de Geraldo Alckmin (21%), Cesar Maia (11%) e Heloísa Helena (6%). Num quadro sem Lula, o número de votos brancos e nulos saltaria para 26%. A margem de erro é de 2,2% para mais ou para menos.
O cenário, obviamente é irreal. Lula é candidatíssimo à reeleição e, por enquanto, favorito. Mas a pesquisa coloca questões que dominam a oposição: quem vai para o segundo turno com Lula – caso haja segundo turno? Quem tem mais chances de roubar votos do presidente-candidato? Garotinho fica em segundo lugar em três cenários propostos pelo Ibope – batendo os tucanos Alckmin, Fernando Henrique e Aécio Neves. Se o candidato tucano for Alckmin, Garotinho chegaria empatado com ele em segundo lugar, com 14% cada um, contra 39% de Lula. Se vingar Fernando Henrique, ele teria 14%, contra 15% de Garotinho e, novamente, 39% para Lula. Com Aécio Neves na disputa, Lula alcançaria 41%, Garotinho 16% e Aécio ralos 7%, ficando atrás até de Cesar Maia (9%). Em outro cenário, sem Cesar Maia na disputa, o maior beneficiado também seria seu rival no Estado. Garotinho chegaria a 17%, batendo Alckmin (15%) – ambos atrás de Lula (40%). Em todos os casos, Cesar Maia fica sempre abaixo dos 10% e Heloisa Helena na faixa dos 4%.
José Serra continua sendo o candidato que mais se aproxima de Lula. Com o prefeito de São Paulo como candidato do PSDB, a disputa embolaria e, se a eleição fosse hoje, seria o único capaz de levar a peleja para um segundo turno. O prefeito paulista teria 26% dos votos contra 36% de Lula. Garotinho ficaria em terceiro lugar, com 12%. Nesse cenário, Lula teria nove pontos porcentuais a menos que a soma dos demais candidatos (45%) e por isso haveria segundo turno.
Votos da elite – Uma lupa sobre o eleitorado amplia os pontos fortes e fracos de cada candidato. Lula continua exercendo uma atração maior sobre os homens, enquanto José Serra concentra mais eleitores no outro gênero. Tanto que, entre as mulheres, a diferença entre os dois cai para apenas 1% em favor de Lula (32% a 31%). Lula dispara sua vantagem sobre os demais candidatos entre os eleitores mais jovens, concentrando metade de todos os votos na faixa de 16 a 24 anos. O menor índice de Lula está entre pessoas acima de 40 anos. A menor diferença entre Serra e Garotinho, em favor do primeiro, está entre eleitores jovens, de 25 a 29 anos, especialmente os que ganham até um salário mínimo. Fernando Henrique tem mais votos na elite. Escolhido por 14% dos eleitores ouvidos, chega a alcançar a preferência de 24% daqueles que ganham mais de dez salários mínimos.
No Nordeste, Lula e Garotinho dividem sua melhor performance. Lula tem entre 45% e 53% dos votos, variando de acordo com os rivais. A melhor marca do ex-governador do Rio é de 20% numa eventual disputa com Aécio Neves. Curiosamente, Lula e Garotinho mostram seus piores resultados no Sudeste, onde ficam suas bases políticas. Quem cresce ali é Serra e Alckmin, que chegam a contabilizar 22% dos votos, apenas 10% atrás de Lula. Assim como José Serra, Fernando Henrique e Cesar Maia têm um porcentual maior de votos nos Estados do Sudeste e do Sul.
Os mais pobres – Lula, como Garotinho, cresce nas faixas de renda mais baixas. O candidato do PMDB chega a abocanhar 21% dos votos de famílias que ganham até um salário mínimo (em confrontos com Aécio e Alckmin, sem Cesar Maia), feito superado apenas por Lula, que mantém uma faixa de votos entre 40% e 46%. Entre os possíveis candidatos do PSDB, o único que consegue arrancar um bom número de votos entre os brasileiros mais pobres é José Serra, alcançando 23%. Aécio apresenta a pior performance entre os tucanos. Não passa de 7% das intenções de voto, metade da preferência de Alckmin, por exemplo. Entre os jovens de 16 a 24 anos, piora ainda mais: tem 4% dos votos. No Nordeste, só consegue ser reconhecido como o melhor candidato por 2% do eleitorado.
A preferência por Lula pode ser explicada pela aprovação ainda majoritária ao
seu governo. Chamados a opinar sobre sua administração, 56% dos eleitores ouvidos disseram aprovar, contra 36% que desaprovam. Não opinaram, 8%. O
apoio é maior entre homens jovens (64% dos eleitores de 16 a 24 anos), com
baixa renda (65%) e no Nordeste (69% de aprovação). Apenas 8%, no entanto, classificaram a atuação de Lula como ótima, menos do que os 11% que a qualificam como péssima. A maioria ficou no meio-termo: 40% julgaram o trabalho do presidente como regular e 29% como bom.
Chamado a demonstrar sua simpatia ou antipatia pelos partidos políticos, o
eleitor deu outro recado. Um terço não tem nenhuma preferência, o mesmo porcentual (33%) do partido mais bem votado, o PT. O segundo partido mais simpático aos brasileiros é o PMDB, com 25%, seguido do PSDB (17%), PTB e PFL (11%) e PDT (8%). Os demais partidos tiveram 5% ou menos das preferências. O Partido dos Trabalhadores é mais bem- visto por jovens de 16 a 24 anos e com
mais estudo. Entre os brasileiros com menos renda, o PT encontra um rival à altura: PT, 33%, e PMDB, 26%.
Más notícias – O Ibope também pediu aos eleitores que dessem sua opinião sobre áreas estratégicas do governo. As notícias aí foram péssimas. Na área de saúde, 53% das pessoas ouvidas desaprovam o governo Lula e 41% aprovam. A reprovação é maior entre os que ganham mais: 76% dos que recebem acima de dez salários mínimos criticam o setor. Perguntados sobre a situação das estradas brasileiras, 67% desaprovaram e 20% aprovaram.
Na economia, mais recados do eleitor. Nada menos que 62% desaprovam os resultados da política de geração de empregos, contra 33% que aprovam. A reprovação chega a 66% entre as mulheres e a 67% entre os que ganham mais de dez salários mínimos. A política salarial tem 63% de críticos (contra 33% que a apóiam), enquanto 69% condenam as altas taxas de juros e 72% reclamam da cobrança de impostos – chegando a expressivos 86% entre quem ganha mais de dez salários mínimos. As ações de combate à criminalidade, violência e drogas também foram alvejadas: 60% de desaprovação e 33% de aprovação. A voz do povo, como se sabe, é a voz das urnas.